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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Entrevista ao Diretor Presidente do Instituto Cultural Raízes


O Povo com a Notícia: O que é o Instituto Cultural Raízes?

Libânio Neto: O Instituto Cultural Raízes é uma organização não-governamental, formada com caráter de associação civil de direito privado e sem fins lucrativos.

O Povo com a Notícia: Como surgiu o Instituto Cultural Raízes?

Libânio Neto: O Instituto Cultural Raízes é o resultado de um trabalho que havíamos realizado na zona da mata sul de Pernambuco e mais especialmente no município de Água Preta no período de 2001 a 2006. Depois iniciamos experiências no sertão até chegar em Floresta em 2009.

O Povo com a Notícia: Há quanto tempo o Instituto Cultural Raízes atua em Floresta?

Libânio Neto: Na verdade, atuamos em Floresta desde agosto de 2009. E já em 2010 instalamos a sede aqui no município.

O Povo com a Notícia: Qual o trabalho desenvolvido pelo Instituto?

Libânio Neto: Iniciamos com a realização de um levantamento cultural e depois um documentário realizado por ocasião da realização do Festival Pernambuco Nação Cultural em novembro de 2009. A partir daí concentramos nossa atuação no resgate e preservação das tradições culturais do povo florestano, vinculado à cultura popular do sertão e do estado.

O Povo com a Notícia: Neste período de 4 anos quais os trabalhos que mais se destacaram?

Libânio Neto: Em primeiro lugar o trabalho que realizamos junto às comunidades quilombolas que resultou na publicação de um livro, produção de documentário e na criação de diversos grupos culturais como a Banda de Pífano, Grupo de Dança da Mazurca, Grupo Flor do Pajeú composto de crianças quilombolas, entre outras ações que foram desenvolvidas visando o resgate dos elementos históricos e tradicionais.

Além disto, realizamos cinco Encontros de Tradições Culturais nas Comunidades Rurais de Floresta, onde destacamos o Forró Pé-de-Serra, a dança do São Gonçalo, a capoeira, maculelê, caboclinho, ciranda, coco de roda, afoxé e maracatu, que são tradições das culturas negra e indígena.
Por fim investimentos na formação de grupos culturais entre crianças, adolescentes e jovens, onde neste período criamos cinco grupos culturais, dos quais três permanecem atuantes até hoje, que são o Grupo Cultural Dandara, Grupo Afrobatuque e Grupo Filhos de N’Zambi.
É também marca de nosso trabalho a realização de oficinas de percussão, danças, artesanato, pintura em tela, violão, capoeira, entre outras, cujo público preferencial tem sido as crianças, adolescentes, jovens e remanescentes quilombolas e indígenas.

O Povo com a Notícia: O Instituto atua somente em Floresta?

Libânio Neto: Não. No nosso estatuto está estabelecido que podemos atuar em qualquer outro município de Pernambuco, muito embora nossa prioridade seja Floresta e região. Já realizamos atividades em municípios como Mirandiba, Belém do São Francisco e Petrolândia.

O Povo com a Notícia: Como se mantém o Instituto do ponto de vista financeiro?

Libânio Neto: Bem, a manutenção dos nossos trabalhos e projetos têm se dado nos últimos quatro anos através da prestação de serviços que realizamos em Floresta e que já realizamos em outras localidades. Especialmente, no momento, temos nos mantido através de doações, de parcerias e da venda de materiais de divulgação.

O Povo com a Notícia: Quantas crianças e adolescentes participam atualmente dos projetos?

Libânio Neto: Temos atendido de forma permanente a mais de 50 crianças, adolescentes e jovens remanescentes quilombolas e indígenas que residem no bairro do vulcão, santa rosa, cohab e na comunidade quilombola da Fazenda Melancia. Desenvolvemos com as meninas a parte de várias danças culturais e com meninos e meninas o Maracatu e o Afoxé.

O Povo com a Notícia: Quais os ritmos que são trabalhados na dança?

Libânio Neto: Trabalhamos os ritmos que são de origem afro-brasileira e indígena, e os ritmos que celebram a mistura entre o negro e o índio, os quais são: capoeira, maculelê, afoxé, maracatu, coco de roda, samba de roda, mazurca, caboclinho, ciranda, xaxado e danças africanas.
O Povo com a Notícia: E os grupos percussivos?

Libânio Neto: Temos dois grupos percussivos. O Afrobatuque que trabalha o ritmo do Maracatu de Baque Virado e o Filhos de N’Zambi que trabalho os ritmo do Afoxé.

O Povo com a Notícia: Porque trazer o Maracatu para Floresta?

Libânio Neto: Bem, o Maracatu de Baque Virado é uma expressão da tradição cultural desenvolvida pelos negros que foram trazidos da África e aqui foram escravizados. Em Pernambuco, entre outros ritmos, os negros criaram o batuque que recebeu o nome de Maracatu. Esta manifestação popular está vinculada historicamente à coroação do Rei e da Rainha do Congo, que aqui em Floresta se expressa na Confraria do Rosário. Realizamos uma profunda pesquisa sobre as origens africanas dos quilombolas de Floresta e encontramos no Maracatu de Baque Virado as semelhanças e o elemento mais forte para esse resgate e a relação com as origens. O próprio Luiz Gonzaga (que foi a maior expressão musical do nosso sertão e do nordeste) tem em seu repertório músicas de maracatu. E podemos ainda acrescentar (como revelou o próprio Luiz Gonzaga) que o baião tem suas origens no maracatu e no fado português.

O Povo com a Notícia: E o Afoxé?

Libânio Neto: O Afoxé é um ritmo desenvolvido também pelos africanos que aqui foram escravizados e tem uma relação direta com a religiosidade do negro, que trouxe da África suas referências históricas, culturais, sociais e religiosas. As cantigas e músicas de referência à ancestralidade africana, de afirmação da identidade afro-brasileira e especialmente de louvação aos Orixás.

O Povo com a Notícia: E a relação com a questão religiosa, o grupo é de terreiro, é de candomblé?

Libânio Neto: É muito importante esclarecer isso. O Afoxé também é definido como “candomblé de rua”. Nós trabalhamos com o resgate e preservação das origens e tradições do povo negro e do índio, então o Afoxé como o Toré (para os indígenas) são expressões de tradições culturais que tem seu perfil religioso sim. No entanto, não dizemos a nenhuma criança, adolescente ou jovem, nem tampouco a seus pais e mães, que religião deve seguir. O que não podemos é negar que a religiosidade esteja presente na cultura. O que queremos é que eles e elas (meninos e meninas) tenham consciência que quando tocam o maracatu ou o afoxé estão mantendo uma ligação profunda com seus ancestrais e antepassados e à força (o Axé) e a paz que são produzidos nos toques/baques e cantos são  de exaltação às nossas raízes humanas e à nossa cultura. Isso a maioria já entende e o que mais importa é que estamos tocando, cantando e dançando pra resgatar valores humanos e sociais, bem como reatar os laços culturais muitas vezes rompidos.

O Povo com a Notícia: Finalizando, este trabalho já sofreu algum tipo de preconceito?

Libânio Neto: Já presenciamos algumas reações preconceituosas, sobretudo em relação ao Afoxé. Neste sentido, nossa reação foi continuar tocando, cantando e dançando, porque o que fazemos é em nome de todos os nossos antepassados que sofreram a escravidão, a perseguição, os maus tratos e toda uma imensa carga de preconceito e discriminação e, em honra ao nome e a história que eles construíram, não podemos nos abalar. Más, muita gente que olhava atravessado, hoje tem opinião diferente, porque estamos levando uma formação de vida para diversas crianças, adolescentes e jovens. Não é só uma ocupação do tempo livre, é formação cidadã, é resgate da autoestima, é valorização humana. É uma oportunidade para construírem um presente e um futuro melhor. Por fim, o que podemos afirmar é que estamos promovendo a construção de perspectivas de vida diferentes, estamos promovendo verdadeiramente uma cultura de paz, através da música, da dança e de uma formação cidadã. 

Blog: O Povo com a Notícia