Em sua segunda reunião, a
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fosfoetanolamina aprovou,
nesta terça-feira (07), a convocação de nove pessoas para falar sobre possíveis
falhas na condução dos testes clínicos para a liberação da substância sintética,
também conhecida como pílula do câncer. Os testes clínicos em humanos tiveram
início em julho do ano passado e pretendiam testar a eficácia da
fosfoetanolamina sintética no tratamento do câncer.
Entre as pessoas que serão ouvidas na CPI da Assembleia Legislativa de São
Paulo, estão o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC), Ildeu de Castro Moreira, o professor Gilberto Chierice, um dos
estudiosos da pílula, e Bernadete Chioffi, membro da auditoria dos testes
clínicos. A próxima reunião da CPI será na próxima terça-feira (14), às 14h30. Além dos três especialistas, deverão ser ouvidas pessoas que participaram da
fabricação da pílula e da aplicação dos testes.
A pílula, que vinha sendo distribuída a pacientes oncológicos mesmo sem
ter sido testada e comprovada por testes clínicos e sem ter registro da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), gerou polêmica no país. A
distribuição foi proibida e muitas pessoas começaram a entrar na Justiça para
ter acesso à substância. Testes clínicos em humanos começaram, então, a ser
feitos em São Paulo para testar a eficácia da droga.
Os testes foram conduzidos pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
(Icesp), com o acompanhamento de , Gilberto Chierice, pesquisador aposentado do
campus da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos. Em março deste ano, o
Icesp suspendeu os estudos porque concluiu pela falta de comprovação da
eficácia da fosfoetanolamina sintética no combate ao câncer. Segundo a
pesquisa, de 72 pacientes com tumores sólidos avançados tratados com a pílula
do câncer, apenas um obteve resposta parcial.
A CPI da Fosfoetanolamina foi criada em outubro deste ano para pretende
apurar as razões que motivaram o estado de São Paulo a suspender as pesquisas
para liberação da substância, produzida por cientistas no campus da USP em São
Carlos. De acordo com o presidente da CPI, deputado Roberto Massafera (PSDB), o
objetivo não é investigar a eficácia da substância, mas se houve falhas
nos testes clínicos para sua liberação.
“Os auditores que participaram [dos testes clínicos] apontaram várias
falhas, e essas falhas não foram corrigidas. Para se ter a dosagem ideal de um
produto, que ainda não é medicamento, é preciso fazer um teste chamado
fármaco-dinâmico. E isso não foi feito”, disse o deputado. É preciso saber a
dosagem certa para tomar um medicamento, alertou o deputado. "Você toma
uma pílula e vê a dosagem, toma duas e vê a dosagem, para saber a dosagem
recomendada para o paciente. Isso não foi feito”, afirmou Massafera.
"Ao final dos trabalhos, a CPI tem a obrigação de investigar se o
dinheiro que o Estado aportou para essa pesquisa foi bem utilizado. E vamos
responsabilizar se não foi. E refazer o que não foi feito”, acrescentou o
deputado.
O relator da CPI, deputado Ricardo Madalena (PR), informou que a comissão
vai investigar se os testes feitos no Icesp realmente cumpriram o protocolo da
Anvisa. "Vamos apurar com muita responsabilidade e transparência se houve
crime”. De acordo com o parlamentar, se forem constatadas falhas, os culpados
serão responsabilizados. “Segundo consta, precisamos apurar se as recomendações
do corpo clínico do professor Gilberto [Chierini] foram seguidas. E também se
cumpriram o protocolo que é norma da Anvisa.”
A CPI é composta também pelos deputados Márcia Lia (PT), Ed Thomas (PSB),
Cássio Navarro (PMDB), Sebastião Santos (PRB), Márcio Camargo (PSC), Rafael
Silva (PDT) e Gileno Gomes (PSL).
Esperança
de cura
Na tarde de hoje, a CPI da Fosfoetanolamina foi acompanhada pela
professora Deize de Jesus dos Reis, de 32 anos. Ela busca a liberação da pílula
para o seu pai, que tem câncer no intestino.
“Descobrimos que ele tinha câncer há três meses, no intestino, com
metástase no fígado”, disse Deize, muito emocionada. “Entramos com uma liminar
[na Justiça] e estamos aguardando há mais ou menos um mês pela liberação da
fosfo [fosfoetanolamina]. Até agora, não tivemos a resposta”, disse a
professora.
“Eu acredito que na fosfo [a fosfoetanolamina] esteja realmente a
esperança da cura do câncer”, disse Deize à Agência Brasil. Para a professora,
a CPI pode ajudar a “acelerar o processo de liberação” da substância.
Histórico
Sintetizada há mais de 20 anos, a fosfoetanolamina foi estudada pelo
professor aposentado Gilberto Orivaldo Chierice, quando ele era ligado ao Grupo
de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da USP, no campus de São Carlos.
Algumas pessoas passaram a usar as cápsulas contendo a substância, produzidas
pelo próprio professor, como medicamento contra o câncer.
No Icesp, os testes foram feitos com base em orientações de Chierice, da
sintetização e encapsulamento até a dosagem oferecida.
Em junho de 2014, uma portaria da USP determinou a obrigatoriedade de
substâncias em fase experimental terem todos os registros antes de serem
distribuídas à população.
Desde então, pacientes que tinham conhecimento das pesquisas passaram a
recorrer à Justiça para ter acesso às pílulas. O Tribunal de Justiça (TJSP) de
São Paulo chegou a receber centenas de pedidos de liminar para garantir o
acesso à substância.
No dia 22 de março do ano passado, o Senado aprovou o projeto de lei que
possibilita o uso da substância mesmo antes de a fosfoetanolamina ser
registrada e regulamentada pela Anvisa.
No mesmo mês, a USP denunciou o professor Gilberto Chierice por crimes
contra a saúde pública e curandeirismo. A universidade também fechou o
laboratório onde eram produzidas as pílulas, já que o servidor técnico que
produzia a pílula foi cedido à Secretaria Estadual de Saúde para auxiliar na
produção da substância para testes sobre seu possível uso terapêutico.
O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a interrupção do fornecimento
da pílula do câncer pela USP, após o fim do estoque. A Corte analisou um pedido
feito pela universidade USP contra uma decisão do TJSP que determinava o
fornecimento da substância. (Via: Agência Brasil)
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