Segundo relatos feitos ao Estadão, foi durante os governos Lula e Dilma, quando sindicalistas assumiram o comando da área de recursos humanos, que a situação degringolou de vez. “Sempre houve privilégios na Petrobras, mas as concessões feitas naquele período agravaram muito o problema”, afirma um ex-gestor da estatal.
Os salários, que já eram bem mais generosos do que os pagos por empresas privadas do setor petrolífero e mesmo do que os de outras estatais, também engordaram ainda mais. Entre 2003 e 2015, de acordo com dados dos sindicatos dos petroleiros, os funcionários da Petrobras tiveram um ganho real (já descontada a inflação) de 34%, sem contar os adicionais por tempo de serviço, que podem alcançar até 45% sobre o salário-base, no caso dos mais antigos.
Mesmo com a perda de 5,6% registrada nos governos Temer e Bolsonaro, ainda acumulam um aumento real de 26,4%. “Não há vantagem que não tenha um peso econômico”, diz Almir Pazzianotto, ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ex-ministro do Trabalho e advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, no ABC paulista, nos tempos em que Lula era o presidente da entidade, nos anos 1970 e 1980. “Acho razoável que haja uma certa liberalidade numa grande empresa. Agora, na Petrobras, eles foram longe demais.”
Nem o economista Roberto Castello Branco, um liberal forjado na Escola de Chicago que comandou a Petrobras de janeiro de 2019 a abril de 2021, conseguiu promover um corte significativo nos privilégios. Como apurou o Estadão, Castello Branco preferiu concentrar esforços na redução de alguns benefícios, de maior impacto nos custos, em vez de atacar tudo de uma vez, para não colocar “a massa toda”, como costumava dizer, contra ele e sua equipe.
Favorecida pela Resolução 23/2018, do antigo Ministério do Planejamento, que limitava a participação das estatais no custeio de planos de saúde, a Petrobras também conseguiu incluir no ACT a elevação das contribuições dos funcionários de 30% para 40% do total em 2021 e de 40% para 50% em 2022, com um impacto no caixa de cerca de R$ 750 milhões em dois anos. Mas, no ano passado, com a aprovação de um projeto de decreto legislativo apresentado pela deputada Erika Kokay (PT-DF), o dispositivo criado no governo Temer perdeu validade e a fatia dos funcionários acabou congelada nos 40% já praticados na ocasião.
A companhia também endureceu o jogo com os inadimplentes do plano de saúde, que acumulavam uma pendência de R$ 280 milhões, sem perder o benefício por falta de pagamento. Por fim, a Petrobras conseguir cortar em cerca de 20% o número de funcionários, de 57,1 mil em 2019 para 44,9 mil em 2021, incluindo suas controladas, graças principalmente a um plano de demissão voluntária que atraiu mais de 10 mil trabalhadores que atendiam às condições estabelecidas pela empresa. Com os desligamentos, a estatal calcula que terá uma redução de custos com pessoal de R$ 18 bilhões até 2025, já deduzido o total de R$ 4 bilhões gasto com o pagamento das indenizações, que variam de R$ 400 mil a R$ 1 milhão per capita.
Nas plataformas, a jornada funciona no esquema de 14 dias de trabalho por 21 dias de folga, em vez dos 14 dias de trabalho por 14 de folga praticados pela indústria de petróleo mundo afora, de acordo com um ex-dirigente da companhia. “É uma chuva de privilégios sem precedentes no setor privado”, diz Paulo Uebel, ex-secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia e ex-secretário municipal de Gestão de São Paulo. “O acordo coletivo da Petrobras é uma coisa de louco, diferente de tudo o que eu conheço”, afirma Pazzianotto. “Tem muita concessão para os trabalhadores, para a família dos trabalhadores, para os agregados. Tudo o que foi possível fazer foi feito para conceder uma situação privilegiada para o pessoal da Petrobras.”
Mesmo se a empresa cortasse as “jabuticabas”, os petroleiros não poderiam reclamar da vida. Pesquisas encomendadas pela Petrobras apontam que seus funcionários ganham de duas a três vezes mais do que a média paga no mercado para funções semelhantes. Um “inspetor de segurança”, responsável pela proteção das portarias, por exemplo, recebe de R$ 7 mil a R$ 8 mil por mês, enquanto no mercado a média gira em torno de R$ 2,5 mil. Como trabalha em sistema de turno, seus ganhos podem chegar, com todos os “penduricalhos”, a cerca de R$ 15 mil por mês.
Embora os dados divulgados pela Sest tenham sido fornecidos pela própria Petrobras, a empresa agora contesta as informações e apresenta números diferentes.
Em resposta a um questionamento do Estadão, a Petrobras informou que, na verdade, a remuneração média em 2020 ficou em R$ 18,6 mil por mês, enquanto a maior foi de R$ 97,7 mil e a menor, de R$ 3,3 mil. Mesmo que a retificação seja procedente, não altera muito o quadro. A remuneração média na Petrobras ainda seria equivalente a 7,5 vezes a média do País. Em vez de ocupar o segundo lugar na lista das maiores remunerações médias das estatais, a companhia ficaria na terceira posição, atrás também da Embrapa, onde o ganho médio alcançou R$ 20,2 mil em 2020.
Quando se considera o custo total de pessoal, que inclui todos os “penduricalhos” e os encargos socias e tributários, o gasto médio anual da Petrobras por funcionário atingiu R$ 449,3 mil, quase o dobro da média das estatais. Apesar de representar 10,6% de todo o efetivo das estatais, o gasto com pessoal da Petrobras foi equivalente a 20,6% do total.
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