Newton Ishii, mais conhecido como
o japonês da Federal, concedeu entrevista à Folha cuja publicação aconteceu
neste domingo (17). O japonês, que ficou famoso ao ser fotografado inúmeras
vezes conduzindo presos célebres da Operação Lava Jato, revelou que não gosta
muito de ver as notícias por causa das fake News e diz que explica: “Demorei um
ano para entender que tinha ficado famoso”. Tão famoso que sua vida virou
livro: “O Carcereiro — o Japonês da Federal e os Presos da Lava Jato”,
biografia escrita pelo jornalista Luís Humberto Carrijo, estará disponível nas
livrarias a partir do dia 7 de julho. Ishii fará sessões de autógrafos em cinco
capitais: SP, RJ, Brasília, Belo Horizonte e Curitiba. Boa parte da obra está
dedicada à convivência dele com réus ilustres como Marcelo Odebrecht e Antonio
Palocci.
Na sua gestão, as salas ficavam destrancadas e ele conversava com os
outros agentes para que evitassem tratar os presos famosos de forma que
revelassem algum “recalque”. “Se algum dos presos tivesse um problema de saúde
ou psicológico, seria preciso interná-lo. Eu precisaria de oito homens só para
fazer escala no hospital”, afirma. Esposas, pais e filhos dos presos também
recebiam um tratamento especial do japonês. “Queria que a família chegasse lá
sorrindo e não chorando, desesperada. Porque isso também atrapalharia lá
dentro. Cometeram crime? Cometeram. Mas são pessoas cultas, inteligentes, que
sempre me trataram com respeito”.
“Um dia o [lobista Fernando] Baiano começou a chorar comigo porque o filho
caçula tinha completado um ano e tinha dito ‘papai’. Ele não queria receber
visita dos meninos. Um dia eu disse: ‘Bota lá na minha sala e fala pros seus
filhos que você trabalha aqui na Polícia Federal’. Mas ele não quis”.
Newton afirma que tratava os presos comuns da mesma forma. “A diferença
entre eles é a falta de educação. Só que o homem é como qualquer animal. Se
você tratar bem, ele vai te tratar bem. Pode ser traficante, contrabandista,
falsificador ou pedófilo: eu sempre tratei com o maior respeito. E esse respeito
voltava”.
“Um dia o pessoal [réus da Lava Jato] começou a me perguntar se eu não me
lançaria candidato. Eles falaram: ‘O Pedro Corrêa [ex-deputado federal] tá
aqui, ele te ensina’. [Corrêa] se vira para mim e diz: ‘Se eu ensinar, daqui a
um tempo o senhor está aqui com a gente, viu?”, conta o ex-agente, rindo em
entrevista à Folha. “Também fiz uma brincadeira com a mulher do Palocci, que
ele me apresentou no dia de visitas. Eu falei: ‘Não era essa que tava ontem na
visita íntima’. O Palocci arregalou o olho. E ela olhou sério para ele. Eu
falei: ‘Desculpa, Palocci, acho que dei uma bola fora’. Ele me disse que
demorou um mês para convencer ela de que era uma brincadeira.”
Ishii se orgulha de sua relação com os presos: “fiquei quatro anos
lá e nunca deu uma discussão”, diz. “Foi eu sair e deu problema com o
[ex-governador do Rio Sérgio] Cabral. No episódio das algemas [em janeiro, o
ex-governador do Rio foi levado com algemas nas mãos e nos pés para exames de
corpo de delito]”. “Na minha época ninguém andava algemado. A mão para trás é
segurança. A pessoa pode bater na arma do policial, que pode achar que ela está
tentando pegar. Nós caminhamos devagar não para a imprensa fotografar — mas
para evitar cair ou tropeçar”.
Ishii lembra que um dia o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró tropeçou e
caiu no prédio Justiça Federal. “Outra vez, ele caiu da escada na cela. O
agente penitenciário foi perguntar se ele tinha se machucado. Cerveró
respondeu: ‘Porra, caralho, claro que eu me machuquei!’.” Ishii diz que o
agente o chamou pra contar o que aconteceu. “Determinei que aquela ala ficasse
três dias na tranca direto e sem banho de sol. Todos os outros presos xingaram
o Cerveró depois”.
“Para mim não tinha Zé Dirceu, Zé Antônio ou Zé do Caixão. Era todo mundo
igual. Brincava com eles [da Lava Jato], mas brincava com os outros também.
Tirei várias fotos com família de preso, mandei vídeo para mãe de preso,
inclusive os da Lava Jato”, diz. A convivência acabou criando afeto entre
carcereiros e presos. “Se eu pudesse, visitaria o Marcelo [Odebrecht]. Mas, se
eu chego lá [na casa do empreiteiro, que cumpre prisão domiciliar], a imprensa
me fotografa. Vão dizer que fui cobrar a propina.”
Ishii rechaça a ideia de que a Lava Jato seria partidária. “[Os tucanos] não
foram presos porque ainda não foram julgados. Quanto tempo o Lula demorou para
ser preso? Quatro anos. E foi por uma besteira”. “Fui contra ele ter vindo pra
cá [Curitiba]. Pra que gastar tanta grana pra fazer o deslocamento e trazer
colegas de fora para nos ajudar? Ele podia ter ficado em SP, num quartel ou na
PF. Até falei isso pro superintendente da PF, que não gosta muito de mim, não
sei por quê. Mas ele disse que o [juiz Sergio] Moro não entende.”
Ishii se aposentou em fevereiro deste ano e atualmente é o presidente do
partido Patriota no Paraná. “Não vou ser candidato. Mas tenho dado palestras
para pré-candidatos. Falo sobre a importância do voto. Vamos analisar: Newton,
famoso, Japonês da Federal. E o meu voto vale tanto quanto o do pedinte”.
A obra sobre a vida dele mostra, entre outras aventuras, como em determinado
momento ele passou da condição de carcereiro para a de encarcerado: em junho de
2016, Ishii foi preso por quatro dias após ser condenado por facilitação de
contrabando, crime que teria cometido há 13 anos. Por quatro meses, usou
tornozeleira eletrônica. Ele acredita que sua condenação só aconteceu devido à
fama. E que sua punição tenha sido uma tentativa de “manchar a Lava Jato”.
Ficou triste. Mas diz que já havia passado por coisa muito pior. “Perdi meu filho [em 2005] e, quatro anos depois, a minha mulher [que sofreu um infarto]. Namorei com ela dos 15 aos 53 anos. Era minha companheira, meu tudo. Nada mais pode me atingir”, finalizou em entrevista à Folha.
Ficou triste. Mas diz que já havia passado por coisa muito pior. “Perdi meu filho [em 2005] e, quatro anos depois, a minha mulher [que sofreu um infarto]. Namorei com ela dos 15 aos 53 anos. Era minha companheira, meu tudo. Nada mais pode me atingir”, finalizou em entrevista à Folha.
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