Faz tempo que o diploma universitário não garante um salário mais alto
no futuro. Desde a recessão, que tirou milhões de brasileiros de seus empregos
e corroeu a renda das famílias, porém, só aumenta o número de trabalhadores que
cursaram faculdade, mas tiveram de aceitar funções que pagavam, no máximo, um
salário mínimo.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do
IBGE, colhidos pela consultoria IDados, apontam que 11% dos trabalhadores
formais e informais que cursaram faculdade ganhavam até um salário mínimo (R$
998) no segundo trimestre. É o maior patamar desde que a pesquisa começou, em 2012.
Entre abril e junho deste ano, eram 2,77 milhões de brasileiros nessa
situação. É mais do que a população de Salvador e 1,07 milhão a mais de pessoas
do que cinco anos antes, quando o país ainda não tinha entrado em recessão.
Enquanto a crise foi se espalhando pelo mercado de trabalho, fechando vagas,
aumentando a informalidade e reduzindo o rendimento das famílias, o número de
graduados trabalhando por até um salário mínimo foi aumentando.
A assistente comunitária Valdelice Lima Nery, de 44 anos, faz parte
desse porcentual de profissionais. Formada em administração de empresas, em
2010, ela hoje trabalha por cerca de um salário, em um posto de saúde na zona
oeste do Rio de Janeiro.
“Mesmo empregada, fiz dois anos de cursinhos preparatórios para
concursos, mas a quantidade de seleções caiu e não consegui trocar de emprego.
Queria tentar uma vaga com salário maior, mas tudo foi ficando difícil, pela
piora da situação do país”, conta.
Ela, que presta atendimento a mais de mil famílias na região, diz que a
preocupação agora é manter o emprego. “Mesmo com um número de assistentes
abaixo do necessário na cidade, o contrato só vai até o fim do ano, e a
prefeitura ameaça não renovar o serviço.” Apesar de pouco, por dois anos, esse
salário foi a única renda da família.
Precarização
“A verdade é que o trabalhador está em uma situação complicada”, avalia
o economista Bruno Ottoni, da IDados. “O mercado não está gerando tantos postos
e os que surgem são de baixa remuneração. Ele vê o que está disponível e,
muitas vezes, acaba aceitando uma ocupação que paga bem menos do que gostaria.”
Para o economista, a situação atual do mercado de trabalho, com
desocupação ainda elevada (de 12,6% em agosto) e poucas oportunidades com
melhor remuneração, é o pior dos mundos para muitos ex-universitários. “Alguns
deles tiveram finalmente a chance de entrar na faculdade nos anos anteriores à
recessão, mas se depararam com um mercado que não consegue absorvê-los.”
Um efeito colateral preocupante da falta de boas oportunidades de
emprego para quem tem mais anos de formação seria desestimular as pessoas a
seguirem estudando, diz Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“Isso é ruim, principalmente para as famílias mais pobres, que
investiram com sacrifício em formação superior, com a expectativa de ascender
socialmente. Se o trabalhador sente que não precisava ter estudado tanto, pode
cair em uma frustração difícil de superar”, diz.
Informalidade
A busca dos trabalhadores mais qualificados por vagas com remuneração
melhor deve ser longa, na avaliação de economistas ouvidos pelo jornal O
Estado de S. Paulo. O mercado de trabalho tem se recuperado em um ritmo
mais lento do que se antecipava no início do ano e tem se ancorado, sobretudo,
no avanço do trabalho informal – que é recorde.
O avanço da informalidade ajuda a explicar o aumento do número de
graduados em universidades que ganham um salário mínimo ou menos. A última
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua mostra que em um
ano, até agosto, foram criados 1,4 milhão de postos sem carteira assinada ou
CNPJ (que inclui profissionais liberais e microempreendedores, por exemplo) e
apenas 403 mil vagas de carteira assinada.
Um outro levantamento da consultoria IDados, feito a partir dos números
da Pnad Contínua, aponta que um terço dos trabalhadores informais ganhava menos
de R$ 5 por hora. Desde o início da recessão, há quatro anos, esse porcentual
não fica abaixo dos 30%.
“Se a maioria dos novos postos de trabalho é precária, isso gera uma
dinâmica negativa no mercado de trabalho”, avalia Ganz Lúcio, do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). “Isso precisa
ser objeto de preocupação do poder público. O Brasil não pode se acostumar a
ser um país de informais ou uma economia com trabalhadores de baixa
remuneração.” (Via: Agência Estado)
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