A manutenção de distância
confortável do candidato Jair Bolsonaro a quatro dias da eleição presidencial
mostra como os votos cristalizados dos dois candidatos praticamente impedem uma
reviravolta na reta final, a não ser que algo inacreditável aconteça. Em vez de
uma bala de prata, o PT gastou várias, e nenhuma acertou o alvo.
Mas balançaram a antes inabalável situação de
Bolsonaro: o número de pessoas que não votariam nele aumentou, superando os que
votarão com certeza. E diminuiu a rejeição ao candidato petista. Embora a
diferença esteja na margem de erro, é uma boa nova para Haddad, oferecida pelo
próprio adversário e os seus, que continuam sendo os principais adversários
deles mesmos.
O suposto escândalo das mensagens inverídicas de
WhatsApp, baseado em uma denúncia jornalística inepta, acabou sendo soterrado
pelo próprio candidato petista Fernando Haddad, que se precipitou em divulgar
uma fake news de primeira grandeza: avalizar a denúncia de que o general Mourão
foi um torturador.
A denúncia fake deveu-se ao cantor Geraldo
Azevedo, que disse em público, irresponsavelmente, que o General Mourão, vice
de Bolsonaro, fora um de seus torturadores em 1969. O fato de o General ter
apenas 16 anos na ocasião desmontou a alegação, que depois foi corrigida pelo
próprio cantor.
O problema causado pela denúncia do jornal Folha
de S. Paulo não justifica, porém, os arroubos retóricos de Bolsonaro em
mensagem enviada aos manifestantes na Avenida Paulista, que revelam uma
preocupante visão autoritária da relação de imprensa com o mandatário de um
país.
O mesmo destempero que acomete o presidente
Trump nos Estados Unidos – a quem Bolsonaro parece querer imitar – e o
ex-presidente Lula. Os três líderes populistas aproveitam sua popularidade para
incitar os militantes e apoiadores contra os órgãos de imprensa que os vigiam.
O papel da imprensa é justamente este, ser o
vigia da sociedade.O presidente americano Thomas Jefferson entendeu que a
imprensa, tal como o cão de guarda, deve ter liberdade para criticar e
condenar, desmascarar e antagonizar.
Os petistas assumiram postura autoritária, exigindo
em discursos inflamados, não apenas a anulação da eleição como a censura ao
WhatsApp pelo menos até o fim do segundo turno. É inacreditável que o PT exija
atitudes drásticas apenas com base em uma denúncia de jornal, sem que as
autoridades abram investigações.
Até agora, os petistas desacreditavam as
denúncias de jornal contra os seus, e, principalmente o ex-presidente Lula, e
criticavam o que chamavam de rito sumário das decisões da Justiça na Operação
Lava Jato. Anular uma eleição é decisão gravíssima que, como destacou a
presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Rosa Weber, não pode
ser tomada fora do tempo da Justiça “que não é o tempo da política”.
A percepção de parte da sociedade de que seu
filho não tirou da cabeça a ameaça de fechar o Supremo, mas retratou um
pensamento do próprio Bolsonaro, deu ares de verdade à ameaça, lastreada por
pronunciamentos anteriores do candidato, igualmente destrambelhados.
O ainda candidato Bolsonaro, que acha que está
com uma mão na faixa presidencial, terá que, além de fechar a boca e a de seus
próximos, convencer-se de que o país não aceita um governo autoritário, nem
bravatas retóricas que coloquem em risco a democracia.
Dificilmente a diferença que separa Bolsonaro de
Haddad será descontada a tempo, mas a redução da distância, que deve ser
confirmada ainda nesta semana pelo Datafolha, é um aviso de que o presidente,
por mais votos que tenha, não tem um cheque em branco da sociedade. (Via: O Globo - Por Merval Pereira)
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