Destaque de capa da revista Istoé, que chega este final de semana às bancas, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) faz declarações fortes conta o Partido dos Trabalhadores.
Segundo ele, "há uma fadiga em relação ao governo... existe um mal-estar no país". "O pt perdeu a credibilidade e a presidente Dilma Roussef não fala com o Brasil". Segundo a reportagem de Istoé, "aos 83 anos, mais de uma década depois de deixar o Planalto e sem qualquer pretensão política, o ex-presidente se comportou, durante as duas horas de entrevista, como uma figura pública capaz de fazer análises objetivas do momento do País".
"Fez duras críticas ao governo, mas também ao PSDB. Elogiou determinados aspectos das gestões Lula e Dilma Rousseff, enquanto relativizou alguns de seus próprios feitos. Ao discorrer sobre a economia, tratou com pouca relevância um dos alvos preferenciais da oposição, o crescimento pífio do PIB brasileiro", afirma o jornalista Sérgio Pardellas.
Abaixo a entrevista na íntegra:
ISTOÉ – O que mudou no cenário político de 2010 para cá?
Fernando Henrique Cardoso – O Brasil de 2010 tinha tomado medidas contra a crise de 2008 que funcionaram. Era um Brasil que tinha alguma esperança. Basicamente, o governo tentou estimular o crescimento com mais consumo graças à maior oferta de crédito. Então, houve uma expansão grande do crédito, que animou o consumo. Mas levaram muito tempo para entender que, para reativar o investimento, precisavam ter capital público e privado. E parou. Depois, por causa da Copa do Mundo, deu aquela aflição e correram para fechar parcerias público-privadas. Mas o fundamento posto lá atrás, qual seja, o crescimento via consumo e expansão do crédito, continua aí e não vem dando resultado.
ISTOÉ – O que deu errado?
FHC – Houve certa desatenção, não muito grave, à pressão inflacionária. Mas o endividamento é muito grande. É uma sociedade que cresceu no consumo e que chamam de “novas classes médias”, embora, sociologicamente falando, não sejam uma nova classe média de fato. Mas isso também trouxe transformações. As pessoas consumiram mais e agora é natural que queiram mais. As explosões de junho do ano passado foram consequência do querer mais. Existe uma corrida pelo crescimento do PIB. O governo está em busca disso. Mas a sociedade não quer só isso. As pessoas querem viver melhor.
ISTOÉ – Mas as manifestações de junho juntaram mais que apenas a chamada classe C.
FHC – É verdade. Todo mundo quer essa mudança. Queremos entrar no Primeiro Mundo. O Primeiro Mundo não é um país que tem muito PIB. É um país em que se vive melhor. Em que se tem segurança, educação, respeito e dignidade. Portugal não tem PIB nenhum e é mais Primeiro Mundo do que o Brasil. Aqui falta educação, segurança, o transporte não funciona. Estourou no governo Dilma. O governo persistiu no estímulo ao consumo e não olhou para os outros lados. Além disso, tem o manejo da política. O Lula sabia manejar o Congresso. Não da maneira correta, pois o mensalão ninguém pode apoiar. Mas ele sabia manejar. A Dilma não sabe manejar o Congresso. E a situação está aí. Vou ser sincero: há dois anos eu não acreditava na possibilidade de uma derrota eleitoral do governo. Porque o governo é o governo, tem recursos enormes e tem a exposição permanente. Os meios de comunicação, sobretudo a televisão, vão para um lado só. A televisão brasileira é esporte, crime, um pouquinho de internacional e muito governo. Por tradição. Nos EUA, ouve-se o outro lado. Aqui, o outro lado não existe para a massa. A pessoa só começa a ver o outro lado durante o período eleitoral. Achava muito difícil que houvesse uma mudança. Hoje eu acho possível transformar esse mal-estar em algo que tenha consequência eleitoral.
ISTOÉ – O sr. acha que a oposição não teve espaço na televisão brasileira?
FHC – É da nossa tradição. No meu governo também era assim, a oposição pouco aparecia na tevê. A diferença é que, no meu governo, não fazíamos tanta propaganda, até porque não tínhamos recursos. Este faz muita propaganda.
ISTOÉ – Isso não acontece hoje porque a oposição propõe pouco, não tem um projeto objetivo e claro?
FHC – O problema da oposição é outro: existe apenas uma oposição congressual. Os partidos existem no Congresso, não na vida da sociedade. A única exceção era o PT, que sempre teve organização partidária. A oposição se faz no Congresso, mas não repercute. O Congresso ficou muito confinado a ele próprio. Quando eu era senador, meus discursos eram publicados na íntegra nos jornais. Isso não acontece mais. Foi se perdendo o elo do Congresso com a sociedade. O mesmo aconteceu com outras instituições, com os sindicatos, com a UNE. Ela era importantíssima no passado. Hoje, qual é a importância?
ISTOÉ – Isso não tem relação com o aparelhamento dessas instituições?
FHC – A UNE, por exemplo, foi aparelhada. Mas talvez tenha sido no passado também. O problema é que a UNE e os próprios sindicatos eram grandes personagens da vida brasileira. Isso tem a ver com a sociedade como ela é hoje. De massas, conectadas, mas não presenciais. O que o governo decide incide sobre as pessoas. A oposição não toma decisão. Ela fala. E isso não aparece, só aparece um lado. O outro lado só aparece na eleição. Tem outra questão ainda: as diferenças, hoje, são lidas no espectro ideológico, direita e esquerda, mas não se dão nesse espectro. Na formulação é como se fosse “uns estão para cá, e outros estão para lá”. Na realidade não é assim. A diferença entre o PT e o PSDB é principalmente a concepção que se tem da política e do governo. O PT acredita que se muda o País ocupando o Estado e através do Estado tomando as decisões, controlando mais, sobretudo a economia. O PSDB acredita mais que é preciso não ocupar o Estado e ter uma relação maior com a sociedade. Isso é tênue, claro. Os dois têm um pouco de cada um. Mas a diferença essencial é essa. Na política monetária, por exemplo, o PT pode ter errado aqui ou ali, mas não mudaram o que vinha sendo feito. O juro não baixou como devia, é verdade. Mas isso é algo técnico. Ninguém está discutindo, na essência, a função do Banco Central.
ISTOÉ – No início do seu governo ainda havia uma tensão entre os que defendiam uma política econômica ortodoxa e os que queriam algo mais parecido com o desenvolvimentismo. Mas isso se diluiu. No governo Dilma a questão voltou e escolheu-se o caminho do nacional-desenvolvimentismo. Foi o caminho errado?
FHC – O que se entendia pelo desenvolvimentismo? O José Serra acredita muito no desenvolvimento com ativismo do governo. Acho que deve haver um ativismo mesmo. Quando eu era jovem, só se falava em desenvolvimento e subdesenvolvimento. A fórmula era assim: põe barreira para importação, dá subsídio ao juro e o governo investe. Isso foi mudando com o tempo. Como vai colocar barreira na importação com a economia globalizada?
ISTOÉ – A abertura da economia não tem volta?
FHC – Depois que o Collor abriu a economia não houve mudança nessa direção. Não houve movimento de fechamento. Todo mundo também é a favor da redistribuição de renda. As Bolsas (Escola e Alimentação) começaram no meu governo. E os outros governos só não fizeram porque não tinham como. A grande mudança nesse sentido se deu com a Constituição de 88, que garantiu direitos democráticos e desenhou a possibilidade de um país social-democrático, para usar uma expressão abusiva. A Constituição manda que o governo providencie gratuitamente a educação, a saúde, faça reforma agrária e assegure a previdência social. A partir de então, os governos, queiram ou não, terão de ir nesse caminho. As Bolsas foram para isso. A política de sustentação do saláriomínimo começou no governo Itamar.
ISTOÉ – O sr. não vê no governo Lula uma aceleração do processo de inclusão?
FHC – Acelerou porque ele pôde. Ele teve recursos para isso por causa do boom da China. Acabou a dívida externa na América Latina toda, não só aqui. A folga fiscal foi maior. Mas os princípios foram lançados antes. Progressivamente o Estado foi criando condições para melhorar. Condições estruturais e organizacionais, digamos. Não era possível criar as Bolsas sem internet. O Banco Mundial foi quem propôs primeiro. O PT era contra. Quem primeiro fez foi Honduras e quem melhor fez inicialmente foi o Chile. O cartão para criar o Bolsa Escola fui eu que fiz, copiando o exemplo de Goiás, com Marconi Perillo, para dar cidadania e entregando os recursos para a mulher. Foi decisão do meu governo. As Bolsas também estavam sendo unificadas no meu governo. Era uma questão técnica.
ISTOÉ – Mas o Lula iniciou com o Fome Zero.
FHC – Que nunca existiu. O Fome Zero do Lula ficou um ano sem sair do papel. Depois eles perceberam que era melhor pegar o plano anterior, que era o das Bolsas. Não houve mudanças radicais quando mudou o governo.
ISTOÉ – Nenhuma mudança expressiva?
FHC – O que houve foi maior presença do partido nas empresas. Sempre lutamos para tirar qualquer partido de dentro das empresas. A Petrobras, por exemplo. Nunca pensamos em privatização. É mentira. Nem se cogitou. Queríamos a competição e tirar a influência partidária. O mesmo com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica. Eu diminuí muito a presença de partidos aí. Com o Lula isso se inverteu. E a Dilma está sofrendo as consequências. Ela, quando colocou a Graça Foster, foi para diminuir a influência política. Mas estourou na mão dela. Hoje, o PMDB tem vice-presidente da Caixa, Banco do Brasil, no meu governo não tinha isso. Essa é a diferença. Agora, entre a Dilma e o Lula, existem outras diferenças. Para a Dilma, o Estado tem que ter um papel crucial no investimento e no controle. Ela é intervencionista. Tem uma visão mais general Geisel.
ISTOÉ – E isso é prejudicial?
FHC – É uma visão mais dos anos 60 e 70. Mas, em relação ao Lula, não houve uma mudança muito radical, como não haverá se o Aécio Neves ganhar. O Aécio não vai mexer na política do Bolsa Família. O que deverá fazer é aumentar o mercado de trabalho. Acompanhar a pessoa que é assistida até ter o emprego, como ocorreu no Chile. O ideal é que as pessoas não sejam dependentes. O Bolsa Família é uma solução de emergência, necessária, mas não para o futuro.
ISTOÉ – Uma das críticas que são feitas recorrentemente à oposição é que, além de esconder o sr. nas últimas eleições, ela não soube dizer o que poderia fazer de diferente. Chegou o momento de fazer isso?
FHC – A população está interessada no bolso, e isso pesa muito hoje, porque a inflação para o povo é mais do que 7% – está em cerca de 10%. Hoje, o Bolsa Família é menor do que o bolso. A Bolsa não é suficiente para o bolso. Para as classes mais populares a vida está cara. Para a classe média também. Para o povo, inflação é carestia. Estamos vivendo de novo um problema de carestia. Nisso o candidato de oposição tem que ser claro. O governo atual levou a essa situação.
ISTOÉ – Como o candidato Aécio Neves pode passar a segurança de que tem condições de mudar o quadro atual?
FHC – Eu cultivo o hábito de desligar o som da tevê toda vez que começa o programa eleitoral de algum candidato. Porque sei que as pessoas percebem muito mais é como o candidato fala. O jeitão. Se transmite firmeza, simpatia, segurança. Podem dizer: se for assim, a Dilma dificilmente seria eleita... Mas o Lula não. E quem elegeu Dilma foi o Lula. Então você tem um lado que é como a pessoa se relaciona com o conjunto da população. São 140 milhões de eleitores. Eles não vão ler programa de partido. Mal sabem o nome dos candidatos. Estão começando a aprender, salvo o do governo. E eles vão pensar: eu confio nesse cara ou não confio? Ele falou alguma coisa que tocou no meu coração? Bem, ele vai pensar que é no coração, mas é no bolso também... O candidato tem que ter uma conversa com o País. Eu ganhei duas vezes no primeiro turno. E já era o Lula. Nunca deixei de falar do jeito que eu falo, embora digam que eu falo pedantemente. Não é verdade. Eu tenho meu jeito, não adianta imitar o outro. Mas eu falava com o País. Fui pesquisador de campo e sei como é isso. O Lula fala com o País. Já a Dilma não fala com o País.
ISTOÉ – O Aécio fala com o País?
FHC – O Aécio pode falar. Jeitão ele tem. Ele passa uma simpatia. Mas precisa dizer alguma coisa que faça ele chegar lá. Ele foi governador de Minas Gerais. Conseguiu.
ISTOÉ – Quem, entre os candidatos, pode capitalizar melhor o que aconteceu em junho de 2013, quando houve as manifestações populares?
FHC – Por enquanto, ninguém. E quem for capitalizar agora vai perder. A população vai interpretar como oportunismo. Agora, é muito importante em qualquer eleição o bad ou o good feeling. Hoje existe um mal-estar no País. Isso favorece a oposição. Por isso, acho que temos grandes chances. Há também o cansaço de material. Fadiga. O Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, com 54% de apoio, é um dos poucos que contrariam essa tese.
ISTOÉ – Mas no caso do Geraldo Alckmin parece que há o efeito teflon. Nada cola nele, mais ou menos como acontecia antes com o Lula.
FHC – É verdade. Nada cola.
ISTOÉ – Há uma fadiga em relação ao PT?
FHC – Há uma fadiga em relação ao governo. Bem, também existe a fadiga da classe média em relação ao PT. Sobretudo em São Paulo. É assustadora essa rejeição de 47% no Estado e 49% na cidade.
ISTOÉ – O que todo mundo comenta, no meio político, é que a batalha de São Paulo terá um peso maior nessas eleições. O sr. concorda?
FHC – Se for isso, nós vamos ganhar. Olha, o PSDB nunca tinha conseguido isso e estamos alcançando agora. Uma harmonização grande entre São Paulo e Minas. No Rio, nunca tivemos uma grande força e agora o Aécio Neves tem sido hábil e conseguiu desorganizar lá a base do governo. Para vencer, precisamos consolidar o peso que temos por aqui e reduzir a diferença no Norte-Nordeste. No Estado de São Paulo, o Aécio ganha no segundo turno e, na cidade, no primeiro turno. No Sul, a gente ganha. Na Bahia, estamos razoavelmente bem. Em Pernambuco, o Eduardo Campos, candidato do PSB, vai tirar votos da Dilma. No Ceará, fizemos acordo com Tasso Jereissati e Eunício Oliveira, do PMDB. E temos as prefeituras de Maceió, Teresina, Belém, Manaus, algo que nunca tivemos. Por isso, a chance de ganhar aumentou. Claro que o aumento da possibilidade de vitória do Aécio decorre de outros fatores que já elencamos, como o mal-estar no País, o cansaço, os erros de condução da política econômica e, mais recentemente, a quebra de confiança do empresariado no governo.
ISTOÉ – Essa ruptura do governo com o empresariado aconteceu quando?
FHC – Entre seis meses e um ano. No começo havia o sonho do “Volta, Lula”, que vinha mais do meio empresarial do que do povo. Depois que essas pessoas se convenceram de que não seria o Lula, começaram a tomar distância. Quem vai decidir mesmo é a massa, mas há uma certa fluidez entre esses segmentos. Não é isolado. Por exemplo, teve o episódio das vaias a Dilma no estádio. E falaram: “Ah, mas é elite branca”. É um exagero, não refletiu só isso. Se fosse, as pesquisas agora não iriam apontar essa queda na avaliação da presidenta. Vamos considerar que, de fato, as pessoas de maior poder aquisitivo eram as que estavam presentes no estádio. É verdade. Mas quem chamou a elite branca para lá? Foi o governo. Sobre os xingamentos, a mim me chocou. Soube, depois, que o que disseram para a Dilma se tratava de um bordão comum nos estádios de futebol. Bem, de qualquer maneira, ir ao estádio é chamar vaia. Qualquer governante. Nas atuais circunstâncias, mais ainda. Mas não é algo isolado: um candidato com 47% de rejeição não pode dizer que quem está contra é somente a elite branca.
ISTOÉ – O sr. não acha que essa definição de elite branca se destina a enfatizar que o PSDB é o partido dos ricos e o PT o partido dos pobres?
FHC – É um estigma que o PT quer colocar. Mas o PSDB ganha em Alagoas, em Maceió, em Belém e no Piauí. Essas são algumas das regiões mais pobres do Brasil. O quadro médio do PSDB é o sujeito de classe média universitária. O do PT é o quadro sindical. Tem uma diferença, sim. Mas não é essa coisa de elite branca.
ISTOÉ – Mas o sr. não acha que essa imagem pode ter força eleitoral?
FHC – O que pega na eleição depende do que o eleitor quer ouvir. Há momentos em que o povo está disposto a ouvir certos estigmas. Há outros que não. Isso não é religião: “Eis aqui a verdade, eu sou a verdade”. Você pode dar o dado certo, mas, se o povo não estiver querendo ouvir, não vai ouvir. Eu acho que a diferença nessas eleições é que o povo está disposto a ouvir outras coisas. Eu não ganhei do Lula? E não sou de classe média e universitária, da elite branca?
ISTOÉ – Pela sua autodefinição, da elite meio branca...
FHC – Isso, da elite meio branca... Mas a questão é que agora acho que o eleitor está disposto a ouvir o outro lado porque há uma ruptura de confiança, a economia piorou, há um cansaço e uma fadiga de material. Por isso, considero agora que é provável a vitória do PSDB e de Aécio Neves.
ISTOÉ – O escândalo do mensalão não colou no PT em 2005 e 2006. Pode afetar agora depois das prisões de ex-integrantes da cúpula do partido?
FHC – Não pegou porque as pessoas não estavam dispostas a ouvir. Nem a classe média. Mas ali o PT perdeu a credibilidade. O Lula não perdeu popularidade naquele momento, não sei hoje, mas perdeu a credibilidade. O mensalão arranhou muito.
ISTOÉ – E o mensalão mineiro, que atingiu quadros do PSDB?
FHC – Teve pouca repercussão. E, por outro lado, o Eduardo Azeredo é um cara correto. Você acha que se fosse só o José Genoino ele iria para a cadeia?
ISTOÉ – O sr. vê uma diferença entre o José Genoino e os demais presos pelo mensalão?
FHC – Eu falei mais pela percepção da população. Racionalmente, eu acho que o Genoino tinha que ser preso porque ele assinou aqueles papéis. Mas ele não tem a imagem de um cara maquiavélico e que vai se locupletar. O Eduardo Azeredo também é um cara assim.
ISTOÉ – O Joaquim Barbosa é visto hoje como alguém que mudou a cara da Justiça do País, mas, ao mesmo tempo, como uma pessoa autoritária. O sr. acha que ele tem futuro na política?
FHC – Se ele fosse candidato, teria muitos votos. Porque tem esse lado da Justiça, que todo mundo quer, e porque ele é negro e teve coragem. São atributos valorizados. Mas ele teve o bom senso de não se candidatar. Iria esmaecer o que fez. Não acho que ele tenha aptidões políticas. Ele é justo. Mas política não é só isso. Impeachment, por exemplo, não é justiça. É julgamento político.
ISTOÉ – O STF é uma casa política?
FHC – É e tem que ser. Por isso acho que deveria se restringir a discutir assuntos constitucionais. Mas o julgamento do mensalão não foi político. Ele fez um julgamento comum, em última instância, um julgamento de crime. O Joaquim, que é promotor, aplicou a lei. E o povo gostou, porque ele aplicou a lei sobre poderosos. E foi importante, de fato.
ISTOÉ – Qual é a diferença do PSDB que pode chegar ao poder em 2015 daquele de 1994, quando o sr. foi eleito?
FHC – Em 1994, era um PSDB que começava a entender a mudança do mundo. Mas quem chegou ao poder não foi o PSDB, fui eu, por causa do sucesso do Plano Real. O povo viu que mudamos a vida dele. E ali eu ganharia sem apoio de ninguém. Não precisava de aliança. Fiz aliança com o PFL para conseguir governar. Era melhor fazer aliança antes do que depois. Mas eu ganharia sem o PFL. Como o Lula ganhou sozinho em 2002, não foi o PT. O Lula ganharia sozinho. Mas ele foi fazer aliança depois e deu no mensalão. Se tivesse feito antes, seria mais fácil. Ganhamos com o Plano Real e com o sentimento da população de que a vida melhorou. Hoje é diferente. Se o Aécio ganhar, não será ele que vai vencer só.
ISTOÉ – Por quê?
FHC – O peso do PSDB vai ser maior desta vez. O Aécio teve que articular bem. Ele está crescendo por causa da capacidade de articulação que tem.
ISTOÉ – Um dos problemas das últimas eleições foi que o partido rachou. O PSDB está unido hoje?
FHC – O PSDB uniu todo. O Aécio foi lá e fez. Foi, de fato, um dos problemas graves das últimas eleições. Agora, o Aécio vai enfrentar uma situação mais difícil que a minha, se ele ganhar a eleição. Os problemas se acumularam, não foram resolvidos e o PT será duro como oposição.
ISTOÉ – É um exagero dizer que aqui caminhamos para uma situação como a da Venezuela. Mas já se percebe que a campanha será muito acirrada. Há risco de o País sair dividido das urnas?
FHC – O Aécio tem uma grande capacidade pessoal de acabar com divisões. E a força de atração do poder é muito grande. O PT vai espernear, mas não tem capacidade de paralisar certos processos em marcha. Governar é sempre difícil. Você depende de sorte também. Como fazer o PIB crescer quando você tem crise no mundo? O governo Lula teve vacas gordas e não usou.
ISTOÉ – O que o sr. achou da denúncia sobre a construção, pelo governo de Minas Gerais, de um aeroporto dentro de uma área que pertenceu a um tio-avô do candidato do PSDB, Aécio Neves, e qual o impacto eleitoral disso?
FHC – O Aécio explicou que a construção se fez em área já desapropriada e pertencente ao Estado de Minas e que seu tio-avô contesta o valor da desapropriação. Se é isso, qual a acusação? Se há denúncia, que haja apuração, mas não creio que isso arranhe a candidatura. (Ceará News 7)
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