Enrique Ricardo Lewandowski, de
67 anos, deve viver a partir de quinta-feira mais um momento de protagonismo na
história do País – o primeiro se deu quando foi ministro-revisor no caso do
mensalão, há quatro anos. Atual presidente do Supremo Tribunal Federal, a ele
cabe assumir o comando do Senado durante o julgamento final do impeachment da
presidente Dilma Rousseff. O processo tem prazo máximo de 180 dias.
Com o
mesmo perfil diplomático e sereno que marcou sua carreira em outros episódios, Lewandowski
gostaria de concluir o caso até setembro, quando termina seu mandato como
presidente da Suprema Corte e será substituído pela ministra Cármen Lúcia.
Lewandowski
chegou ao STF em 2006, indicado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(2003-2010). Nascido no Rio de Janeiro, foi criado na cidade de São Bernardo do
Campo, ABC paulista, mesmo cenário onde Lula ascendeu primeiro como líder
sindical e depois como líder político. Os dois nunca foram amigos, ao contrário
do que sempre se apregoou. Filho do dono de uma importadora de bicicletas na
cidade, Lewandowski iniciou-se na vida pública por intermédio do grupo político
adversário de Lula.
Lewandowski
foi apenas o quinto dos oito ministros indicados por Lula para o STF durante o
seu mandato. Ele substituiu Carlos Velloso, em março de 2006. O ex-presidente
já o conhecia de São Bernardo, mas não era tão próximo a ele. O que ligava os
dois, porém, era a amizade entre Karolina, mãe de Lewandowski, e a então
primeira-dama, Marisa Letícia Lula da Silva.
Apesar de não ter sido decisiva,
essa amizade teve influência para que Lula fizesse sua escolha entre as 11
opções que haviam sido apresentadas pelo então ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos, e pelo advogado e conselheiro Sigmaringa Seixas. Este nunca
engoliu a decisão de Lula. “Foi a única indicação da qual não participei”,
disse Sigmaringa mais de uma vez à reportagem.
No STF,
Lewandowski passou a ter maior dimensão da pressão da opinião pública sobre a
Corte a partir da abertura da ação penal do mensalão, em março de 2007. Em uma
conversa ao telefone flagrada pela reportagem da Folha de S.Paulo num
restaurante, ele teria dito que o STF havia votado pela abertura do julgamento
“com a faca no pescoço”, numa referência à pressão da imprensa no episódio. Uma
semana antes, um fotógrafo de O Globo havia registrado uma troca de mensagens
entre ministros feita pelos computadores do plenário, o que acabou antecipando
a posição de alguns deles.
Quatro
anos depois, sentiu o poder da opinião pública ao admitir numa entrevista que
poderia haver prescrição de crimes no mensalão por causa da demora na
apresentação da denúncia pelo então ministro-relator Joaquim Barbosa. Ali teve
início a briga entre os dois. Numa resposta à declaração de Lewandowski,
Barbosa acelerou a apresentação da denúncia, que acabou deflagrando o
julgamento no ano seguinte, em meio à eleição municipal de 2012. Após o
episódio, Lewandowski passou a evitar conversas com jornalistas.
Mais de
uma vez, o presidente do STF queixou-se das críticas que sofreu por causa de
sua atuação como ministro-revisor no mensalão. Contrário ao uso da teoria do
domínio do fato, ele votou a favor da absolvição do ex-ministro José Dirceu
(PT), por exemplo, e acabou sendo tachado como “governista”. Ancorado no “garantismo”
– teoria jurídico-filosófica definida pelo jurista italiano Luigi Ferrajoli
como modelo de estrita legalidade –, Lewandowski sempre achou que é preciso
zelo com o direito de defesa do cidadão em detrimento à força do Estado. Essa
postura ficou clara durante uma discussão sobre a regra que deveria ser adotada
pelo STF em caso de empate nas decisões do mensalão.
“Para
ver como o direito é bonito, é multifacetado, permite várias abordagens. Para
mim, como houve empate, significa que houve uma dúvida. Metade de nós pensa que
o réu é culpado, metade pensa que não é. Então há uma dúvida. É um princípio
multissecular e universal do Direito, acima até, como já disse outro dia, acima
do direito positivo dos Estados”, disse Lewandowski durante sessão no dia 2 de
outubro de 2012.
Lava Jato: Lewandowski
assumiu a presidência da STF quando já estava em curso a Operação Lava Jato,
que revelou um escândalo de corrupção na Petrobrás e foi decisiva para a
deterioração do governo Dilma Rousseff. Atento ao impacto da operação na
sociedade, ele tem buscado uma postura equidistante dos episódios que já
causaram a prisão de executivos, políticos e fragilizaram o ex-presidente Lula
e seu grupo. Lewandowski tem se orientado por explicitar suas decisões de forma
o mais clara possível, a fim de evitar mal-entendidos. Ele chega a usar
“linguagem jornalística” em seus votos e decisões.
Contudo,
sempre que pode, também não deixa de fazer ponderações à operação. Em setembro
do ano passado, auge da popularidade das prisões feitas pelo juiz Sérgio Moro,
ele publicou um artigo sob o título “Judicatura e dever de recato”, que foi
visto pelo mundo jurídico como uma crítica velada ao magistrado. “O recato, a
moderação e mesmo a modéstia são virtudes que a sociedade espera dessa categoria
especial de servidores públicos aos quais atribuiu o grave múnus de decidir
sobre a vida, a liberdade, o patrimônio e a reputação das pessoas,
conferindo-lhes as prerrogativas constitucionais da vitaliciedade,
inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos para que possam exercê-lo com
total independência”, escreveu no texto publicado em 13 de setembro.
Sobre o
impeachment da presidente Dilma Rousseff, Lewandowski compartilha da opinião
dos demais ministros do STF, de que “é preciso uma solução” sobre o afastamento
definitivo ou não de Dilma. Os dois têm apenas uma relação institucional. Há
quem diga que o presidente do STF guarda até uma mágoa da presidente por ela
não tê-lo ouvido sobre algumas indicações para cargos em tribunais superiores.
Seus auxiliares mais próximos garantem, porém, que isso jamais influenciaria
Lewandowski na condução do julgamento do impeachment no Senado. (Via: Estado de S.Paulo)
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