O ninho da família mais tradicional da política pernambucana está em guerra. Depois de um primeiro turno em banho-maria, os primos Marília Arraes (PT) e João Campos (PSB), neta e bisneto do ex-governador Miguel Arraes, protagonizaram nesta reta final a disputa eleitoral mais dura que o Recife já viu.
Teve de tudo: panfletos apócrifos distribuídos em igrejas, guerra de liminares na Justiça com suspensão de propagandas eleitorais dos dois lados, utilização de servidores públicos na campanha, áudios no submundo da internet e ainda a entrada em cena, aos 45 do segundo tempo, da avó de Campos e tia de Marília, Ana Arraes, ministra do TCU (Tribunal de Contas da União).
Bandeiras amarelas do PSB e vermelhas do PT dividem avenidas da cidade, que vive um clima digno do clássico do futebol: Sport x Santa Cruz. Não há outro assunto. A pergunta é uma só: "E domingo?".
Os candidatos João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT) Reprodução/João Campos no Facebook e Marília Arraes no João e Marília estão em um mesmo grupo de WhatsApp da família, intitulado Arraes de Alencar. Reúne alguns parentes mais próximos. Os dois não postam nada.
A família Arraes é bastante discreta em relação ao embate familiar. No primeiro turno, João Campos, que liderava as pesquisas, adotou tom ameno. Não respondia aos ataques dos adversários nem sequer os citava.
Escondeu no palanque o prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB), e o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), muito mal avaliados em pesquisas, para tentar diminuir o tom de continuidade.
No segundo turno, quando as pesquisas indicaram que ele estava numericamente atrás de Marília, a estratégia virou. Geraldo Julio reapareceu em um dos últimos programas.
Na propaganda eleitoral, o PSB investiu no antipetismo e, ao mesmo tempo, colocou em xeque a fé de Marília. Cartazes e panfletos apócrifos foram espalhados. A Justiça Eleitoral foi acionada, mas os autores ainda não foram identificados.
Em uma das peças aparece a frase: "Cristão de verdade não vota em Marília", e ela é mencionada como política que "pertence ao PT, que persegue os cristãos em todo o Brasil". Campos também acusou a prima de fazer parte de um suposto esquema de "rachadinhas".
Além disso, conforme a Folha de S.Paulo mostrou na última quinta-feira (26), servidores da Prefeitura do Recife foram convocados para trabalhar na campanha de Campos.
O jornal Valor Econômico mostrou que o secretário municipal de Administração, Marconi Muzzio, convocava diretamente seus subordinados para participar de distribuição de material de campanha nas ruas do Recife.
Bombardeada, mas à frente das pesquisas, Marília resolveu seguir o segundo turno na toada do "Tum tum tum bate coração", hino da campanha estrelado por Chico Buarque, que participou ativamente da vitória de Miguel Arraes ao governo em 1986 após retornar do exílio.
Na última semana, Marília recebeu o apoio festejado do deputado federal Túlio Gadêlha (PDT-PE). Ele, que foi rifado da disputa no Recife, após acordo de cúpula entre PDT e PSB, transformou-se no maior problema do 2º turno para ela. Foi apelidado por uma ala petista de "o aliado trapalhão". Há também quem o chame de Cavalo de Troia.
A revista Veja publicou na última segunda-feira (23) uma gravação em que Gadêlha diz a um interlocutor que, em conversa com Marília, ela teria dito que ele precisava fazer fundo de caixa de campanha a partir dos assessores e juntar R$ 30 mil.
Não é possível identificar com quem o parlamentar conversa nem precisar a data do diálogo. Por meio de nota, Gadêlha disse que se tratava de mais uma "fake news" do PSB. "Tática essa que tem se tornado corriqueira na campanha pela Prefeitura do Recife."
A gravação foi parar na propaganda eleitoral de Campos. Uma das peças cita que Marília é investigada por improbidade administrativa.
Sem responder aos ataques, a candidata do PT viu Campos encostar, chegando a um empate técnico, segundo pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira.
No último dia da propaganda eleitoral, Marília resolveu iniciar o contra-ataque. Colocou no ar, sem nenhuma contextualização, uma peça publicitária em que Ana Arraes, avó de João Campos e tia de Marília, declara que foi agredida pelo neto.
"Eu espero que ele [João] me peça desculpas. Quem me agrediu foi ele. Nunca agredi. Nunca agredi nenhum neto. Pelo contrário. Sempre fui avó, né?", diz Ana Arraes.
"Sou uma pessoa calma. Tenho tranquilidade para resolver as coisas. Mas tem coisas que a gente não pode admitir. Eu fui criada e aprendi desde cedo a ter respeito às pessoas", conclui.
A peça se encerra com a locutora dizendo: "João Campos não respeita ninguém. O Recife merece respeito".
A propaganda de Marília não explica, mas a declaração de Ana foi dada a um jornalista do Jornal do Commercio após embate entre o neto e Antônio Campos, filho da ministra e único irmão de Eduardo Campos.
Antônio Campos preside a Fundaj (Fundação Joaquim Nabuco). Após receber críticas de João Campos durante uma audiência na Câmara dos Deputados, o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, lembrou que o tio de João trabalhava no MEC com ele.
No mesmo momento, João disse que não tinha relação com Antônio Campos e afirmou que ele era um "sujeito pior" do que Weintraub.
Em nota após o episódio, Antônio Campos disse que João havia "sido nutrido na mamadeira da Odebrecht", apontada pela Lava Jato como integrante de financiamento ilegal de campanhas políticas.
Após as declarações da ministra contra o neto ganharem o palco da disputa eleitoral, ela informou, por meio de nota, nesta sexta-feira (27), que a gravação está fora de contexto. Disse que nunca foi agredida pelos netos, com os quais tem relação de amor e profundo carinho.
Nos últimos dias, circularam jingles apócrifos contra João Campos nas redes sociais com ataques inspirados em uma música que viralizou no 1º turno com acusações ao candidato a prefeito de Pendências (RN) Paulo Barreto (PT). Carros de som circulam tocando a música pela cidade. (Via: Folhapress)
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