“Quem está aberto em abril, eu
aconselho vir urgente acertar. Quem não vier, à noite estarei na porta. Nem se
for 2h da manhã eu vou bater para cobrar." "Senhores porteiros da rua
Marconi: a Conceição, do 4º andar, o prazo dela acaba no domingo. A partir de
segunda ela não entra mais no prédio, só se for para retirar as coisas."
As frases acima estão no grupo de WhatsApp de moradores e coordenadores do
MMPT (Movimento Moradia Para Todos).
A autora dos áudios é Ednalva Franco, líder do movimento que controla
quatro prédios -na Bela Vista, na Mooca e nas ruas Marconi e Capitão Salomão.
Filiada ao PT desde 1990, Ednalva é assessora da deputada estadual Marcia
Lia (PT-SP) e conhecida ativista sem-teto de São Paulo. É Ednalva que aparece
num episódio de 2013 do "Profissão Repórter" saindo com uma SUV nova
da garagem de um prédio na República.
"Porteiros, eu vou passar todos os nomes das pessoas que o prazo
acaba até domingo. Inclusive a Luciana, do 309", diz ela em outra mensagem
do grupo. "Vou passar toda a lista pra vocês na portaria assim que eu
terminar."
Depois que escrevi sobre o modelo de negócio dos líderes de grupos
sem-teto, ex-moradores me procuraram denunciando abusos, ameaças e cobrança de
aluguel de R$ 200 a R$ 500 por parte dos coordenadores.
"Além do aluguel, a coordenadora sempre inventa uma taxa nova para o
pessoal pagar", diz um ex-morador do edifício São Manuel, na rua Marconi,
que não se identifica por temer represálias. Ele avalia que os alugueis só
desse prédio rendem pelo menos R$ 35 mil por mês ao movimento.
Conta ainda que era obrigado a participar de atos em defesa do
ex-presidente Lula. "Quando tinha um ato, eu colocava a camiseta do
movimento e ficava perto dela [Ednalva]. Fazia questão que ela me visse várias
vezes, para marcar presença. Depois trocava a camiseta e ia embora."
Conversei com Ednalva Franco sobre as denúncias. Ela admitiu a autoria das
mensagens e afirma que cobra uma taxa de no máximo R$ 200 por morador.
Alega que o dinheiro serve para custear o escritório e a creche do
movimento, além do salário de porteiros, a manutenção dos elevadores,
extintores e outras despesas. Negou expulsar moradores por falta de pagamento,
apesar do conteúdo evidente dos áudios.
"Se o morador não tiver dinheiro para pagar a contribuição, nós
chamamos para conversar e parcelamos até ele arranjar um emprego", diz.
O ex-morador contesta. "Ela e o marido costumavam gritar de madrugada
com quem estava devendo. A creche não funciona há muito tempo. E, na Marconi, o
elevador quebrava toda hora e ficava meses sem conserto."
Sobre a exigência de participação em protestos, Ednalva afirma que
"cada movimento social tem suas regras. Apresentamos nossa rotina quando a
pessoa ingressa no movimento. A partir de então, se quiser continuar, precisa
seguir as regras do grupo".
Invadido em 2012, o edifício São Manuel é considerado uma ocupação-modelo
dos sem-teto. Recebe oficinas culturais, reuniões políticas e já abrigou um
escritório coletivo de doutorandos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
USP.
O ex-morador, porém, reclama da falta de liberdade (o portão fecha à 0h;
depois desse horário só é possível entrar ou sair do prédio às 6h) e da
quantidade dos eventos de conscientização política. "Nenhum morador
aguenta mais tanta reunião", diz. (Via: Folhapress)
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