Dilma Rousseff foi dormir
aborrecida na noite passada. Ela iniciara a terça-feira animada. Dava-se de
barato à sua volta que seria aprovada na Câmara a primeira medida provisória do
ajuste fiscal do governo, também conhecido como arrocho trabalhista. Deu tudo
errado. Além de protelar a apreciação da proposta que interessava ao governo,
Eduardo Cunha, presidente da Câmara, atravessou na traqueia de Dilma a PEC da Bengala, que
estica de 70 para 75 anos a idade para a aposentadoria compulsória dos
ministros de tribunais superiores.
O
pesadelo de Dilma começou a ser planejado por Eduardo Cunha na hora do almoço.
Sem alarde, ele reuniu na residência oficial da Câmara líderes de vários
partidos, exceto do PT. Havia ao redor da mesa representantes do PMDB, PP, PR,
PDT, PSC, PTB e até dos oposicionistas Solidariedade e DEM. Cunha informou aos
convidados que aproveitaria a tropa mobilizada pelo governo para enganchar a
PEC da Bengala na MP do ajuste fiscal. Faria isso de surpresa, para evitar
contragolpes. Sem saber, o Planalto mobilizava a infantaria de que o desafeto
de Dilma necessitava para derrotá-la.
Àquela
altura, Cunha planejava entregar a mercadoria desejada por Dilma. Enfiaria a
PEC da Bengala no enredo apenas para dividir as manchetes com a MP trabalhista,
evitando uma vitória solitária da presidente. O anfitrião combinou o jogo com
os comensais: abriria a sessão com a discussão do arrocho. Logo que o quórum
subisse, colocaria em votação a PEC. Fecharia a noite com a aprovação da MP do
ajuste fiscal. No meio da noite, Cunha mudou de ideia. Aprovou o que lhe
interessava. E aplicou um golpe de barriga na matéria de interesse do governo.
O
futebol talvez seja a melhor metáfora para a sessão da Câmara. Pelo menos
oferece analogias que ajudam a interpretá-la. O arrocho fiscal era a bola.
Estava combinado que o time do governo, estimulado pelas promessas de premiação
feitas pelo articulador Michel Temer, dominaria o pacote no peito e colocaria,
maciamente, no solo. Mas o PT aparou com o nariz a primeira medida provisória
do embrulho. Rachado, o partido da presidente não conseguiu fechar questão em
favor do arrocho.
Para
complicar, Lula chutou a grama. Num instante em que os deputados governistas se
dispunham a limitar benefícios trabalhistas em nome do equilíbrio das contas
públicas, Lula fazia pose de defensor dos trabalhadores numa aparição no
programa do PT, transmitido em rede nacional. O meio campo do governo embolou.
Triangulando pela ponta direita, Eduardo Cunha lançou um par de bolas nas
costas de Dilma. E terminou impondo ao Planalto uma derrota de 2 a zero. Com
direito a gol contra de Lula.
Na
véspera, durante a reunião de Dilma com os membros da coordenação política do
governo, Michel Temer avisara:
a dubiedade do PT dificultava a aprovação do pacote fiscal. O PMDB e outras
legendas governistas condicionavam a aprovação das medidas que limitam a
concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários ao engajamento de 100%
do PT. Os aliados não admitiam fazer o papel de vilão enquanto os petistas
posavam de bons moços. (Por Josias de Souza)
Blog: O Povo com a Notícia