Num instante em que o Brasil vive
um triste momento — a disputa presidencial entre o candidato ungido pelo
padrinho-presidiário e uma chapa puro-sangue militar — vale à pena recordar uma
das melhores passagens da história republicana: a conciliação política
conduzida por Tancredo Neves. Há 33 anos, o país estava em ruínas. O governo,
sem rumo. A mobilização pelas eleições diretas atolara no Congresso, abrindo um
fosso entre a rua e o aparato de uma ditadura em fim de linha.
Mal comparando, ocorre agora algo parecido. Se o resultado do primeiro
turno serviu para alguma coisa foi para confirmar que há uma irremediável
ruptura entre a sociedade e um sistema político que apodreceu. Hoje, como
ontem, a prioridade nacional é a conciliação. Sem ela, dificilmente o Brasil
terá energias para enfrentar os dramas que o assediam — da ruína fiscal ao
desemprego.
Tancredo Neves, como se sabe, chegou ao Planalto morto, para o velório.
Deixou escrito o discurso que faria na posse. Haddad e Bolsonaro deveriam ler a
peça. ''Esta solenidade não é a do júbilo de uma facção que tenha submetido a
outra, mas festa de conciliação nacional'', escreveu Tancredo. ''Nosso
progresso político deveu-se mais à força reinvidicadora dos homens do povo do
que à consciência das elites'', anotou em outro trecho. ''A história nos tem
mostrado que, invariavelmente, o exacerbado egoísmo das classes dirigentes as
tem conduzido ao suicídio total'', acrescentou. Nada mais atual do que o
discurso que Tancredo não pôde pronunciar. (Por Josias de Souza)
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