A farmacêutica MSD (conhecida como Merck no Canadá e Estados Unidos) vai iniciar os testes de fase 3 de seu antiviral contra o coronavírus no Brasil. A droga experimental, chamada molnupiravir, possui um mecanismo de ação contra a fase de replicação viral, que se dá nos primeiros dias de Covid-19.
A realização dos ensaios clínicos ocorre simultaneamente com o lançamento do estudo também global, registrado na plataforma Clinicaltrials.gov. A expectativa é avaliar 1.850 pessoas nessa fase do estudo.
A droga é a primeira a alcançar a fase 3 de estudos no país.
Além dela, os anticorpos monoclonais Regeneron e da empresa Eli Lily receberam
autorização para uso emergencial nos Estados Unidos e, mais recentemente, no
Brasil pela Anvisa, embora sejam restritos para uso intrahospitalar.
O estudo MOVe-Out avaliará o uso de 800 mg do molnupiravir, na forma de comprimidos orais, duas vezes ao dia, por cinco dias. Segundo a farmacêutica, a dosagem e forma de administração foram determinadas na fase anterior de pesquisa clínica e apresentaram bons resultados na ação antiviral em pacientes não hospitalizados com Covid e com sintomas iniciais.
O mecanismo de ação do antiviral foi descoberto por pesquisadores da
Universidade de Emory, em Atlanta, Georgia (EUA) e o desenvolvimento do
medicamento ficou a cargo da empresa de biotecnologia Ridgeback
Biotherapeutics, sediada em Miami, em parceria com a MSD. A farmacêutica também
é responsável pela realização dos ensaios clínicos.
No Brasil, os testes serão conduzidos em sete centros de
referência: Centro de Pesquisa Clínica do HC da USP, São Paulo (SP), Instituto
de Infectologia Emilio Ribas São Paulo (SP), Hospital de Base de São José do
Rio Preto, São José do Rio Preto (SP), Chronos Pesquisa Clínica, Brasília (DF),
Santa Casa da Misericórdia de Belo Horizonte, Belo Horizonte, (MG), Hospital
das Clínicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba (PR) e Hospital
Tacchini, Bento Gonçalves (RS).
Não podem participar do estudo indivíduos que receberam pelo
menos uma dose da vacina contra a Covid, pessoas hospitalizadas ou com
necessidade de hospitalização nas últimas 48 horas por Covid e menores de 18
anos.
Já os critérios de eligibilidade incluem: diagnóstico doença
causada pelo coronavírus confirmado por teste de antígeno ou RT-PCR com
desenvolvimento de sintomas por no máximo quatro dias, apresentar pelo menos um
dos sintomas como tosse, dor de garganta, congestão nasal, dores musculares ou
cefaleia, entre outros, ter mais de 60 anos ou apresentar no mínimo uma
comorbidade associada a maior risco de evolução para quadro grave de Covid,
como câncer ativo, imunodeficiência renal crônica, doença pulmonar, obesidade,
entre outras.
O infectologista e professor da Faculdade de Medicina da USP
e colunista da Folha, Esper Kallás, é coordenador do estudo no Hospital das
Clínicas da USP, em São Paulo. "Não temos até hoje um remédio antiviral
potente para tratamento da doença na fase precoce, e mais do que isso, não
temos um comprimido que possa ser usado sem a necessidade de hospitalização",
diz, comparando o uso à semelhança da ação do Tamiflu para a gripe.
"O molnupiravir é feito com um aminoácido [parte de uma
proteína] que forma o RNA viral modificado. Esse nucleotídeo contendo uma
substituição se liga ao seu correspondente no genoma do vírus e impede sua
replicação. É assim que sua ação foi observada nos ensaios pré-clínicos em
laboratório", explica Kallás.
Os resultados do seu uso nas fases 1 e 2 foram confirmados
nos pacientes que fizeram uso da posologia recomendada nos primeiros dias da
doença. "A quantidade de cópias de RNA viral eliminadas pelos pacientes
que receberam o medicamento em comparação àqueles que receberam o placebo foi
menor, sugerindo uma boa resposta da droga", diz ele, reforçando que os
ensaios de fase 3 são os mais importantes e podem determinar ou não se uma
droga irá funcionar.
Um outro ensaio clínico buscou avaliar o uso experimental da
droga em pacientes hospitalizados, mas foi descontinuado por não ter atingido
resultados positivos na redução do quadro clínico. "O objetivo do teste do
molnupiravir na fase inicial de infecção é justamente para medir se ele é capaz
de impedir a replicação do vírus nas fases iniciais de infecção", explica
o infectologista. A expectativa é de conclusão dos ensaios no país até setembro.
A pesquisa de um antiviral anti-Sars-CoV-2, capaz de impedir
a evolução do quadro clínico e cessar os sintomas poucos dias após a infecção,
é esperada por toda a comunidade médica,
Até o momento, nenhuma das drogas testadas para as fases
iniciais da Covid teve sucesso em reduzir a quantidade de vírus, diminuir os
sintomas ou interromper a evolução do quadro clínico. "Esse seria o
verdadeiro tratamento precoce, caso seja confirmada sua eficácia", afirma
Kallás.
Em fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse
que o Brasil faria parte dos testes de um spray nasal contra Covid-19
desenvolvido pelo Centro Médico de Ichilov, em Israel. O fármaco experimental,
inicialmente desenvolvido para tratamento de câncer de ovário, teria ação
semelhante à de outros medicamentos que já foram e vem sendo testados contra a
Covid-19, cujo objetivo é impedir a chamada tempestade de citocinas, ou uma
reação exacerbada do sistema imune. A aposta de Bolsonaro, no entanto, não
avançou em estudos clínicos até o momento.
Outro antiviral que foi estudado para o combate ao
coronavírus foi o remdesivir. Embora tenha sido estudado para as três fases da
doença (profilaxia, fase inicial e pacientes hospitalizados), o medicamento foi
o primeiro registrado no Brasil para tratamento da Covid-19, mas somente em
pacientes hospitalizados com necessidade de oxigenação.
Pesquisadores do Centro de Doenças do Fígado de Toronto, da
Universidade Health Network, no Canadá, também apresentaram resultados
positivos de estudos de fase 2 de um antiviral, cujo uso acelerou a recuperação
em casa de pacientes com Covid-19 e indicou ainda uma possível redução na
transmissão de pessoa a pessoa. (Via: Folhapress)
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