A decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) de abreviar os ritos de processos penais, permitindo que o réu
seja encarcerado a partir da sentença condenatória de segunda instância (de
colegiado estadual ou regional), mesmo esperando os recursos nos tribunais
superiores, tende a agravar a superlotação carcerária em Pernambuco.
Essa é a expectativa do promotor da Vara de Execuções Penais, Marcellus
Ugiette.
O representante do Ministério
Público de Pernambuco, acredita no aumento de, pelo menos, 10% do número
de prisões no Estado. “E a gente deve sentir esse aumento no meio deste ano e,
no mais tardar, no começo de 2017”, afirmou.
A preocupação do MPPE com a
situação do sistema penitenciário, principalmente depois da explosão de parte
de um muro e das fugas em massa no Complexo do Curado, na Zona Oeste do Recife, e da Penitenciária Barreto Campelo, em
Itamaracá, Região Metropolitana, levou o promotor a elaborar um dossiê
sobre o quadro das 23 unidades e 43 cadeias públicas. Os fatos agravaram uma
crise que já se arrasta há vários anos.
O documento chegara às mãos do
governador Paulo Câmara (PSB) ainda nesta segunda-feira (29) ou na terça (30),
e apontará sugestões de melhorias, entre as quais a desativação do
complexo do Curado.
Marcellus Ugiette ressalta que
o aumento da população carcerária é a consequência prática da nova norma do
STF, aprovada no último dia 17, por sete votos a quatro. Para
ele, a partir da determinação dos ministros da suprema corte brasileira,
é possível afirmar que haverá efeitos em cascata: “jurídicos e filosóficos”,
observa.
O promotor, por exemplo,
acredita que o Tribunal aprovou uma resolução contrária a uma das iniciativas
defendidas nos países democráticos, que lutam para reduzir o número de apenados
encarcerados e para instituir as penas alternativas.
“Nós assinamos um tratado
internacional, na Costa Rica, e, há muitos anos, entendemos que a pessoa só
deve ser presa depois do trânsito em julgado da sentença condenatória. Ou seja,
depois de esgotados todos os recursos. E é isso que a Nossa Constituição, de
1988, também deixa claro”, comenta. “Temo a insegurança jurídica”,
acrescentou.
A mesma linha de pensamento é
defendida pelo secretário de Ressocialização de Pernambuco, Pedro Eurico. Em
debate em uma emissora de rádio, ele lembrou que a Carta Magna do País
tema apenas 25 anos e está sendo desrespeitada.
Para o gestor estadual, o STF
não deveria se preocupar em punir antes do trânsito em julgado da sentença, mas
em evitar o excesso de prisões provisórias. Em Pernambuco, 59% dos
detentos sequer foram julgados pelo juiz de primeira instância.
Para Pedro Eurico, o STF não
deveria se preocupar em colocar mais gente na prisão, descumprindo a
Constituição ao acelerar os ritos judiciais, mas agilizar os julgamentos
no início e evitar que as pessoas fiquem anos e anos na cadeia sem
necessidade”, declarou.
Ao contrário do secretário e
do promotor, o delegado de Polícia Civil Tancredo Loyo Borba, que também
participou do debate na emissora de rádio, festeja a decisão do STF. ”É um
marco do Judiciário. A população estava cobrando mais agilidade e uma ação para
reduzir o sentimento de impunidade”, observou o policial.
Loyo Borba explica o ponto de
vista, lembrando que, atualmente, o Brasil é exemplo de uma nação em que as
pessoas cometem delitos graves e são beneficiadas pela lei. “Não se pode deixar
que a pessoa mate alguém e fique solta, esperando até o último recurso.”
Dossiê: No documento que será entregue ao governador, o promotor de Execuções Penais,
Marcellus Ugiette, aponta que é necessário planejar e executar ações de
curto, médio e longo prazos. “Os vícios no sistema são muito antigos e muito
graves”, afirma.
Um dos assuntos mais
importantes do dossiê é, segundo ele, a proposta de desativação do Complexo do
Curado. “Já disse que devemos oferecer aquela área para a iniciativa privada e
conseguir locais para construir pequenos presídios com capacidade para 500
presos. Também precisamos colocar o Complexo de Itaquitinga para funcionar,
pelo menos parte dele”, observou.
Decisão do STF: Desde 2009, o STF entendia que o condenado poderia continuar livre até que se
esgotassem todos os recursos no Judiciário. Naquele ano, a Corte decidiu que a
prisão só era definitiva após o chamado “trânsito em julgado” do processo, por
respeito ao princípio da presunção de inocência.
O julgamento do dia 17 de
fevereiro representa uma mudança nesse entendimento. Até então, a pessoa só
começava a cumprir pena quando acabassem os recursos. Enquanto isso, só era
mantida encarcerada por prisão preventiva (quando o juiz entende que ela poderia
fugir, atrapalhar investigação ou continuar cometendo crimes).
Votaram para permitir a prisão
após a segunda instância os ministros Teori Zavascki (relator), Edson Fachin,
Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. De
forma contrária, votaram Rosa Weber, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e
Ricardo Lewandowski.
Nos votos, os ministros
favoráveis à prisão após a segunda instância argumentaram que basta uma decisão
colegiada (por um grupo de juízes, como ocorre nos TJs e TRFs) para aferir a
culpa de alguém por determinado crime.
Em regra, os recursos aos
tribunais superiores (STJ e STF) não servem para contestar os fatos e provas já
analisadas nas instâncias inferiores, mas somente para discutir uma
controvérsia jurídica sobre o modo como os juízes e desembargadores decidiram. (G1 PE)
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