Por Josias de Souza
O curioso da lógica do governo de
Michel Temer é que ela tem cara de lógica, tem rugido de lógica, tem rabo de
lógica, mas é o mais puro absurdo. Graças à falta de sentido, Temer alcançou
uma proeza: tornou-se tão detestado quanto Dilma Rousseff. Antes de ser
afastada pela Câmara, no ano passado, Dilma era rejeitada por 63% dos
brasileiros. Apenas 13% aprovavam sua Presidência. O Datafolha informa que o prestígio de Temer também roça
a sarjeta. Sua taxa de rejeição é de 61%. O índice de aprovação é de irrisórios
9%.
O povo não gosta daquilo que não entende. E o governo capricha na falta de
nexo. Por exemplo: reza o discurso oficial que, se Temer trocar os ministros
acusados de corrupção, seus aliados darão o troco, travando as reformas no
Congresso. Sem as reformas, não haverá prosperidade. Logo, se Temer não for
condescendente com a ladroagem, o PIB não sai do abismo. Beleza. O diabo é que
uma das incomodações políticas do brasileiro, desde a época em que ainda havia
política no Brasil, é a sensação de que, nessa atividade, nada se perde, nada
se cria. Tudo se corrompe.
Os indicadores oficiais sinalizam que, sob Temer, o governo parou de cavar
o buraco em que Dilma enfiara a economia. Mas a pujança do desemprego esclarece
que os resultados, se vierem, demorarão a chegar. Encontram-se no olho da rua
14,2 milhões de patrícios. E o governo, na sua lógica do aburdo, espera que
todos compreendam que qualquer um pode perder o contracheque, menos os
ministros que respondem a inquérito no Supremo Tribunal Federal.
Simultaneamente, Temer pede compreensão para uma reforma da Previdência que 71% dos brasileiros rejeitam e para mudanças na
CLT que 60% enxergam
como coisa benéfica para os patrões.
Pregoeiro da nova ordem, Temer conserva os pés enfiados no lodo da velha
desordem. Em todas as suas entrevistas, o presidente divide-se entre a defesa
de suas reformas impopulares e o mantra que elaborou para justificar o convívio
com o lixão da Lava Jato. Investigação não é denúncia, argumenta Temer, em
defesa dos ministros encrencados. Denúncia tampouco é ação penal. Demissão? Só
depois que o ministros virarem réus. Como isso pode demorar uns dois anos, só
sai quem quiser, na data que preferir.
Na época em que o presidente deposto se chamava Fernando Collor e o
substituto-tampão atendia pelo nome de Itamar Franco, o chefe da Casa Civil foi
licenciado do cargo depois que seu nome — Henrique Hargreaves — soou numa CPI. Só
retornou à poltrona após demonstrar sua inocência. Agora que ficou sabendo que
a política foi comprada pelo departamento de propinas da Odebrecht, o
brasileiro tende a ser mais intransigente. Não é que ele seja contra a
imbecilidade retórica. Apenas não suporta a ideia de continuar fazendo papel de
imbecil.
Na série histórica das pesquisas do Datafolha, a menor taxa de aprovação
desde a redemocratização do país pertence a Dilma. Foi alcançada em agosto de
2015, quando apenas 8% dos brasileiros avaliaram o seu governo como ótimo ou
bom. Quando o índice ganhou as manchetes, Temer, ainda na pele de vice, fez um
vaticínio: ''Ninguém vai resistir três anos e meio com esse índice baixo” de 7%
ou 8% de popularidade. Agora, já investido no papel de versa, Temer soma 9% de
ótimo e bom.
Com a imagem carbonizada, o substituto constitucional de Dilma talvez
sinta a necessidade de interrogar o espelho: como resistir até 2018? E a imagem
refletida responderá: sua sorte é não ter um vice.
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