Aquilo que era tratado como
testes pelo setor elétrico será materializado nos próximos dias. A vazão do rio
São Francisco será reduzida dos atuais 1.100 m³ por segundo para 1.000 m³ por
segundo. A solicitação já havia sido feita desde o ano passado, mas a Agência
Nacional de Águas (ANA) aguardava um posicionamento do Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), que emitiu parecer recentemente.
A decisão foi anunciada nesta última terça-feira (17), durante
reunião na sede da ANA, em Brasília. O órgão ambiental, representado pela
coordenadora-geral Regina Generino, avalia que apesar de autorizar a defluência
de 1.000 m³ por segundo, foram registradas alterações na calha do rio, a
exemplo do aumento em até quatro vezes da presença de nitrato, especialmente na
região do Baixo São Francisco. “Além disso, a cunha salina também apresenta
alterações, especialmente na proximidade com a foz, no município alagoano de
Piaçabuçu”, revelou Generino.
O nitrato, presente no esgoto doméstico e nos descartes de
indústrias e pecuaristas, representa especial risco à saúde de crianças,
causando danos neurológicos ou redução da oxigenação do corpo. Além disso, a
presença excessiva de nitratos em rios ou mares estimula o crescimento de
algas, fenômeno conhecido como eutrofização. Em casos extremos, essas algas
podem colorir a água e emitir substâncias tóxicas para os peixes.
Durante a reunião, o diretor de Operações da Companhia
Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), Mozart Bandeira Arnaud, anunciou que a
meta é aplicar a defluência de 900 m³ por segundo. O presidente da ANA, Vicente
Andreu Guillo, descartou, nesse momento, qualquer discussão nesse sentido. “O
setor elétrico precisa definir qual a real necessidade de operação”, alertou
Andreu.
O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São
Francisco (CBHSF), Anivaldo Miranda, criticou a falta de um padrão nos pedidos
do setor elétrico, bem como a visão do segmento, que só vê o rio como gerador
de energia elétrica. “Apesar dos cenários diversos, a discussão só acontece no
sentido de aplicar reduções no São Francisco”, criticou ele. Como alternativa,
Miranda convidou a todos os participantes da reunião a se integrarem nas
atividades relativas às discussões com vistas a atualização do Plano de
Recursos Hídricos do São Francisco.
Anivaldo Miranda também solicitou acesso ao relatório
detalhado elaborado pelo Ibama, o qual se baseou para conceder a autorização na
vazão menor do rio. “Porque a crise na bacia é mais profunda do que se relata.
Fala-se, aqui, em bacia hidrográfica, mas só se fala na calha do rio. A bacia é
muito maior e o retrato atual não é nada bom. Faço, aqui, um apelo pungente
para que, paralelamente à situação atual, também se construa soluções para o
rio”, disse o presidente do CBHSF.
O superintendente da Companhia de Desenvolvimento dos Vales
do Paraíba e do São Francisco (Codevasf), Alaôr Grangeon Siqueira, reforçou a
gravidade por que passa a bacia do São Francisco atualmente. Segundo ele,
muitos produtores rurais estão na iminência de parar de produzir, pois dependem
unicamente da água do Velho Chico e a captação está cada vez mais difícil. O
superintendente da ANA, Joaquim Gondim, destacou que é fundamental, nas futuras
reuniões, a presença de representante da Marinha, com o objetivo de discutir um
outro aspecto de grande importância diante do cenário atual, que é o de
navegação.
Situação de Três Marias em
debate: Na reunião realizada nesta última terça-feira (17) na sede da Agência Nacional de Águas, em Brasília, o
reservatório de Três Marias (MG) também foi motivo de pauta, visto que a vazão
praticada no local foi reduzida recentemente de 100 para 80m³ por segundo. De
acordo com o gerente da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Marcelo
de Deus Melo, os testes aplicados na região garantem a continuidade da
defluência atual.
Conforme sua explanação, o
reservatório apresenta um índice de 28% no seu nível e os estudos
meteorológicos na região indicam para a possibilidade de aumentar a defluência
para 120 m³ por segundo a partir de maio. “Mas isso é uma hipótese”, pois,
conforme alerta Marcelo de Deus, depende de confirmação dos dados técnicos
relativos às chuvas na região. “Mantendo-se esse quadro, o reservatório deverá
operar por todo o ano com um índice médio na faixa dos 20%”, garantiu.
Participaram ainda da reunião,
na sede da ANA, representantes do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS),
Ministério do Meio Ambiente, Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel),
Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae) de Pirapora (MG) e Agência Nacional de
Transportes Aquaviários (Antaq), além do corpo técnico da Agência Nacional de
Águas.
O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco é
um órgão colegiado, integrado pelo poder público, sociedade civil e empresas
usuárias de água, que tem por finalidade realizar a gestão descentralizada e
participativa dos recursos hídricos da bacia, na perspectiva de proteger os
seus mananciais e contribuir para o seu desenvolvimento sustentável. A
diversidade de representações e interesses torna o CBHSF uma das mais
importantes experiências de gestão colegiada envolvendo Estado e sociedade no
Brasil.
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