Otávio Azevedo, o delator
Munidos de autocritérios, Dilma e
Lula se consideram as pessoas mais probas que já conheceram. Em maio, Dilma
discursou: “Falam que eu sou uma pessoa dura. Eu não sou uma pessoa dura não.
Eu sou honesta, é diferente!'' Em janeiro, Lula já havia se jactado: “Se tem
uma coisa de que me orgulho é que não tem, nesse país, uma viva alma mais
honesta do que eu.” O depoimento de Otávio Marques de Azevedo, mandachuva da
Andrade Gutierrez, ao juiz Sérgio Moro suscitou uma indagação singela: para que
serve a honestidade de Dilma e Lula?
Qualquer
pessoa é capaz de testemunhar o conceito extraordinário que faz de si mesma.
Nada mais humano. No entanto, com todo o respeito ao direito de Dilma e Lula de
se autoelogiar, o que sobra no final é um conjunto de fatos. E os fatos
transformam a honestidade presumida da dupla numa ficção que ajuda a explicar a
realidade brasileira —uma realidade marcada por governos corruptos presididos
por pessoas presunçosas.
Ricardo Berzoini, o desbravador |
Otávio Azevedo repetiu para Moro
o que dissera em delação para a força-tarefa da Lava Jato: em 2008, o
grão-petista Ricardo Berzoini, então presidente do PT, pediu propina de 1%
sobre todas as obras federais tocadas pela Andrade Gutierrez nos governos petistas — obras do passado, do presente e do futuro. Participaram da conversa
Paulo Ferreira, então tesoureiro do PT, e João Vaccari Neto, que assumiria
depois a gestão das arcas petistas. Embora considerasse as propinas como mero
“custo comercial”, incluído no preço final dos empreendimentos, o executivo da
construtora espantou-se.
A
propina requisitada por Berzoini deveria incidir sobre “todos os projetos
federais que a Andrade estaria executando e que já tinha executado de 2003
[quando Lula assumiu seu primeiro mandato] para a frente”, contou Otávio
Azevedo ao juiz da Lava Jato. “Ou seja, projetos inclusive já terminados. E
também dos projetos futuros. Eu realmente estranhei demais a colocação. […]
Fiquei bastante constrangido pelo pedido de 1% de contribuição. Essa reunião
foi […] extremamente desagradável. Foi uma reunião dura.”
Depois
de um debate interno, a empreiteira cedeu ao assédio do PT. Excluiu do acerto
apenas as obras pretéritas. Manteve os canteiros já abertos e os
empreendimentos futuros. O acerto vigorou de 2008 até 2014. Nesse período, a
Andrade Gutierrez borrifou na caixa registradora do PT algo como R$ 40 milhões
em dinheiro surrupiado do Tesouro Nacional por meio da elevação dos preços das
obras. Os pagamentos foram feitos em anos eleitorais e também nos anos em que
não houve eleições. Segundo o delator, 99% da grana foi entregue ao partido,
não aos comitês de campanha.
Afora
a propina, a Andrade Gutierrez ainda repassava ao PT as doações convencionais
de campanha. Somando-se a “verba vinculada'' às obras e os donativos
eleitorais, o PT mordeu a empreiteira em R$ 90 milhões durante seis anos.
Otávio Azevedo relatou a Sérgio Moro que, em 2014, o apetite dos coletores da
campanha de Dilma foi voraz. Eram dois os cobradores mais incisivos: Giles
Azevedo, então secretário-executivo do Gabinete Pessoal de Dilma, e Edinho
Silva, tesoureiro do comitê de campanha do PT. (vai abaixo, em três partes, o
depoimento de Otávio Azevedo. É um excelente passatempo para o final de semana).
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