Anunciados nesta quarta (18), os bons resultados dos testes concluídos da vacina da Pfizer e da BioNTech contra Covid-19 trazem um desafio inédito: o armazenamento e a distribuição de um imunizante com duas doses em um intervalo de 21 dias a -70°C. Na logística brasileira não há, hoje, ultracongeladores para isso na chamada Rede de Frio, do Programa Nacional de Imunização brasileiro.
Hoje, o padrão de manutenção de vacinas no mundo é feito em refrigeradores, com temperaturas que variam entre 2°C e 8°C. É o que encontramos nas geladeiras caseiras.
As imunizações contra a febre amarela e a
poliomielite, especificamente, exigem armazenamento em temperaturas mais baixas
(-15ºC a -25ºC), em equipamentos como os freezers científicos. Antes de serem
ministradas, as duas vacinas migram para a temperatura "padrão" dos
refrigeradores, de 2°C e 8°C, onde podem ficar por até um mês.
Já a vacina da Pfizer contra a Covid-19, batizada
de BNT162b2, aguenta apenas cinco dias na temperatura padrão dos refrigeradores.
"Não é algo trivial. Não conheço nenhum país
que tenha cadeia de frio adaptada pra temperaturas tão baixas", diz
Natália Pasternak, microbiologista e pesquisadora da USP.
O Brasil tem equipamentos voltados à imunização
como freezers científicos (que custam na ordem de R$ 25 mil), caminhão-baú
refrigerados (na ordem de R$ 150 mil) e geradores (que passam de R$ 4 milhões).
Os valores são do Fundo Nacional de Saúde.
A infraestrutura, no entanto, é desigual. O país
tem 484 geradores na rede de saúde com diferentes capacidades em caso de falta
de energia –o Maranhão, por exemplo, só conta com um.
Há 680 freezers científicos no país todo. Mato
Grosso do Sul e Piauí, no entanto, não tem esse tipo de equipamento. Sete dos
31 caminhões-baú refrigerados estão concentrados em São Paulo. Os dados são do
Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES/Datasus).
Vale lembrar que o controle térmico das vacinas já
disponíveis é bem importante, porque algumas são sensíveis às temperaturas mais
baixas (caso da imunização contra o HPV) e outras, ao aumento de temperatura
(como a BCG). Vacinas genéticas como a da Pfizer, de acordo com cientistas, são
ainda mais frágeis a variações térmicas.
"Levar
essa vacina à população, principalmente em países de menos recursos,
monitorando as duas doses e garantindo que a vacina não perca parte da eficácia
por causa da necessidade de mantê-la tão fria será um grande desafio de
logística que a maioria dos países não está preparada para enfrentar", diz
Denise Garrett, médica epidemiologista, vice-presidente Instituto Sabin (EUA).
De acordo com a Pfizer, na ausência dos
ultracongeladores a vacina pode ser ser armazenada por até 15 dias em uma
espécie de contêiner com gelo seco, desenvolvido pela própria farmacêutica, mas
cujos detalhes não são conhecidos. A empresa anunciou que a ciência tem
avançado não somente no desenvolvimento da vacina, mas na parte logística,
armazenamento e na distribuição.
O governo brasileiro já sinalizou negociação com a
empresa, mas não há informações sobre o planejamento da distribuição da
imunização em temperaturas tão baixas.
Questionado sobre como está se preparando para o
armazenamento e a distribuição de vacinas contra a Covid-19 a -70ºC, o
Ministério da Saúde informou, em nota, que "toda a rede de frio do Brasil
dispõe de equipamentos para armazenamento de vacinas a -20°C, com exceção da
instância local, que são as salas de vacinas e onde o armazenamento se dá na
faixa de controle de +2°C a +8°C." A pasta não esclareceu, no entanto,
como lidaria com a distribuição de uma vacina genética com complexidade inédita.
Para Gabriela Lotta, docente e pesquisadora em
administração pública na FGV-SP, é "quase impossível" que a vacina
consiga sair dos grandes centros, uma preocupação já levantada por
especialistas em saúde pública.
"Será preciso já pensar logística de
distribuição para unidades centralizadas nas capitais", diz.
A vacina BNT162, que está em desenvolvimento pela
Pfizer e a empresa alemã BioNTech, é genética. Tem base em trechos de RNA
(molécula "prima" do DNA) que compõem o material genético do vírus.
De acordo com a farmacêutica, a imunização é
segura e tem 95% de eficácia. Os resultados são da terceira fase e última fase
de testes da droga, concluídos nesta semana.
Em live ao vivo com atualizações sobre Covid-19
também nesta quarta (18), epidemiologistas da OMS (Organização Mundial de
Saúde) pediram cautela e destacaram que a vacina contra Covid-19, quando
existir, deverá adicionada ao distanciamento físico, máscara e à higienização.
O tom foi de que não devemos baixar a guarda, a
pandemia não acabou. "A informação continua sendo parte da solução da
pandemia", disse Maria van Kerkhove, epidemiologista da organização. (Via: Folhapress)
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