Assista o vídeo:
O ministro Luís Roberto Barroso,
do Supremo Tribunal Federal, disse que os corruptos tornaram-se “uma minoria
muito bem protegida no Brasil.” A despeito de desviarem milhões e manterem
contas no exterior, essas pessoas “são libertadas a granel”, declarou Barroso
neste sábado, num congresso de magistrados, em Maceió. Embora não tenha
mencionado nomes, Barroso soou como se criticasse o colega Gilmar Mendes.
Adepto da política de celas vazias, Gilmar mandou soltar dez presos envolvidos
em casos de corrupção apenas neste mês de maio.
Falando para uma plateia de juízes, Barroso empilhou decisões do Supremo
que favoreceram minorias e grupos vulneráveis. Citou a validação da Lei Maria
da Penha, a interrupção da gravidez em casos de fetos anencefálicos, o direito
ao aborto no primeiro trimestre da gravidez, o reconhecimento da união
homoafetiva e as cotas para negros e deficientes em universidades. De repente,
o ministro engatou na sua lista a minoria dos corruptos, insinuando que ela
também é beneficiária da suprema proteção.
“Existe uma minoria muito bem protegida no Brasil, atualmente: são os
corruptos. Pessoas que desviaram milhões e mantêm suas contas no exterior e são
libertadas a granel”, disse Barroso (confira no vídeo acima, a partir de
2min24s). São “liberações que expõem e desprestigiam os juízes de primeiro
grau, que enfrentam essa cultura de desigualdade que sempre protegeu os mais
riscos, essa cultura de compadrio. E as pessoas que ousam corajosamente romper
com esse círculo vicioso da história brasileira são frequentemente
desautorizadas, quando não humilhadas, por decisões judiciais de tribunais mais
elevados.”
Barroso solidarizou-se com os juízes que prendem os corruptos libertados
posteriormente por decisões superiores. “Sou solidário com quem se dispõe a
fazer esse trabalho. Ele é difícil, tem um custo pessoal alto, mas a história
está do nosso lado. Há uma velha ordem sendo transformada. Essa é a minha
convicção. Os aliados da corrupção no Brasil fazem um discurso libertário,
quando na verdade é uma leniência com uma velha ordem e uma cultura de desvio
de dinheiro público.”
As palavras de Barroso chegam nos últimos dias de um mês em que seu
desafeto Gilmar Mendes frequentou o noticiário como uma espécie de libertador-geral da República. Soltou uma dezena de
presos. Enviou ao meio-fio, por exemplo, Hudson Braga, secretário de Obras do
multicondenado Sergio Cabral, ex-governador do Rio. Soltou também Carlos
Miranda, principal operador de Cabral.
Gilmar mandou para casa Milton Lyra. Vem a ser um lobista ligado a
caciques do MDB do Senado —todos investigados em inquérito sobre desvios no
Postalis, o fundo de pensão dos Correios. Na sequência, Gilmar estendeu o
habeas corpus a outros quatro presos enrolados no mesmo caso: Marcelo Sereno,
ex-secretário nacional de comunicação do PT; Adeilson Ribeiro Telles, do
Postalis; Carlos Alberto Valadares Pereira, do Serpro; e Ricardo Siqueira
Rodrigues, operador financeiro.
Outro beneficiário de um alvará de soltura expedido por Gilmar foi Paulo
Vieira de Souza, o Paulo Preto. Trata-se de um suspeito de intermediar o
recebimento de propinas destinadas a políticos do PSDB de São Paulo. De resto,
o ministro mandou abrir as celas do empresário Sandro Alex Lahmann e do
delegado Marcelo Luiz Santos Martins, ambos enrolados em inquérito que apura
irregularidades no sistema prisional do Rio de Janeiro.
A rivalidade entre Barroso e Gilmar costuma eletrificar as sessões do
Supremo. Eles integram turmas diferentes. Barroso tem assento na Primeira
Turma. Mais rigoroso no julgamento de pedidos de habeas corpus, esse colegiado
foi apelidado de “Câmara de Gás”. Gilmar compõe a Segunda Turma, cuja
generosidade no deferimento de pedidos de liberdade inspirou a denominação de
“Jardim do Éden.” A divergência entre os dois magistrados aflora no plenário da
Suprema Corte.
Num dos embates que travaram em plenário, no dia 26 de outubro de 2017,
Barroso e Gilmar escancararam as visões distintas que cultivam sobre a prisão
de integrantes da minoria dos corruptos. Estava em julgamento uma ação sobre a
extinção do Tribunal de Contas dos Municípios do Ceará. Ao votar, Gilmar
criticou a forma como o Rio de Janeiro, Estado de origem de Barroso, aplicava
dinheiro de terceiros depositado na Justiça para pagar dívidas discutidas em
processos pendentes de julgamento.
Abespinhado com a menção ao Rio, Barroso mencionou o Mato Grosso, Estado
de Gilmar, “onde está todo mundo preso''. Gilmar indagou: “E no Rio não
estão?” Barroso emendou: “Nós prendemos, tem gente que solta.” Seguiu-se um
bate-boca que pode ser revisto no vídeo abaixo. A certa altura, irritado,
Barroso foi à canela de Gilmar: “Não transfira para mim essa parceria que vossa
excelência tem com a leniência em relação à criminalidade de colarinho branco.”
Noutro ponto, Gilmar respondeu: “Quanto ao meu compromisso com o crime de
colarinho branco, eu tenho compromisso com os direitos fundamentais. Fui o
presidente do STF que foi, inicialmente, quem liderou todo o mutirão
carcerário. São 22 mil presos libertados e era gente que não tinha sequer
advogado. Não sou advogado de bandidos internacionais.”
E Barroso: “Vossa excelência vai mudando a jurisprudência de acordo com o
réu. Isso não é Estado de direito, é Estado de compadrio. Juiz não pode ter
correligionário.” No discurso deste sábado, Barroso disse coisas muito
parecidas, com outras palavras: “Os aliados da corrupção no Brasil fazem um
discurso libertário, quando na verdade é uma leniência com uma velha ordem e
uma cultura de desvio de dinheiro público.” Além de Barroso, participaram do
encontro de juízes em Maceió outros três ministros do Supremo: a presidente
Cármen Lúcia, o vice-presidente Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello. (Via: Blog do Josias de Souza)
Blog: O Povo com a Notícia