Tão logo assumir, Jair Bolsonaro (PSL) tem urgência em nome da
pacificação e permanência na rota de saída da recessão. Para além das
obrigações de longo prazo – como segurança, educação e saúde –, diante dos
temas tratados na campanha e do quadro atual, o mandatário precisa reafirmar o
casamento com a democracia, reorganizar as contas, buscar saídas rápidas para
gerar emprego e olhar com carinho para o Nordeste.
Após uma campanha de arroubos, Jair Bolsonaro (PSL), que assumirá a
Presidência da República a partir de 2019, precisará prezar pela democracia que
o elegeu e respeitar as instituições para evitar um mandato de crises e
governar para todos os 208 milhões de brasileiros. Nas palavras do
ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto: “Se o
candidato pode defender posturas inconstitucionais e exagerar na retórica,
outra coisa é no exercício do poder. Se no cargo a autoridade se revelar
incompatível com a Constituição, a sociedade fica em um dilema jurídico: ou a
Constituição ou o presidente. E a resposta só pode ser que a Constituição fica
e o presidente sai, o que se chama de impeachment. Quem chega para exercer o
cargo de presidente tem de baixar a crista antidemocrática”.
Democracia
ameaçada?
No último dia 19, pesquisa Datafolha mostrou que 50% dos brasileiros
acreditam haver alguma chance de uma nova ditadura no País. Entre 2014 e 2018,
a satisfação dos brasileiros com a democracia recuou de 38,9% para 19,4%,
segundo artigo do professor Leonardo Avritzer, da UFMG. Não à toa, outubro de
2018 foi o mês em que mais brasileiros pesquisaram pelas palavras “democracia”,
“ditadura”, “fascismo”, “comunismo” e “Venezuela” desde o início do
monitoramento da ferramenta Google Trends, em 2004.
“Bolsonaro vai encontrar um País dividido e um segmento expressivo da
população com medo, inclusive de retaliação. E você vai ter uma série de
correligionários que vão se sentir empoderados pelo discurso eleitoral do
candidato. É importante que ele abrande o discurso e busque a união. Um País
efetivamente dividido é um País ingovernável. E é importante que ele reafirme
para todos os cidadãos que nós não teremos uma ruptura da ordem democrática e
que ele respeitará a autonomia das instituições”, defende Ronnie Duarte, presidente
da OAB-PE.
Durante a campanha, não foram poucas as vezes em que Bolsonaro apelou a
discursos autoritários. Uma semana antes do segundo turno, mesmo liderando
todas as pesquisas, ele disse em uma fala transmitida a aliados na Avenida
Paulista que o adversário Fernando Haddad (PT) seria preso, antes de prometer
uma “limpeza nunca vista na história do Brasil”. “Essa turma, se quiser ficar
aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão
para a cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”,
declarou na ocasião.
Dois dias depois, em entrevista a uma rádio do Rio Grande do Sul,
Bolsonaro garantiu não ser uma ameaça à democracia. “Pelo contrário, nós somos
a garantia da liberdade e da democracia”, assegurou. Posturas como estas serão
importantes para o sucesso do governo. Na semana passada, após um vídeo em que
o filho e deputado federal Eduardo Bolsonaro diz ser fácil fechar o STF, o
agora presidente eleito tratou de reagir para reduzir atritos. “Isso não
existe. Se alguém falou em fechar o STF, precisa consultar um psiquiatra”,
alegou.
O sociólogo Brasílio Sallum Jr., professor da Universidade de São Paulo
(USP), diz que o novo presidente precisará reduzir as animosidades, ter a
preocupação de governar para todos e lembrar que os adversários políticos não
devem ser tratados como inimigos. “O presidente vai, de toda maneira, enfrentar
uma situação complexa e difícil. Primeiro porque carregamos há anos um déficit
fiscal forte, com nós que precisarão ser desatados, como a reforma da
Previdência. Além disso, o presidente tem hoje menos poder institucional do que
seus antecessores. Desde 2015, o Executivo é obrigado a pagar as emendas
parlamentares ao orçamento, o que era um trunfo nas negociações com o Congresso”,
lembra.
Apesar disso, um elemento nocivo já se estabeleceu na política
brasileira, de acordo com o cientista político Michael Mohallem, professor da
Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Pela primeira vez depois de 30 anos da volta da
democracia, nós temos o elemento medo na política. E ele é uma coisa muito
ruim. Mas é um dado muito difícil de se negar. As pessoas estavam com receio de
fazer campanha. Pessoas LGBT têm medo de demonstrar afeto em público. É preciso
que as instituições funcionem, isso vale do policial da esquina ao STF, para
evitar impulsos que passem da linha”, defende.
Para Roberto Romano, doutor em Filosofia e especialista em ética
política, Bolsonaro terá atritos inevitáveis em seu governo. Para ele, diversos
grupos que apoiaram o novo presidente, como generais, empresários e os técnicos
da área econômica e das Forças Armadas tendem a ter pautas distintas, o que
aumentará a responsabilidade do presidente. “É preciso que ele tenha condições
objetivas para encarar essas dificuldades. Para entender a posição desses
vários setores e tomar decisões que sejam favoráveis ao País”, diz. (Via: Jc Online - Agência Brasil)
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