A eleição presidencial deste ano
no Brasil tem despertado notável repercussão internacional, tanto em outros
países da América Latina quanto de outras regiões do planeta. Desde o primeiro
turno, entidades e celebridades estão usando as redes sociais para se
posicionar a favor ou contra candidatos, e a imprensa estrangeira acompanha de
perto o confronto entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad.
As circunstâncias específicas do atual pleito, com Lula na prisão e
Bolsonaro em favoritismo, assim como as repercussões políticas e econômicas de
sua eventual vitória, despertam atenção e curiosidade, engajando polarizações
de opinião semelhantes às que são identificadas agora no eleitorado brasileiro.
A FGV DAPP identificou, de 17 de setembro a 16 de outubro, 1,2 milhão de
menções sobre a eleição presidencial brasileira em Argentina, Venezuela,
México, Espanha, França, Estados Unidos, Portugal e Reino Unido — filtrando o
debate nos respectivos idiomas oficiais de cada país.
Os argentinos, dentre os países selecionados para pesquisa, foram com
sobras os que mais se envolveram na eleição brasileira: houve 416,2 mil
referências aos candidatos ou ao contexto político brasileiro no período. Logo
depois vêm os portugueses — 196,7 mil tuítes relacionados ao tema — e os
venezuelanos (186,6 mil).
De forma geral, mesmo antes do 1º turno, já se verificava forte
concentração de menções sobre dois atores políticos: Bolsonaro e Lula,
posteriormente representado em definitivo por Haddad no debate. O candidato do
PSL já foi objeto de centenas de reportagens de veículos do mundo inteiro (com
posicionamentos de oposição, sobretudo), e celebridades como Madonna e Mark
Hamill aderiram ao movimento #elenão. Bolsonaro foi citado em 35% das posts
sobre política brasileira identificadas nos EUA (57 mil tuítes, de um total de
162,7 mil), e o principal subtópico de debate é a contraposição entre
democracia e totalitarismo.
Esse enfoque é conduzido por veículos e atores de bastante impacto
(artistas, acadêmicos, entidades e jornais) que fazem críticas a Bolsonaro,
comparando-o com o presidente Donald Trump, e reiteram seus posicionamentos em
relação a minorias. O mesmo eixo de discussão predomina no Reino Unido (41,7
mil), com o candidato citado em 38% das menções e amplo destaque aos editoriais
e reportagens dos veículos The Guardian e The Economist sobre o cenário
eleitoral brasileiro.
Perfis também associam a possível eleição de Bolsonaro à conjuntura de
avanços da extrema-direita no mundo, citando Itália e os governos de viés
autoritário na Turquia e na Hungria, além do paralelo com Trump e o presidente
das Filipinas, Rodrigo Duterte. Os shows de Roger Waters em São Paulo, em que
houve apoios e vaias às críticas do músico a Bolsonaro, também repercutiram no
Reino Unido.
Alemanha e França
O debate na Alemanha sobre a corrida presidencial brasileira gerou 6,6 mil
tuítes, dos quais 42% foram retuítes. Das postagens, 34% fazem menção a
Bolsonaro, enquanto apenas 6% mencionam Haddad. Aparece também a palavra
“rechtspopulist” — populista de direita, fazendo referência a Bolsonaro —,
utilizada em 4% das postagens.
Uma reportagem aborda a vitória de Bolsonaro no primeiro turno como uma
aproximação do fascismo no país. E o artigo mais compartilhado em alemão fala
sobre as manifestações contra o candidato. São mencionados, ainda, os elogios
de Bolsonaro à ditadura e suas colocações consideradas homofóbicas, racistas e
machistas.
Do lado da sociedade civil, o tuíte com mais retuítes durante o período
compartilha foto dos protestos #EleNão, em São Paulo. O político Martin Schulz,
por sua vez, em segundo tuíte de maior repercussão, expressa o desejo de que
Haddad consiga agregar as forças democráticas do país, pois vê a eleição de
Bolsonaro como muito problemática não só para o Brasil, mas para a América
Latina como um todo.
Outro tuíte com ampla repercussão critica o fato de Bolsonaro colocar em
risco as terras indígenas demarcadas. No entanto, aparece, em menor proporção,
críticas a tal visão, entendida como mentirosa e errônea em função do viés de
esquerda da mídia brasileira.
Em francês, foram 70 mil postagens no período, e o principal eixo de
discussão é a posição de Bolsonaro à extrema-direita, objeto de críticas da
imprensa e de atores políticos do país. Haddad, a exemplo do que se verifica em
outros países, só aparece em 3% das menções — já o ex-presidente Lula é citado
em 10% das postagens. O tuíte de maior compartilhamento foi do jornalista Hugo
Clément, que ressalta o impacto ambiental de um eventual governo de Bolsonaro;
a agenda de preservação da Amazônia e de combate ao desmatamento obteve maior
força na França do que nos demais países analisados.
Repercussão em Portugal
Já em Portugal, que, em 07 e 08 de outubro, quando houve o primeiro turno,
somou 42,7 mil tuítes, o contexto debatido por cidadãos comuns, imprensa e
influenciadores foi menos articulado apenas pela polarização PT/Bolsonaro, com
menções e discussões sobre tópicos do cenário político brasileiro de menor
repercussão internacional.
Ciro Gomes, por exemplo, foi objeto de 9% das menções no país (17,5 mil),
e os principais links e artigos discutidos na web abordaram notícias falsas que
circularam no Brasil, a forte presença de brasileiros no país e perspectivas
futuras de aumento na migração brasileira para Portugal. Há críticas ao forte
apoio a Bolsonaro no país entre cidadãos do Brasil, sob o argumento de que o
Portugal tem um governo socialista com preceitos opostos aos defendidos pelo
candidato.
Na América Latina, os argentinos foram os mais ativos na repercussão da
corrida eleitoral no país vizinho. Bolsonaro foi reinante como tema principal
(238,9 mil menções ao candidato na Argentina, 57% do debate total), à frente de
Lula (63 mil, ou 15%), com maior presença de postagens críticas ao líder das
pesquisas e comparativos entre as preferências eleitorais de ambos os países,
equiparando a postura economicamente liberal de Bolsonaro com o governo de
Maurício Macri. Argentinos ironizam brasileiros com piadas sobre qual povo faz
piores escolhas eleitorais e, também com viés crítico, debatem regimes
ditatoriais e fazem alusões ao fascismo.
Impacto da Venezuela no cenário brasileiro
Na Venezuela, viu-se presença mais expressiva de engajamentos partidários
favoráveis a Lula e ao PT, em função do apoio político do presidente Nicolás
Maduro aos petistas, alto volume de menções à ex-presidente Dilma Rousseff
(13,4 mil tuítes) e significativa importância do tema imigração. Maduro
reuniu-se com a governadora de Roraima, Suely Campos, e o tuíte sobre o
encontro foi um dos mais compartilhados do período.
Postagens de blogs e atores de esquerda com críticas duras a Bolsonaro
também predominaram, associando-o a Donald Trump, mas os dois tuítes de maior
repercussão no país foram de críticas à Venezuela e ao regime Maduro, com
referências a presos políticos do governo venezuelano e ao impacto negativo da
crise social e econômica no país. Os perfis argumentam que o “medo de virar uma
Venezuela” ajudou a eleger políticos de direita na América Latina.
Cenário distinto se identificou no México, onde houve 73,4 mil tuítes
sobre as eleições no Brasil. Bolsonaro, objeto de 54% das menções, foi
novamente o maior destaque, só que a pauta de maior impacto foi o movimento
#EleNão, com discussões sobre misoginia e o papel das mulheres no
posicionamento eleitoral contra o candidato. Comparativos negativos entre
Bolsonaro e Trump responderam por 9% do debate, e os tuítes de maior
compartilhamento foram críticos do momento geral dos países latinoamericanos,
associando as eleições no México e no Chile e o governo venezuelano com a
situação eleitoral do Brasil. O vídeo de uma entrevista da atriz Ellen Page com
Bolsonaro foi bastante divulgado no país.
Por fim, na Espanha, cujo debate sobre o Brasil gerou 82,7 mil tuítes,
veem-se publicações de mote jornalístico que apresentam Bolsonaro, explicando
seus projetos, posições e frases, demarcando-o como a nova face da direita
brasileira. A homofobia e as manifestações de mulheres contra o candidato
também se destacaram, a exemplo do observado em outros países de língua
espanhola, assim como críticas à tortura e à ditadura militar. A situação da
Venezuela e o impacto da gestão Maduro na corrida eleitoral do país foi
igualmente citada. (Via: Blog do Jamildo - Do relatório da FGV DAPP)
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