Em 19
de março, Dilma Rousseff enviou à Câmara um pacote de providências anticorrupção. O embrulho continha dois projetos de lei, uma proposta
de emenda constitucional e um par de pedidos de tramitação em regime de
urgência para dois projetos que já estavam na Câmara. Ambos estão prontos para
ser votados. Se não forem apreciados na semana que vem, trancarão a pauta. Em
vez de cobrar uma deliberação, o Planalto cogita retirar os pedidos de
urgência.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já foi informado
sobre a novidade. Repassou-a a alguns líderes partidários. Disse ter conversado
com o ministro Aloisio Mercadante (Casa Civil). Confirmando-se a intenção do
Planalto, os dois projetos que Dilma queria apressar deixarão de ser
prioritários, retornando às gavetas. Um (5586/05) tipifica o crime de
enriquecimento ilícito de servidores e agentes públicos, inclusive políticos.
Outro (2902/11) prevê a perda antecipada de bens provenientes de corrupção.
O pretexto para a meia-volta é a mudança de prioridades
do governo, que agora tem mais pressa em aprovar as medidas do seu pacote
fiscal do que as providências do embrulho anticorrupção. Seja como for, será
preciso explicar a lógica da decisão à plateia. Prometido desde a campanha, o
pacote ético de Dilma foi enviado à Câmara quatro dias depois das manifestações
de 15 de março, que levaram às ruas de todo pais perto de 2 milhões de pessoas.
O asfalto voltou para casa, mas a corrupção continua nas manchetes. Combatê-la
nunca foi tão urgente.
Os projetos que recebem o selo da “urgência
constitucional” precisam ser votados em até 45 dias. Do contrário, passam a
trancar a pauta de votações da Câmara. Excetuando-se as medidas provisórias,
nada pode ser votado antes das matérias que carregam o selo da urgência. No
caso dos dois projetos que Dilma tachou de urgentes, a votação deveria ter
ocorrido até 4 de maio.
Nesta quinta-feira, a Câmara concluiu a votação da
primeira medida provisória do pacote fiscal de Dilma. A pauta da próxima semana
está apinhada. Além da segunda MP do ajuste fiscal, há outras duas. Na
sequência, viriam os dois projetos anticorrupção. Depois deles, uma proposta
que o Planalto gostaria de votar o quanto antes.
Trata-se do projeto de lei 863/15, que reduz a
desoneração da folha de pagamentos de 56 setores da economia. Essas mudanças
também haviam sido enviadas ao Congresso na forma de medida provisória. Mas
Renan Calheiros, o presidente do Senado, devolveu a MP ao Planalto. Que teve de
reenviá-la na forma de projeto de lei com pedido de urgência.
Nesta quinta, Eduardo Cunha disse que seria necessário um
“verdadeiro milagre'' para conseguir votar todas as medidas provisórias. Para
não deixar tudo as mãos de Deus, o Planalto passou a cogitar a retirada do
pedido de urgência do projetos anticorrupção. O pacote ético de Dilma incluiu
outras proposições para as quais não foi requerida a urgência. Ninguém fala
mais no assunto. Aos poucos, consolida-se na plateia a impressão de que a
preocupação de Dilma com a corrupção é cenográfica. (Por Josias de Souza)
Blog: O Povo com a Notícia