Ainda é apenas uma etapa, mas das mais importantes. Em novembro, uma
vacina contra o vírus zika, que está sendo desenvolvida pelo Instituto Evandro
Chagas, no Pará, em parceria com a Universidade Medical Branch do Texas, nos
Estados Unidos, deverá começar a ser testada em animais. Essa fase antecede os
testes feitos em seres humanos, esta sim a fronteira final para que a vacina
possa ser usada na população para combater o vírus que causa a microcefalia em
bebês. Os testes em animais, que estavam previstos para começar em 2017, foram
antecipados em três meses. O objetivo é desenvolver uma vacina com vírus vivo,
mas enfraquecido – ou atenuado, como é chamada cientificamente –, para ser
aplicada em dose única. O público-alvo serão mulheres em idade fértil, mas que
não estejam grávidas.
A boa notícia vem justamente num momento em que empresas farmacêuticas
manifestam dúvidas em entrar na corrida para desenvolver uma vacina contra o
zika. A agência de notícias Bloomberg afirmou que a Glaxo, a Merck & Co. e
a Johnson & Johnson “estão se movimentando lentamente”, ao contrário do que
aconteceu há dois anos, quando uma epidemia de ebola deixou 11 mil mortos na
África, e as empresas se engajaram em desenvolver novas drogas. O desânimo da
indústria para combater o zika estaria baseado na percepção de que não há
necessidade de uma vacina. Os executivos acreditam que, até a vacina ficar
pronta, muitas pessoas já terão imunidade ao vírus (o que certamente significa que ele já terá feito muitas vítimas). Assim, a
vacina seria um artigo para ser usado em surtos isolados e não em massa na
população, o que diminuiria os lucros das empresas.
O ponto de vista da indústria não é uma surpresa. Em entrevista a ÉPOCA
em fevereiro, o especialista em vacinas Peter Hotez disse que é um erro esperar
que a solução venha das grandes farmacêuticas. A perspectiva fria das contas no
papel, que parece sugerir que a vacina contra zika não é necessária, é bem
diferente da realidade enfrentada pelos médicos cotidianamente nos hospitais,
principalmente no Nordeste do país. Mulheres grávidas com sintomas de zika
continuam a chegar aos hospitais.
Os pesquisadores usam técnicas de engenharia genética para induzir
alterações em genes relacionados à capacidade do vírus de causar lesões. É
importante que ele continue sendo capaz de infectar as pessoas e estimular o
sistema de defesa a produzir anticorpos – mas tem de fazer isso sem causar as malformações que tristemente ficaram conhecidas mundo
afora. Os pesquisadores usaram técnicas de engenharia genética para alterar os
aminoácidos produzidos pelos genes. A cada alteração, eles fazem cópias do
vírus modificado e testam sua capacidade de infectar e causar lesões em células
animais e humanas cultivadas em laboratório. A ideia é selecionar a melhor
variante do vírus para uma vacina. É nessa etapa que os pesquisadores estão
agora.
O próximo passo é testar como esse vírus feito sob medida para a vacina
afetará camundongos com o sistema de defesa enfraquecido. A pesquisa em
voluntários humanos será feita pela Bio-Manguinhos, um dos institutos da
Fiocruz com experiência na produção de vacinas. São três fases, e o número de
participantes aumenta a cada etapa. Começa em torno de 200 voluntários, na
primeira fase, até chegar a 20 mil na terceira.
Pode levar até cinco anos para completar as três fases, mas Vasconcelos,
do Evandro Chagas, diz que é possível apressar o andamento diante da gravidade
da epidemia de zika. A partir do sinal verde da agência, o governo brasileiro
poderia apresentar à Organização Mundial da Saúde (OMS) a proposta para
encurtar os prazos de testes.
Nos testes com voluntários, os pesquisadores avaliarão
se a vacina é segura e se é capaz de estimular o sistema de defesa a produzir
anticorpos. Os parâmetros para considerá-la eficaz ainda não foram definidos. A
decisão será discutida na próxima reunião do Comitê de Emergência para Zika e
Microcefalia da OMS, que acontecerá nos dias 6 e 7 de junho, em Genebra. Ao
final do estudo, se a vacina for considerada eficaz, a patente será dividida
entre a Universidade do Texas e o Instituto Evandro Chagas. O governo
brasileiro produzirá a vacina para ser distribuída na rede pública, e a
Universidade do Texas poderá repassar o direito de comercialização a uma
empresa, que não poderá vender a vacina no Brasil. (Via: Revista Época)
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