Tão
adiada quanto ansiada, a conversão de Ricardo Pessoa em delator leva o escândalo
da Lava Jato até o pé da rampa do Palácio do Planalto. O governo, seus agentes
políticos e o petismo talvez tenham de sofisticar suas alegações. Tornam-se
cada vez mais insuficientes o lero-lero do “não sabia” e a desconversa do “tudo
não passou de doação legal”.
Cada escândalo tem suas fatalidades próprias. Mas o
mensalão e o petrolão têm uma excentricidade em comum. São dois escândalos
acéfalos, produtos de uma máfia sem capo. Onde estão os chefes?, eis a pergunta
que a plateia começa a se fazer. Dono da construtora UTC e coordenador do
cartel da petropropina, Ricardo Pessoa dispõe do melhor trombone da Lava Jato.
Resta saber qual será a intensidade do seu sopro.
Lula e Dilma, como se sabe, reivindicam o papel de cegos
atoleimados. A Petrobras, segundo informa o executivo Aldemir Bendine, não
passa de uma vítima de funcionários gananciosos e empreiteiros inescrupulosos.
E o PT é apenas uma legenda exemplar, que enfrenta um hediondo complô de
procuradores partidarizados e da mídia golpista.
Se a delação de Ricardo Pessoa for coisa séria, as
fábulas que rodeiam o enredo principal da Lava Jato talvez sejam substituídas
por fatos. Nos tempos áureos, o empresário jactava-se de ser amigo de Lula.
Borrifou verbas em pelo menos três campanhas presidenciais do PT: 2006, 2010 e
2014. Não fala de ouvir dizer. Conhece o mafuá por dentro.
De duas uma: ou o governo é feito de personagens capazes
de tudo ou é feito de incapazes de todo. Difícil é aceitar a tese segundo a
qual pessoas que se jactam de façanhas que poderiam render-lhes estátuas se
comportem diante dos escândalos como pardais de si mesmos, sujando as próprias
testas de bronze. Um capo, por favor. Urgentemente! (Por Josias de Souza/Folha de S.Paulo)
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