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segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Quase 6 em cada 10 novos empregos são ocupados por beneficiários do Bolsa Família

Quando foi chamado para uma vaga de faxineiro, em abril deste ano, o baiano Adilson Filho, de 42 anos, sentiu-se aliviado. O trabalho com carteira assinada, que buscava há dois anos, vinha em boa hora. A família havia crescido no último ano com a chegada de uma neta, e a pequena casa de dois quartos que mantém em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador, passaria a abrigar agora 15 pessoas.

Até então, o que vinha segurando as contas no lar era o emprego como agente de limpeza de sua esposa, Luana dos Santos, de 39 anos, e os pagamentos do Bolsa Família. O dinheiro do benefício federal, além de ajudar no sustento dos 12 filhos do casal, permitiu a Adilson se inscrever num curso técnico enquanto procurava trabalho.

Agora, com os dois empregados e a manutenção do reforço de renda do benefício, a família tem novos planos: comprar um terreno e construir uma casa maior, de três quartos.

— Hoje, espalhamos colchonete e lençol no chão para caber todo mundo, diz Luana.

Casos como este vêm se multiplicando no país. Com a forte geração de vagas de trabalho, cadastrados em programas sociais têm conquistado espaço no mercado formal sem necessariamente perder acesso aos benefícios. Em 2024, mais da metade do saldo de empregos com carteira assinada foi destinada a pessoas que recebiam o Bolsa Família, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

Para o governo, os números mostram que medidas criadas para garantir a “porta de saída” dos programas sociais estão dando resultado. Especialistas alertam, porém, que o movimento vem sendo embalado por dois fenômenos simultâneos: o crescimento acentuado dos valores pagos pelo Bolsa Família e a baixa qualidade de boa parte dos empregos com carteira assinada criados recentemente.

De janeiro a julho, o país registrou quase 1,5 milhão de novas vagas formais, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que contabiliza todas as admissões e demissões. Do total, 838 mil (56,2%) empregos foram ocupados por beneficiários do Bolsa Família.

O levantamento pôde ser feito a partir da integração das bases de dados dos ministérios do Trabalho e do Desenvolvimento Social, o que só ocorreu no ano passado. Por isso, não há uma série histórica. A análise dos dados de 2022, no entanto, indica que a emancipação dos beneficiários está se acentuando. De janeiro a julho daquele ano, quem recebia o Bolsa Família representava 43% do saldo de criação de vagas formais no país, segundo estimativa do MDS.

O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, vê nas novas regras do programa o impulso recente na inserção dos beneficiários no mercado de trabalho. O governo Lula elevou a tolerância da chamada “regra de proteção” do Bolsa Família, criada na gestão de Jair Bolsonaro, que o chamava de Auxílio Brasil.

Quem consegue um emprego e passa a ter renda familiar per capita entre R$ 218 e meio salário-mínimo (hoje R$ 706) continua recebendo metade do auxílio por mais dois anos. No governo Bolsonaro, o limite máximo era R$ 525 por pessoa da família.

O Bolsa Família hoje chega a 20,7 milhões de famílias, das quais 2,7 milhões estão dentro dessa regra. No total, o benefício social custa ao governo R$ 166 bilhões por ano (1,3% do PIB), ou cerca de 7% do Orçamento da União.

— Se a promessa é superar a pobreza no país, então o beneficiário agora só sai quando a família tiver superado a pobreza. As pessoas estão perdendo o medo de ficar sem o benefício, diz Wellington Dias.

Na tentativa de impulsionar a entrada de quem recebe o auxílio no mercado de trabalho, o governo passou a oferecer apoio a empresas que estão em busca de trabalhadores para recrutarem entre os inscritos no Cadastro Único dos programas sociais. Desde o ano passado, a pasta fornece dados às companhias interessadas.

Mais de 40 empresas já aderiram. Com a demanda do empregador em mãos, o ministério filtra o perfil dos candidatos, seja por cidade, gênero, grau de instrução, raça, entre outros critérios. A empresa entra em contato e convida o inscrito a participar da seleção.

Foi assim que Jefferson Brito de Jesus, de 33 anos, conseguiu uma vaga de auxiliar de apoio administrativo numa das unidades do Atacadão em São Paulo. Formado em administração de empresas e desempregado desde 2021, ele vinha se fiando no Bolsa Família para sustentar a mulher e os dois filhos.

No início deste ano, foi chamado pela rede de supermercados, que usa o Cadastro Único em recrutamentos desde março de 2023 e já chamou 21 mil beneficiários de programas sociais para processos seletivos. Três meses depois de contratado, Jefferson foi promovido. Agora, com salário de R$ 3.300, diz estar pronto para viver sem o auxílio, que será cortado por ele ter saído da faixa “de proteção”:

— Fiquei mais de dois anos procurando. Fui trabalhar como autônomo atrás do meu objetivo, que era um emprego. Consegui. Meu salário agora dá para cuidar da casa e sustentar a família. Tudo bem cortarem o Bolsa Família, não precisamos mais.

Qualidade do emprego acende alerta

O aumento da empregabilidade dos beneficiários do Bolsa Família pode ser explicado tanto pelo aumento do alcance do programa nos últimos anos quanto pelo tipo de expansão do emprego que o país vive atualmente, aponta o economista e pesquisador da FGV Daniel Duque.

Ele vê ainda um aumento da produtividade identificada no público-alvo do programa em comparação com o grupo de beneficiários anteriores, que era restrito aos mais vulneráveis. Segundo o especialista, isso por si só já aumenta a probabilidade de um destinatário de auxílio social encontrar um emprego.

— Além disso, a composição setorial dos empregos que vêm sendo gerados no país mostra que a maior parte é de baixa qualidade, normalmente no setor de serviços. É esperado que se encontrem entre beneficiários do Bolsa Família, diz Duque, referindo-se à concentração das novas vagas em postos de pouca qualificação e salários baixos.

Apesar da boa resposta do setor privado e do aquecimento do mercado de trabalho, os movimentos do governo ainda não foram suficientes para reverter o inchaço da base de assistência social. Atualmente, 54 milhões de pessoas em idade adulta estão inscritas no Cadastro Único. É um número maior que todo o estoque de empregos formais no país: 46,8 milhões em julho, segundo o Ministério do Trabalho. Ao mesmo tempo, a taxa de desemprego segue caindo, tendo chegado a 6,8% em julho, levando o país a um patamar próximo do “pleno emprego”, quando a oferta de vagas se aproxima à de mão de obra.

Apoio ao empreendedor

O governo pretende agora acelerar a vertente “Acredita no Primeiro Passo”, um dos eixos do programa “Acredita”, lançado em abril com um sistema de microcrédito, apoio e capacitação para pessoas de baixa renda que buscam emprego ou desejam abrir pequenos negócios. A ideia é incentivar a geração de renda e dar apoio à parte crescente da população que mira no empreendedorismo em vez da carteira assinada. Empréstimos são concedidos por instituições financeiras conveniadas, com garantia do Tesouro Nacional.

O crédito de R$ 3,5 mil do Banco do Pará vai ajudar Sheila Caldas, de 52 anos, a reformar sua barraca no Ver-o-Peso, tradicional mercado público de Belém. Há 22 anos ela mantém o pequeno comércio de ervas naturais que sustenta os dois filhos. Em fevereiro deste ano, Sheila conseguiu acesso ao Bolsa Família. Agora, com o “Acredita”, pretende dar impulso às vendas na barraquinha com mais espaço e variedade de produtos.

Família fica até 2 anos no programa. Entenda:

A norma que permite ao beneficiário do Bolsa Família ficar no programa mesmo se conseguir um emprego com carteira assinada é chamada pelo governo de “regra de proteção”.

Essa regra prevê que famílias que tiverem um aumento da renda mensal que ultrapasse R$ 218 por pessoa do lar (limite máximo para ingressar no Bolsa Família) sigam acompanhadas e recebendo o benefício caso o salário do novo emprego não seja suficiente para ultrapassar meio salário mínimo (hoje, R$ 706) per capita.

Os beneficiários que ingressarem nessa regra passam a receber 50% do valor regular do Bolsa Família, por um período de até dois anos.

Se em uma família com cinco pessoas, por exemplo, duas delas conseguem um emprego, recebendo um salário mínimo (R$ 1.412) cada, a renda total de R$ 2.824 será dividida entre os cinco parentes, resultando em R$ 564,80 per capita. Como esse valor está abaixo do limite de R$ 706, a família entra na “regra de proteção”.

Nesse caso, a família fica no programa por até dois anos, recebendo 50% do valor a que teria direito, incluindo os adicionais para crianças, adolescentes e gestantes, caso não houvesse renda de trabalho formal no lar. O prazo de dois anos é contado a partir da data de atualização de renda no Cadastro Único.

Se a família perder a renda formal após os dois anos, ou tiver pedido para sair do programa, tem direito ao retorno. O responsável familiar deve procurar o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) para atualizar a informação de renda e solicitar a volta do pagamento do Bolsa Família. (Via: O Globo)

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