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segunda-feira, 31 de julho de 2017

Temer coloca o Brasil no rumo dos apagões da Califórnia; é hora de estudar as consequências do desastre da Enron

O clã “socialista” dos Coelho — pausa para gargalhar — sabe exatamente onde está o dinheiro, assim como Kenneth Lay da Enron depositava confiança total em George W. Bush

por Luiz Carlos Azenha

A reportagem de Marco Weissheimer, no Sul21, me levou de volta aos anos 90, nos Estados Unidos, quando um intenso debate foi travado em torno das medidas para desregulamentar o setor elétrico na California.

Eu era correspondente em Nova York e acompanhei de perto o que viria a ser uma tragédia. Literalmente, milhares de pessoas passaram horas ou dias sem energia elétrica em casa, num período de dois anos!

O governador republicano Pete Wilson e asseclas, inclusive do Partido Democrata, vendidos aos interesses das gigantes de energia AES — a mesma que agora controla a distribuição de energia no mercado mais lucrativo do Brasil, São Paulo — Reliant e Enron, partiram para a desregulamentação do setor, apostando todas as fichas num mercado atacadista de energia que colocava o lucro das empresas acima do interesse público.

Deu-se um dos maiores escândalos da História econômica dos Estados Unidos — o verdadeiro 11 de setembro, segundo o economista Paul Krugman: a Califórnia e regiões do Oeste dos Estados Unidos experimentaram apagões durante dois anos.

Muitos resultaram de pura ganância da Enron para ordenhar lucros.

Aqui, preciso recomendar ao menos dois livros seminais sobre o assunto: The Smartest Guys in the Room e Power Failure, que descrevem os bastidores de um dos maiores golpes corporativos já praticados nos Estados Unidos.

A Enron, como se sabe, colapsou no início dos anos 2000, depois de apresentar lucros de mais de U$ 100 bi.

Cerca de 5 mil empregos viraram fumaça, houve perdas de U$ 60 bi no mercado, a empresa de auditoria Arthur Andersen foi desmoralizada e as ligações do principal executivo do grupo, Kenneth Lay, com o então presidente George W. Bush e outros políticos, ficaram expostas.

Lay foi condenado a 45 anos de prisão pelos crimes corporativos e a outros 120 pelos crimes pessoais, mas morreu de um fulminante ataque cardíaco enquanto apelava.

O executivo foi parcialmente responsabilizado pelo fato de que a Enron fez o diabo durante a crise energética da Califórnia. É literal: fez o diabo.

Exemplos? Colocou em manutenção geradores de energia em dias de alto consumo, multiplicando os preços da ‘mercadoria’ que produzia; simulou congestionamento em linhas de transmissão, com o mesmo efeito.

O fornecimento de energia na Califórnia deixou de atender ao interesse público e os consumidores se tornaram reféns da Enron e de outros mafiosos.

É impossível não considerar que o governo Temer está nos levando pelo mesmo caminho, como Weisshemer descreve na reportagem do Sul21:


O Ministério de Minas e Energia emitiu a Nota Técnica nº 5/2017, propondo alterações das normas que regem o setor elétrico brasileiro, com o objetivo declarado de “aprimoramento do marco legal” desse setor.

Esse “aprimoramento”, porém, pode levar a uma mudança radical, de orientação ultraliberal, do funcionamento do sistema elétrico do país como um todo.

“O centro desse novo modelo é o conceito de que a energia elétrica é uma mercadoria, uma commodity, que pode ser vendida e comprada em um mercado livre de energia elétrica”, diz o engenheiro Ronaldo Custódio, ex-diretor técnico da Eletrosul, idealizador do Atlas Eólico do Rio Grande do Sul e professor no curso de especialização em Energias Renováveis da PUC-RS.

Para os consumidores, uma das principais consequências dessa mudança pode ser um aumento de até 6 vezes no preço pago hoje pela energia.

As mudanças propostas na Nota Técnica, assinala Custódio, abandonam o conceito de energia elétrica como serviço e bem público e alteram o atual modelo, implantado pela lei 10.848/2004 e estruturado em torno de três eixos: universalização, modicidade tarifária e garantia de suprimento.

“Neste modelo, a energia elétrica é um bem público regulado, não existindo liberdade total de compra e venda. Até existe um mercado livre de energia, mas, majoritariamente, o modelo é regulado, com preços definidos pelo setor público. As medidas previstas na nota técnica objetivam a ampliação e consolidação do mercado livre. Será possível, entre outras coisas, especular com o preço e a oferta da energia. Esse novo modelo proposto coloca em risco a segurança energética do país”, alerta o engenheiro que trabalha no setor elétrico há 30 anos.

As propostas de “aprimoramento do marco legal” propõem a criação de um ambiente especulativo para o comércio de energia, com a formação de uma bolsa de energia, com total liberdade de definição de preços pelos agentes operadores.

Isso significa, observa ainda Ronaldo Custódio, que a operação do sistema elétrico passará a se dar pelo preço e não mais pelo custo, o que permitirá que a especulação de preço afete a operação de todo sistema energético.

“Uma coisa é você especular com a venda de uma mercadoria qualquer, como o sabonete, por exemplo. Como é que você consegue maximizar o preço de um produto no mercado capitalista? Tendo equilíbrio entre oferta e demanda. Se eu tiver muita oferta, o preço cai. No setor da energia, isso é um perigo, pois esse equilíbrio implica o que alguns economistas chamam de escassez relativa. Você consegue o preço máximo quando há um princípio de escassez, sem ainda faltar o produto, mas no limite disso acontecer. Nesta situação, você tem o ganho máximo com aquele produto. Mas uma coisa é faltar sabonete no mercado, outra, bem diferente, é faltar energia”.

Preço ao consumidor pode aumentar de 5 a 6 vezes

O mercado, lembra o engenheiro, tentou implantar esse modelo do país na década de 90, mas esse processo foi interrompido pelo governo Lula.

“Lula não rompeu com os contratos existentes, mas reestruturou todo o setor, mantendo um mercado livre pequeno, sem perder de vista o fundamento de que a energia é um bem e um serviço público que, portanto, precisa ser regulado pelo Estado.  Segundo esse novo modelo, proposto na Nota Técnica, o mercado passaria a regular tudo e a estimular a especulação por meio da criação de uma bolsa de energia. Neste conceito, está embutida ainda a proposta de privatização de todas as empresas públicas do setor e também das usinas que tiveram suas concessões renovadas há pouco tempo. A ideia é vender e dar liberdade de definição de preço para os novos donos das usinas, o que pode aumentar de 5 a 6 vezes o preço pago hoje pelo consumidor. Esse preço, que hoje é da ordem de 40 megawatt-hora, poderá passar para algo entre 200 e 250 megawatt-hora. Quem vai ganhar com isso? O dono da usina. Quem pagará? O consumidor de energia”.

A nota técnica foi colocada em audiência pública que já está aberta a contribuições e que será encerrada no dia 4 de agosto.

A partir dessa audiência será elaborada uma proposta ao Congresso Nacional, provavelmente por meio de uma Medida Provisória, prevê Custódio.

“A ideia é estimular a participação de movimentos sociais e da população em geral nesta audiência pública que até prevê pouco tempo de debate pela profundidade da mudança. Quem está participando desse debate hoje são, basicamente, empresas do mercado de energia. Mas as alterações propostas vão além do mercado de energia, interessando diretamente a sociedade como um todo”.

“Privatização é o carro-chefe deste modelo”

Na avaliação de Ronaldo Custódio, os projetos do governo José Ivo Sartori (PMDB) para privatizar todas as empresas públicas de energia do Rio Grande do Sul se inserem dentro da lógica deste novo modelo que está sendo proposto.

“Há um alinhamento ideológico neste sentido e a privatização é o carro chefe desse modelo”.

Nos últimos anos, assinala ainda o engenheiro, a presença do capital internacional (especialmente chinês) no setor elétrico brasileiro vem crescendo muito.

“Até aqui, porém, tivemos a presença do Estado, regulando o setor. Neste modelo, as estatais cumprem a função de regular os preços e a competição. Ao se retirar as estatais do mercado e se dar total liberdade de preço, abrem-se as portas para a instalação de um ambiente especulativo”.

O que está sendo proposto agora, resume, significa o fim da política energética de Estado no Brasil, que passaria a ser gerida totalmente pelo setor privado.

“A política energética passará a ser uma política privada. As empresas privadas que operam no mercado é que decidirão os rumos do país. A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica assumirá a gestão de todos os contratos e do sistema de transmissão no Brasil. O que eu e vários especialistas avaliam que irá acontecer é o aumento do preço da energia e do risco de déficit, pois o Estado perderá a capacidade de controle”.

Nenhum país adotou um modelo como este, acrescenta Custódio, nem os Estados Unidos, que têm mecanismos de regulação de preços.

“Na década de 90, eles tentaram liberar o mercado, mas depois da grande crise que ocorreu na Califórnia eles deram uma segurada. Na Argentina, há um modelo um pouco parecido com esse que querem implantar aqui no Brasil e veja a crise energética do país. Onde se tentou implementá-lo no mundo, a experiência foi mal sucedida. Mas, no nível em que está sendo proposto agora aqui, não conheço nenhum caso”.

Resumo de algumas das principais medidas propostas para o setor elétrico

Liberdade total de compra e venda de energia. implantação do mercado livre total, com consolidação prevista até 2028.

Criação de um ambiente especulativo para o comércio de energia, com a formação de uma bolsa de energia e total liberdade de preço.

Operação do sistema elétrico pelo preço, e não mais pelo custo. Especulação de preço pode afetar a operação e alterar a programação energética.

Extinção do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE). A energia secundária das usinas hidrelétricas, que hoje pertence ao sistema e é usada para a otimização energética, passará a ser uma mercadoria comercializada pelo agente privado.

Fortalecimento da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), ambiente controlado pelos agentes de mercado. Todos os contratos e a gestão do mercado serão centralizados na CCEE.

Privatização das estatais, com incentivo financeiro para sua agilização, até 2019.

Fim dos incentivos, a partir de 2030, às fontes alternativas de energia (eólica, solar, biomassa, etc.) (Via: Site Viamundo)

Blog: O Povo com a Notícia