Pivô dos desentendimentos entre
PMDB e PT na primeira fase da batalha legislativa do pacote fiscal, a
terceirização voltará a eletrificar os debates no plenário da Câmara. Criticado
por Dilma Rousseff, Lula, o PT e a CUT o mecanismo foi aproveitado pelo governo
na medida provisória 664, que restringe o acesso a direitos previdenciários e
será votada pelos deputados nos próximos dias. O texto inclui uma passagem que
autoriza o INSS a terceirizar suas perícias médicas por meio de “convênio ou
acordo de cooperação técnica com empresas.”
A
finalidade da perícia médica é avaliar se os segurados estão incapacitados para
o trabalho de forma permanente ou temporária. Depende dessa avaliação a
concessão de benefícios como aposentadoria por invalidez e auxílio-doença.
Trata-se de uma atividade-fim do INSS. O que deixa Dilma, Lula e o petismo em
franca contradição. Todos criticaram a Câmara por incluir esse tipo de
atividade no projeto de terceirização de mão de obra recém-aprovado pelos
deputados.
Há
quatro dias, Lula provocou um curto-circuito no plenário da Câmara ao falar de
terceirização num programa que o PT exibiu em rede nacional de tevê. A peça foi
ao ar no instante em que os deputados se preparavam para votar a primeira parte
do ajuste fiscal de Dilma, embutida na medida provisória 665.
“Não
podemos permitir que a história de conquistas dos trabalhadores ande para
trás”, disse Lula. “É isso o que vai acontecer se for aprovado o projeto de lei
4.430, o projeto da terceirização, que passou na Câmara dos Deputados. Esse
projeto faz o Brasil retornar ao que era no começo do século passado. Volta ao
tempo em que o trabalhador era um cidadão de terceira classe, sem direitos, sem
garantias, sem dignidade. Nós não vamos permitir esse retrocesso…”
As
palavras de Lula caíram como uma carapuça sobre a cabeça do presidente da
Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um entusiasta da terceirização. Sob orientação
de Cunha, o PMDB exigiu que a bancada do PT ajoelhasse no milho, apoiando de
forma categórica o arrocho que Dilma promove nos benefícios trabalhistas. A
votação só seria retomada no dia seguinte, depois que o PT atendeu às
exigências do seu parceiro de coligação. E a MP 665, que dificultou o acesso a
benefícios como seguro-desemprego, só passou porque a oposição ajudou.
Agora,
o PMDB se equipa para questionar novamente as incongruências do governo. “Vamos
ter que apresentar um destaque supressivo (emenda que retira trechos de um
projeto) para retirar a terceirização da medida provisória”, afirma, desde
logo, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA). “É uma forma de forçar o PT a
tomar uma posição. Ou o partido se associa à contradição de Dilma e Lula ou
fica do lado da CUT.”
Para
complicar, a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social
(ANMP) protocolou no STF, em 27 de março, uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade contra o trecho da medida provisória de Dilma que permite a
terceirização das perícias. O trecho em questão está no artigo 1º da medida
provisoria 664,
que alterou normas previstas na lei 8.213. Numa
dessas alterações, a MP injetou no artigo 60 da lei um parágrafo 5º, que não
existia. Nele, está escrito:
“O
INSS, a seu critério e sob sua supervisão, poderá, na forma do regulamento,
realizar perícias médicas […] por convênio ou acordo de cooperação técnica com
empresas”. Na ação que ajuizou no STF, a ANMP sustenta que a terceirização
promovida pela MP de Dilma burla a exigência constitucional do concurso
público.
De
resto, a entidade utiliza argumentos que Lula, tomado pelas palavras ditas no
programa do PT, subscreveria. Sustenta, por exemplo, que a perícia médica é uma
atividade típica de Estado e, como tal, não pode ser delegada a terceiros. “A
realização de perícias por entidades privadas e por médicos não treinados e não
capacitados para tanto, que não possuem vínculo estatutário com a administração
pública, causa distorções no sistema previdenciário brasileiro, potenciais
danos ao erário e prejuízos ao próprio segurado”, anota a ANMP na ação.
Relatora
do processo no STF, a ministra Rosa Weber decidiu submetê-lo ao chamado “rito
abreviado” Com isso, em vez de julgar o pedido de liminar formulado pela
associação dos peritos médicos, a ministra optou por levar o caso diretamente
para o plenário do Supremo, para o julgamento do mérito. Agiu assim por
considerar que a causa é relevante e tem grande significado para a ordem social
e a segurança juridical. A ação continua pendente de julgamento. (Por Josias de Souza)
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