O presidente Jair Bolsonaro (PL) disse, nesta sexta-feira (18), querer que povos indígenas se sintam "como nós" e façam com suas terras "exatamente o que fazemos com a nossa".
As declarações foram dadas durante cerimônia de entrega da Medalha do Mérito Indigenista no Ministério da Justiça. Bolsonaro e ministros foram agraciados com a homenagem.
"Somos exatamente iguais. Todos nós viemos à terra pela graça de Deus", disse o chefe do Executivo, com um cocar na cabeça e uma criança indígena no colo.
No folclore político, diz-se que dá azar a candidatos usar cocar de índio. Mas Bolsonaro, que busca se reeleger neste ano, já usou o acessório mais de uma vez.
"O que nós sempre quisemos foi fazer com que vocês se sentissem exatamente como nós", afirmou. "Nós os queremos ao nosso lado, que vocês façam suas terras exatamente o que fazemos na nossa".
A homenagem ocorre no momento em que Bolsonaro usa a guerra entre Ucrânia e Rússia como pretexto para pressionar pela aprovação de projeto de lei que libera a mineração em terras indígenas.
A proposta teve urgência aprovada na Câmara dos Deputados, e é apoiada pela bancada do agronegócio. O argumento dos governistas é que o projeto poderia solucionar a possível escassez de fertilizantes, com a guerra na Ucrânia.
O texto prevê mudanças radicais em relação ao que se pratica há quase 50 anos no país. A proposta altera o Estatuto do Índio, uma lei vigente desde 1973.
Se o Congresso aprovar o projeto enviado pelo governo da forma como foi elaborado, o Estatuto do Índio deve perder o artigo que restringe aos indígenas a exploração de riquezas em suas terras.
O setor mineral se posicionou contra a proposta na última terça-feira (15). "O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) entende que o PL 191/2020 não é adequado para os fins a que se destina, que seria regulamentar o dispositivo constitucional que prevê a possibilidade de implantação de atividades econômicas em terras indígenas como geração de energia, produção de óleo, gás e mineração", diz a nota.
O instituto tem 127 empresas associadas, as principais mineradoras que atuam no país. Dentre elas Vale, Votorantim, Samarco, Gerdau, Alcoa, Anglo American e ArcelorMittal.
Esta foi a primeira manifestação do setor desde junho de 2021, quando o Ibram defendeu a atividade, condicionada à consulta aos povos indígenas.
Como mostrou a Folha, Heleno chegou a autorizar, mas depois recuou, frentes de exploração de ouro em uma das áreas mais preservadas da Amazônia, dentro de trecho do rio Negro que corta duas terras indígenas, onde vivem 11 etnias.
O evento foi fechado e teve participação de algumas etnias indígenas, segundo o presidente da Funai, Marcelo Xavier, como as Kalapalo, Kayapó, Macuxi e Xavante.
Em seu discurso, Xavier disse que sua gestão enfrenta "passivo deixado por décadas de fracasso da política indigenista brasileira", em que havia "um cenário dominado por intermediários, no qual os indígenas eram feitos de massa de manobra".
O presidente da instituição não nomeia, mas cita diretamente ONGs (Organizações Não Governamentais), um dos principais alvos do governo o Bolsonaro.
A escolha de homenagear o presidente da República fez com que o ex-presidente da Funai Sydney Possuelo devolvesse a medalha que recebeu do Ministério da Justiça há cerca de 35 anos.
Ele enviou a medalha junto com uma carta na qual afirma ter sentido "imensa surpresa e natural espanto" ao descobrir que Bolsonaro havia sido condecorado.
No texto, Possuelo relembra que Bolsonaro é conhecido por se opor a pautas indígenas e citou frase do presidente dita quando era deputado. "A cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema no país'.'
Ainda segundo a carta, ao entregar a medalha a Bolsonaro, a homenagem "perdeu toda a razão pela qual, em 1972, foi criada". (Via: Folhapress)
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