O STF (Supremo Tribunal Federal)
retoma na manhã desta quarta-feira (23) o julgamento da constitucionalidade da
prisão de condenados em segunda instância com o voto do relator das ações sobre
o tema, o ministro Marco Aurélio Mello.
Ele é um dos mais ferrenhos defensores da tese de que a Constituição exige
que se esgotem todos os recursos antes da execução da pena de um condenado.
Desde que assumiu a relatoria das ações, que começaram a chegar ao STF em
2016, o ministro tem indicado que votará por declarar constitucional o artigo
283 do CPP (Código de Processo Penal), segundo o qual ninguém pode ser preso
exceto em flagrante ou se houver "sentença condenatória transitada em
julgado".
O código é de 1941. O artigo em questão foi modificado por lei em 2011, em
uma tentativa do Congresso de adequá-lo à Constituição de 1988.
O relator liberou as ações para julgamento no final de 2017. A presidente
do Supremo na ocasião, ministra Cármen Lúcia, evitou colocá-las na pauta do
plenário, o que gerou críticas de parte de seus colegas e, em especial, de
Marco Aurélio.
Naquela época, a Lava Jato estava na iminência de executar a pena do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acabou preso em abril de 2018.
Em 19 de dezembro do ano passado, já com Dias Toffoli na presidência do
tribunal, Marco Aurélio afirmou que estava havendo demora na apreciação das
ações e concedeu uma liminar (decisão provisória) para soltar todos os réus que
haviam sido presos por causa de condenação em segunda instância.
A decisão beneficiaria Lula, o preso mais célebre da Lava Jato, e, após
contestação do Ministério Público, foi derrubada por Toffoli no mesmo dia.
Na liminar cassada, Marco Aurélio afirmou que a constitucionalidade do
artigo 283 do CPP não comporta questionamentos, pois reproduz o princípio da
presunção da inocência, cláusula pétrea da Constituição, que diz em seu artigo
5º que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória".
"Ao tomar posse neste tribunal, há 28 anos, jurei cumprir a
Constituição Federal, observar as leis do país, e não a me curvar a
pronunciamento que não tem efeito vinculante", escreveu Marco Aurélio,
criticando a jurisprudência que, desde 2016, autoriza a prisão de condenados em
segundo grau.
"De qualquer forma, está-se no Supremo, última trincheira da
cidadania, se é que continua sendo", alfinetou.
Nos últimos dez anos, o plenário do STF enfrentou esse tema ao menos cinco
vezes, na maioria delas ao analisar casos concretos de pessoas condenadas, como
fez ao negar um habeas corpus pedido pelo ex-presidente Lula.
Agora, o tribunal vai julgar o mérito das três ações que tratam do assunto de
maneira abstrata, sem estar atrelado a um determinado réu —embora a sombra do
petista permaneça sobre a corte. As ações são de autoria da OAB, do Patriota
(antigo PEN) e do PC do B.
Como nas vezes anteriores que abordou o tema, o Supremo está dividido: há
ministros que defendem a prisão em segunda instância e ministros que entendem
que é preciso esperar o trânsito em julgado (quando se esgotam os recursos).
Há ainda uma proposta intermediária feita em 2016 por Toffoli para
permitir a execução da pena após o julgamento do recurso no STJ (Superior
Tribunal de Justiça), que é considerado uma terceira instância.
A ideia de Toffoli já não afetaria o caso de Lula, condenado pelo STJ em abril
deste ano. Essa possibilidade, contudo, tem perdido apoio entre integrantes do
Supremo.
A sessão da manhã desta quarta deverá começar com as sustentações orais de
dois "amici curiae" (amigos da corte, em latim), da AGU
(Advocacia-Geral da União) e da PGR (Procuradoria-Geral da República). Em
seguida, Marco Aurélio deverá ler seu voto.
Na semana passada, quando o julgamento começou, a PGR enviou uma
manifestação aos ministros reafirmando que considera a prisão em segunda
instância constitucional. O documento pediu ao tribunal que mantenha a
jurisprudência atual ou, ao menos, que permita a execução da pena após o
julgamento do recurso no STJ.
A AGU, também em memorial enviado aos ministros, foi no mesmo
sentido.
Para o advogado-geral da União, André Mendonça, a jurisprudência do STF
tem pacificado a ideia de que "o julgamento em segunda instância encerra
processualmente o contexto de dúvida razoável quanto aos fatos da narrativa
criminosa", podendo, a partir daí, executar a pena.
A expectativa é que a análise das três ações demore mais três ou quatro
sessões plenárias, podendo se encerrar nesta quinta-feira (24) ou na semana de
6 de novembro, pois não estão previstas sessões nos dias 30 e 31 de
outubro.
Depois de Marco Aurélio, faltarão os votos dos dez ministros restantes. (Via: Folhapress)
Blog: O Povo com a Notícia
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