A P.4, nova variante identificada no interior de São Paulo por pesquisadores da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e da Rede Corona-Ômica-BR, apresenta a mutação L452R, a mesma encontrada também nas variantes indiana (B.1.617) e californiana (CAL.20C ou B.1.429/B.1.427) do coronavírus.
Segundo um artigo publicado em abril na revista científica Cell, uma das mais prestigiadas para a área de biologia, esta mutação está associada a uma transmissão até 20% maior e à capacidade de bloquear a ação de anticorpos neutralizantes anti-Sars-CoV-2, podendo assim escapar da imunidade conferida por vacinas ou após infecção natural.
No entanto, não é possível ainda afirmar se a P.4 é mais
transmissível ou mais perigosa do ponto de vista de saúde pública.
Ela não é, até o momento, uma VOC, sigla utilizada para
descrever formas do vírus com mutações que são de maior preocupação.
Além dessa mutação, a nova
linhagem possui outras 12 mutações únicas, isto é, que a diferem de outras
formas do vírus em circulação, incluindo quatro mutações na proteína S do Spike
(ou espícula, usada pelo vírus para invadir as células).
A identificação da nova variante foi feita pelos cientistas
já em amostras de fevereiro de 2021 na região de Mococa, mas foi só a partir de
uma maior frequência de amostras contendo a mesma sequência genética no
município de Porto Ferreira que a caracterização da linhagem foi possível.
"Fizemos o primeiro comunicado para o Pango [sistema de
classificação e registro de novas linhagens] a partir de duas sequências
distintas de Porto Ferreira. Na ocasião, havia outras sequências semelhantes de
outros pesquisadores para outras cidades, mas só foi com um maior número de
amostras que a classificação como P.4 foi aceita", explicou Cíntia Bittar,
professora e pesquisadora do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas
(Ibilce) da Unesp de São José do Rio Preto.
O primeiro relatório apresentado pelos cientistas, no dia 4
de maio, foi rejeitado pelo sistema Pango. Isso porque, para ser caracterizada
como uma nova linhagem ou variante, é preciso que a forma isolada em
laboratório apresente uma ou mais mutações que a distingam da forma ancestral
do vírus e seja identificada em pelo menos cinco genomas (nome dado à sequência
genética do vírus, ou o seu RNA) diferentes de uma mesma região.
Foi feita então uma nova submissão do achado no último sábado
(22), e a linhagem foi oficialmente reconhecida pelo consórcio, que tem
participação das Universidades de Oxford e Cambridge entre os fundadores, na
última segunda. Até agora, há em torno de 60 sequências distintas da variante
de diferentes regiões, diz Bittar.
Assim como as outras variantes brasileiras, a P.4 também tem
sua origem na linhagem ancestral B.1.1.28, que foi a forma do vírus com a maior
circulação no Brasil até meados de novembro do ano passado, quando ela começou
o seu processo de evolução e divisão em novas linhagens.
"Com o maior número de amostras e o sequenciamento do
genoma completo, pudemos fazer essa caracterização definitiva da nova linhagem
P.4. E estávamos aguardando essa classificação porque a impressão é que para
ser levada a sério uma nova variante precisa de um nome. Precisamos saber como
chamar a nova forma justamente para orientar e poder conter a circulação em
conjunto com o poder público", diz Paula Rahal, também professora e coordenadora
do Laboratório de Estudos Genômicos do Ibilce.
Durante a pandemia, diversas variantes do coronavírus
Sars-CoV-2 já foram identificadas.
Apontadas muitas vezes como a causa da piora da pandemia no
Brasil, na verdade elas são resultado do descontrole e da alta circulação de
pessoas.
Quanto mais o vírus circula, maiores as chances de mutações
surgirem –algumas delas facilitam a entrada do vírus nas células ou então
impedem a ação de anticorpos neutralizantes.
No caso da P.4, a equipe da Ibilce está em constante diálogo
com a Secretaria de Saúde e com a vigilância epidemiológica do município
justamente para investigar se uma alta de casos pode estar associada com a nova
forma.
"Se ela é mais transmissível ou mais virulenta,
precisamos de novos estudos, como estudos de desafio em células em laboratório
[contaminar intencionalmente células in vitro para ver se há maior potencial de
transmissão ou infecção], mas estes estudos demoram", diz Rahal.
As pesquisadoras, no entanto, ressaltam que as medidas para
controle dessa e das outras variantes do Sars-CoV-2 são as mesmas desde o
início da pandemia: uso de máscaras, distanciamento social, testagem e
isolamento dos indivíduos infectados.
Bittar reforça que há um aumento generalizado de casos em
todo o estado de SP, e é justamente o cenário em que mais pessoas estão
infectadas que o vírus encontra mais chances para se replicar e, assim,
apresentar "erros de cópia" –as mutações.
Quando essas mutações aleatórias ocorrem e aquelas que
garantem algum tipo de vantagem ao vírus, novas linhagens aparecem. É o caso,
por exemplo, da variante indiana, classificada recentemente pela OMS como uma
VOC e que teve o primeiro caso registrado em SP nesta quarta (26).
"A nossa rede encontra as novas variantes a partir do
sequenciamento de amostras, mas a nossa missão acaba aí em fazer os alertas e
comunicar o governo. As estratégias de controle, optar por uma vacinação em
massa, outras medidas de contenção partem dos epidemiologistas que assessoram o
governo, da vigilância", diz. (Via: Folhapress)
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