Do jeito que entrou, a artista plástica e tatuadora Daniella de Moura, 36, imagina que sairá deste período de pandemia. Nada de evolução espiritual e pessoal motivada pelo sofrimento imposto por meses de isolamento social.
Dela,
pode-se até esperar mais resiliência, mas isso se deverá mais à necessidade de
se adaptar ao mundo pós-Covid-19 do que ao resultado de um processo de
aprimoramento pela dor. Tampouco ela imagina ver qualquer mudança positiva nos
outros. "As pessoas são as mesmas, vão continuar sendo", diz.
Daniella, no entanto, faz
parte de uma minoria. De acordo com pesquisa Datafolha, 73% dos brasileiros
acham que irão se tornar pessoas melhores quando a pandemia passar.
São pessoas como Raquel Vasques Escobar, fisioterapeuta respiratória e
coordenadora de produto em uma empresa multinacional.
"Estávamos vivendo de uma forma muito automatizada", diz.
"Viver uma situação em que você não tem controle te convida a olhar para
isso. O caos gera mudanças."
Para 23% dos entrevistados, isso não os fará nem melhores, nem piores;
apenas iguais ao que eram antes do surgimento do novo coronavírus –como no caso
de Daniella. Há também aqueles que se imaginam versões pioradas de si mesmos ao
fim desse período (1%), e 2% não souberam responder.
A pesquisa ouviu 2.065 brasileiros adultos que possuem telefone celular em
todas as regiões e estados do país. O levantamento foi realizado por telefone
para evitar o contato pessoal. A margem de erro é de dois pontos percentuais,
para mais e para menos. A coleta de dados aconteceu nos dias 11 e 12 de agosto.
Apesar de a maioria dizer acreditar em um processo de evolução
pós-pandemia, os dados do Datafolha dão mostras de que essas pessoas acreditam
mais em suas próprias capacidades de transformação do que no potencial alheio.
Enquanto 73% dos entrevistados afirmam que se tornarão pessoas melhores, o
índice dos que esperam que a maioria dos brasileiros também seguirá o mesmo
caminho cai para 54%. Para 31%, a maioria de seus compatriotas sairá da pandemia
igual, como Daniella.
Mais uma mostra de que as pessoas acreditam mais em si mesmas do que nos
outros, o percentual dos que esperam que a maioria dos brasileiros se torne
pior é de 9% –ante 1% correspondente aos que admitem que se tornarão versões
pioradas de si mesmos quando puderem finalmente se ver livres da ameaça da
doença que já havia matado 113.482 pessoas no país e contaminado mais de 3,5
milhões, até a manhã de sábado (22).
Para Daniella, o isolamento social é uma das causas que a fazem desacreditar
na capacidade de mudanças positivas para os brasileiros.
"As pessoas estão dentro de casa se informando de forma torta. O
isolamento favorece que isso não mude. Até a popularidade do [presidente Jair]
Bolsonaro subiu", diz.
Raquel, no entanto, vê a mesma situação de forma oposta. Ela, que faz
meditação diariamente, afirma que essa prática favoreceu seu equilíbrio diante
da pandemia. A fisioterapeuta diz esperar que, quando esse período passar,
haverá reflexos positivos, da vida profissional às relações pessoais.
"A gestão do tempo e a autorresponsabilidade são dois desses aspectos
[no trabalho]", diz Raquel. "Eu, com certeza, já saio melhor, porque
venho de um processo em que acho que é importante valorizar a vida e o que tem
a seu redor."
A aparente crença em uma certa superioridade em relação às outras pessoas,
apontada pelo levantamento, também se manifesta em uma pergunta diferente.
O instituto de pesquisa questionou os mesmos entrevistados sobre o uso de
máscaras fora de casa e com que frequência isso ocorre.
Entre os 2.065 respondentes, 92% afirmaram usar sempre esse item de
proteção.
Quando a pergunta se deslocou para o uso da máscara fora de casa pelas
"pessoas de sua cidade", o percentual dos que afirmaram que isso
ocorre com frequência diminuiu para 52%.
Blog: O Povo com a Notícia