Após pressão popular e no próprio Congresso e manifesto nas ruas, o
presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acusa os servidores
públicos de tentarem inviabilizar a reforma. Um dos principais
articuladores do governo, o parlamentar disse que o relator, deputado baiano
Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), já está no limite da capacidade de negociação.
No seu cálculo, as alterações já consumiram 40% da economia prevista, quase o
dobro do que estimou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Ele afirmou
ainda que se o governo “ceder mais, vira reforma água com açúcar”.
Confira abaixo a entrevista do presidente da Câmara ao jornal Estadão, publicada
neste domingo (30).
A reforma trabalhista contaminou a da Previdência?
Não. Acho que a reforma trabalhista nos deu uma capacidade inicial de
reorganizar o voto da aprovação das duas reformas.
Mas a trabalhista obteve 296 votos favoráveis, menos do que os 308
necessários para aprovar a Previdência.
Aí tem de lembrar que tivemos algumas derrotas ao longo dos últimos 30
dias e os líderes da base conseguiram recuperar pelo menos 60 votos. Sabemos
que não temos esses 296 ainda para a Previdência, mas há uma capacidade de
articulação melhor do que tinha antes.
Quantos votos a base tem hoje?
Não sei, não dá para falar em número. O que tem de fazer agora é
organizar cada um dos partidos. Eu sou daqueles que prefeririam votar um texto
mais duro para o servidor público, mais ou menos na linha do que veio do
governo. Porque o servidor, onde estão os maiores salários, não entende que a
(reforma da) Previdência vai beneficiar a todos.
O relatório endureceu as regras de aposentadoria integral de servidores.
Isso pode cair?
Mas ele (relator) não mudou isso ainda.
Ainda?
Ele não vai mudar. Ele tem o compromisso conosco de não mudar isso.
A grande influência dos servidores sobre o Congresso não pesa?
É verdade, é a maior força. Esse é o problema. A gente tem de ter
coragem de falar. É uma derrota, uma irresponsabilidade, um desrespeito com os
brasileiros. São 5%, 10% da população que estão fazendo um lobby enorme na
Casa, tendo vitórias há anos, aumentando seu poder há anos, em detrimento do
gasto com educação, do gasto com saúde, do gasto em segurança pública.
Essa flexibilização não passa?
Se o relator ceder mais, vira uma reforma água com açúcar. Flexibilizar
mais é não ter reforma. A gente precisa ter coragem de enfrentar o tema, ir pro
voto. Nós já perdemos com as negociações 30%, 40% daquilo que estava projetado
no início. Esse é o dado verdadeiro, não adianta se enganar.
Mas a Fazenda diz que a perda foi de 24%. Eu quero falar a verdade: não
é 24% do meu ponto de vista. Eu não fiz a conta, mas economistas em quem confio
dizem que é próximo a 40%. O falso prejuízo eleitoral no curto prazo com a
votação da reforma da Previdência será muito maior se ela não for aprovada.
Certamente a taxa de crescimento, que pode ser no ano que vem da ordem de 4%...
Chega a 4%?
Tenho convicção que, se a reforma da Previdência for aprovada com o
texto nesse limite de hoje, mesmo com o dano que já foi feito no texto, temos
condições de ter um crescimento muito alto no próximo ano. Agora, toda nova
negociação é para atrasar o processo e inviabilizar a reforma.
É o que o servidor público está fazendo?
O servidor público quer inviabilizar a reforma. De uma forma ou de
outra, eles acham que o governo brasileiro não está quebrado, que não existe
déficit da Previdência.
Por que as ruas estão reclamando das reformas?
Quem reclama são os sindicatos, que estão mobilizados. A sociedade não
está reclamando.
A greve geral de sexta-feira pode pressionar os deputados?
Não foi greve geral. Foi uma mobilização de sindicatos. Não tem nenhum
efeito. Se não teve para manter o imposto sindical, que era maioria simples...
O governo está falhando na comunicação?
Não é que está falhando. Mas ele tem de mostrar o que aconteceu naqueles
Estados brasileiros e naqueles países que foram obrigados a fazer reformas
muito duras, qual é o impacto na vida das pessoas. Em Portugal, pensões,
aposentadorias e salários foram cortados. Nós estamos, talvez pela última vez,
tendo a oportunidade de fazer uma reforma sem cortar salários e aposentadorias
e sem aumentar impostos.
Se as reformas não forem aprovadas, é fim do jogo para o presidente?
Não. Eu ouvi isso de um deputado da oposição que me assustou: “Olha, se
o Michel não aprovar a Previdência, acabou o governo”. Eu fiquei olhando e
perguntei: isso significa que você quer que a população brasileira pague um
preço altíssimo porque você é contra o governo do presidente? Quando eu era
mais jovem, fui um pouco assim, mas mudei minha posição. Conseguiremos ter a
maioria para aprovar. Mas chega uma hora em que não pode ceder tudo. Se ficar
cedendo tudo, acaba desmoralizado.
Qual é a receita para aprovar a Previdência?
Mostrar para o deputado: olha aqui esse servidor público do Rio que está
recebendo cesta básica, aposentado que não tem dinheiro para comprar remédio...
Isso vai acontecer no Brasil. Não representamos essas corporações que estão
aqui tratando apenas dos seus interesses específicos. Nunca vi uma corporação
chegar na Câmara e tratar do interesse coletivo. Aliás, só uma vez, quando o
(Rodrigo) Janot (procurador-geral da República) levou o texto de abuso de autoridade.
As corporações de servidores dominam a base parlamentar?
Eles não dominam a base parlamentar. Os parlamentares muitas vezes
preferem não enfrentá-los. Agora é hora de salvar o Brasil. A reforma da
Previdência é meio que o coração do que o governo precisa fazer.
O presidente Temer vai ter margem para cobrar quem está votando contra?
O presidente, antes de assumir, lançou o documento “Ponte para o
futuro”. Quem acompanhou sabia, se o impeachment saísse, qual era a agenda do
governo. Ninguém pode dizer que foi enganado pelo governo da agenda da reforma
previdenciária, da trabalhista, amanhã da reforma tributária.
Então quem aderiu ao governo e não concorda com reformas tem de entregar
esses cargos?
Se eu tenho um ministério e digo “eu discordo da reforma da
Previdência”, acho que tem de sair do governo.
Avaliação recente é de que muitos já estavam abandonando o barco do
governo. O sr. vê isso?
Não é isso. É o seguinte: o deputado está olhando a votação e fala ‘tudo
bem, estou aqui para ajudar, mas quero saber quais são as condições para
ajudar, para que eu esteja fortalecido na minha base eleitoral’. Às vezes é o
presidente da República ir na cidade da pessoa e visitar o prefeito dele com
ele, tá resolvido. Às vezes é uma obra, não é isso? Às vezes é o fortalecimento
de uma estatal na região dele. Cada deputado chega aqui de uma forma. Resolver
o Funrural é uma tese que fortalece a base do Michel no agronegócio, que tem
uma base de deputados importante. Então é óbvio. Agora vai se resolver a questão
da contribuição previdenciária dos municípios, aquilo que está tudo atrasado,
para parcelar novamente. Com isso, você está atendendo a uma base de deputados
que têm relação com municípios menores.
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