Por Josias de Souza
PT e PSDB monopolizam as eleições presidenciais no Brasil há mais de
duas décadas. Com o passar do tempo, as disputas foram adquirindo um quê de
briga de pátio de colégio. Na sucessão de 2014, a coisa descambou. O tucanato
dizia que o petismo roubara no mensalão e no petrolão. E o petismo respondia
que o tucanato é que assaltara no mensalão mineiro e no escândalo dos trens
paulistas. De repente, os delatores da Odebrecht esclarecem que os dois lados
têm razão. E os torcedores fanáticos, que pareciam dispostos a matar e morrer
por uma honra inexistente, percebem que fizeram papel de bobos. Não sabem onde
enfiar o ódio que estocaram para alimentar suas lacraias interiores.
Há dois anos e meio, quando Dilma foi reeleita, Aécio era o principal
líder da oposição e Lula se jactava de ter dado à luz um poste pela segunda vez
—algo nunca antes visto na história do país. Hoje, Dilma é matéria-prima para
Sergio Moro, Aécio divide com o notório Jucá o título de campeão de inquéritos
da lista de Fachin e Lula nunca esteve tão próximo da cadeia. Legenda de um
líder só, o PT está no brejo sem cachorro. Com Alckmin e Serra no mesmo
pântano, o PSDB ficou num mato com João Doria. O tucanato, incorporado ao
governo de Michel Temer, virou força auxiliar de um apodrecido PMDB. O PT,
devolvido à oposição, derrete como sorvete exposto ao sol.
A lição primeira da hecatombe produzida pela colaboração da Odebrecht
deveria ser a de que todas as premissas sobre as quais o eleitor brasileiro
construiu as suas ilusões políticas depois da redemocratização do país precisam
no mínimo pegar um pouco de ar. Para que o desastre servisse de aprendizado,
seria preciso que os brasileiros se convencessem de que a industrialização do
ódio pior do que uma sandice, é um erro. A maluquice se apaga com o
esquecimento. O erro exige reflexão e correção.
Enquanto os fanáticos se odiavam em praça pública — ou nas redes sociais,
que muitos acreditam ser a mesma coisa — petistas e tucanos amavam a Odebrecht
no escurinho do departamento de propina da empreiteira. Parte da torcida ainda
tenta fechar os olhos para a realidade. Mas está cada vez mais difícil. Os 78
delatores da Odebrecht azucrinam os fanáticos em toda parte. Eles estão na
tevê, no rádio, na internet, no jornal, na revista…. E não adianta ignorar o noticiário.
A voz de Marcelo Odebrecht pode invadir o grupo da família no aplicativo do
celular, exigindo uma reação do fanático. Pode ser uma cara de nojo.
Há também a opção de continuar enxergando a democracia como o regime em
que as pessoas têm ampla e irrestrita liberdade para exercitar a sua capacidade
de fazer besteiras por conta própria, tratando a eleição como uma loteria sem
prêmio e encarando o voto como um equívoco que pode ser renovado de quatro em
quatro anos. De resto, aqueles que preferem odiar alguém a amar o país, podem
odiar-se a si próprios. Como diria Nelson Rodrigues, um dia o sujeito acaba
arrancando a própria carótida e chupando o próprio sangue, como um vampiro de
si mesmo. ( Ilustração via Amorim Cartoons.)
Blog: O Povo com a Notícia