Um político nunca deve dizer uma
mentira que não possa provar. Alheia a esse ensinamento, Dilma Rousseff flertou
com a auto-desmoralização. Fez isso ao divulgar uma nota na qual sustenta que o
agora presidiário Sérgio Cabral “jamais foi aliado”. O vídeo acima, gravado na
campanha de 2010, mostra que a aliança que Dilma tenta negar foi construída
ainda no governo Lula. A peça exibe os aliados num comício conjunto. Ela
disputava a Presidência. Ele reivindicava a reeleição ao governo do Rio. Nessa
época, Cabral trombeteava as UPPs, Unidades de Polícia Pacificadora — uma
experiência que Dilma prometia reproduzir em âmbito nacional.
Afora esse vídeo, veiculado pela própria campanha de Cabral,
o bom relacionamento político do cacique do PMDB fluminense com Dilma está
fartamente documentado no noticiário. Em sua nota, Dilma escreve que, em 2014,
Cabral fez campanha para o tucano Aécio Neves, seu principal adversário. Nesse
ponto, madame pronuncia uma meia verdade. E privilegia exatamente a metade que
é mentira.
O que houve em 2014 foi uma desavença entre o presidente do
PMDB do Rio, deputado estadual Jorge Picciani, e a direção do PT. Por conta
esse desentendimento, Picciani lançou uma opção de voto híbrida. Batizou-a de
“Aezão”: para o Planalto, Aécio. Para o governo do Rio, Pezão. Cabral, com o
prestígio já meio abalado por denúncias de corrupção, não chegou a encampar
publicamente a ideia. Ao contrário, deu delcarações pró-Dilma.
Noutro trecho da nota. Dilma sustenta que Sérgio Cabral
orientou seus liderados a votarem a favor do impeachment. Ai, ai, ai. Quem
comandou a infantaria pró-impeachment foi outro cacique do PMDB do Rio: Eduardo
Cunha, então presidente da Câmara. Àquela altura, Cabral fingia-se de morto
para não ser notado pela Lava Jato. Era carta fora do baralho.
Dilma fez o que pôde para selar uma aliança com Cunha. Em
troca do engavetamento do impeachment, prometia que os representantes do PT no
Conselho de Ética da Câmara votariam contra a cassação do mandato do deputado.
Mas o PT roeu a corda. E Cunha colocou para andar o pedido de impedimento.
Numa tentativa de dividir o PMDB, Dilma aproximou-se do líder
do partido na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ). Logo ele! Filho de Jorge
Picciani, aquele cacique que firmara acordo com Aécio no Rio, o neo-aliado de
Dilma fizera campanha de rua ao lado do presidenciável tucano.
Dilma deu de ombros. E ainda ofereceu a Leonardo Picciani a
primazia na indicação de um correligionário para o prestigiado Ministério da
Saúde. Foi ao Diário Oficial o nome do deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), um
desafeto de Eduardo Cunha. Esforço inútil. O impeachment passou na Câmara. E
foi ratificado no Senado. Hoje, Leonardo Picciani é ministro do Turismo de
Michel Temer.
Em vez de mentir sobre Cabral, Dilma deveria desfrutar da
experiência de contar a verdade sobre seu relacionamento com o PMDB do Rio.
Nessa matéria, a verdade é muito mais incrível do que a ficção. É tão
inacreditável que é difícil de inventar. (Via: Blog do Josias de Souza)
Blog: O Povo com a Notícia