Com a soltura do ex-presidente
Lula, o STF (Supremo Tribunal Federal) enfrentará sob menos pressão o próximo
julgamento relacionado ao petista, que poderá recolocá-lo momentaneamente no
jogo eleitoral.
Na avaliação de uma parte dos ministros, com Lula fora da prisão, o
ambiente pode se tornar mais favorável para que o tribunal declare a suspeição
de Sergio Moro como juiz federal da Lava Jato.
Após decisão do Supremo, Lula sai da cadeia e ataca Lava Jato em discurso.
Nas próximas semanas, a Segunda Turma do STF deverá julgar um habeas corpus no
qual a defesa de Lula sustenta que Moro, hoje ministro da Justiça de Jair
Bolsonaro (PSL), atuou sem a imparcialidade necessária no processo do tríplex
de Guarujá (SP).
Com base nisso, Lula quer que o colegiado anule o processo inteiro. Esse é
o julgamento de maior interesse da defesa hoje.
"Além de restabelecer a liberdade plena de Lula, nos termos do que
decidiu o STF, é preciso declarar a nulidade dos processos que a Lava Jato
abriu contra ele, pois foram conduzidos por juiz parcial", afirmou à Folha
o advogado do petista, Cristiano Zanin Martins.
Uma eventual anulação livraria o ex-presidente não só do cumprimento da
pena e do pagamento da multa como também da inelegibilidade —que, nas eleições
passadas, fez com que ele fosse enquadrado na Lei da Ficha Limpa e impedido de
concorrer. O caso voltaria à estaca zero e teria de ser todo refeito.
Nesse cenário, em que o petista teria de volta os seus direitos políticos
e não teria nenhuma condenação em segunda instância até lá, está a eleição
presidencial de 2022. A avaliação no PT é a de que, hoje, só Lula tem força
para derrotar Bolsonaro e a direita na disputa ao Palácio do Planalto.
O ministro Gilmar Mendes pediu vista (mais tempo para analisar o processo)
na ocasião em que o habeas corpus começou a ser julgado. Gilmar pretende
liberá-lo para a análise do colegiado ainda neste ano. A Segunda Turma tem mais
seis sessões previstas em 2019, até 17 de dezembro.
Lula foi solto nesta sexta-feira por causa da decisão do plenário do
Supremo de um dia antes que reverteu a jurisprudência vigente desde 2016 e barrou
a prisão de réus logo após a condenação em segunda instância. Ele estava preso
desde abril de 2018.
A decisão do plenário não foi sobre o caso de Lula em particular, mas
sobre uma tese em abstrato: em qual momento um condenado deve começar a cumprir
a pena. Mesmo assim, o resultado serviu para libertar o petista.
Porém a condenação no caso do tríplex, já confirmada na segunda instância
e no STJ (Superior Tribunal de Justiça), continua valendo, e o petista continua
inelegível. Lula apenas ganhou o direito de recorrer às instâncias superiores
em liberdade —ele tem recursos pendentes no STJ e no Supremo. A situação mudará
se o processo for anulado.
A situação já havia ficado favorável a Lula com a divulgação de mensagens
de Telegram trocadas entre procuradores da Lava Jato em Curitiba.
As mensagens foram obtidas pelo site The Intercept Brasil e divulgadas em
parceria com outros veículos, incluindo a Folha, expuseram a proximidade entre
Moro e os procuradores e colocaram em dúvida a imparcialidade como juiz do
atual ministro da Justiça no julgamento dos processos da operação.
O material não fazia parte do pedido de habeas corpus formulado pela
defesa inicialmente, mas foi incluído depois. Ministros da Segunda Turma têm
dito a auxiliares que indícios de combinação entre juiz e acusação são graves
porque trazem descrédito para o Judiciário.
Em junho, após a divulgação das primeiras conversas de Telegram, a turma chegou
a votar, no âmbito desse habeas corpus, uma liminar (decisão provisória) para
soltar Lula até a análise do mérito (decisão definitiva).
Na ocasião, por 3 votos a 2, a maioria dos ministros manteve o
ex-presidente na prisão, mas mesmo os que votaram por negar a liminar deixaram
em aberto a possibilidade de votar pela suspeição de Moro e consequente
anulação do processo do tríplex quando analisassem o mérito do habeas corpus.
O decano, Celso de Mello, considerou que não estavam presentes os
requisitos para concessão da liminar para soltar Lula, mas destacou, em três
momentos, que seu voto naquela ocasião não era necessariamente o mesmo que vai
proferir no julgamento final.
Celso rememorou uma posição que adotou em 2013, quando votou pela
suspeição de Moro por sua atuação como juiz do caso Banestado. Moro havia
monitorado voos de advogados de um doleiro acusado, Rubens Catenacci, para
garantir sua prisão.
Conforme os registros do STF, o decano afirmou, em 2013, que a conduta de
Moro naquele caso fugiu "à ortodoxia dos meios que o ordenamento positivo
coloca a seu dispor" e gerou sua inabilitação para atuar na causa, gerando
nulidade dos atos por ele praticados.
O decano é considerado peça fundamental para que a alegada suspeição de
Moro volte a ser debatida e seja acatada pelo colegiado.
Já a ministra Cármen Lúcia, que no mérito já havia votado com o relator,
Edson Fachin, para negar o habeas corpus, disse na sessão em que a turma
analisou a liminar que houve "mudança de quadro, dada a gravidade do que
vem se apresentando no sentido de eventual parcialidade" de Moro. Ela
se referia às mensagens reveladas pelo The Intercept Brasil.
"É bom que se lembre que, mesmo o ministro relator [Fachin] e eu, que
já votei no mérito o acompanhando inicialmente, estamos abertos —pelo menos eu
estou aberta—, porque o julgamento não acabou e o acervo que pode ser trazido
ainda com comprovações posteriores não impede o uso de instrumentos
constitucionais e processuais para a garantia dos direitos do paciente
[Lula]", afirmou. (Via: Folhaprpess)
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