Se a juíza Carolina Lebbos
concordar com a manifestação da força-tarefa da Lava Jato e determinar a
progressão do ex-presidente Lula ao regime semiaberto, a recusa do petista em
aceitar as condições, incluindo a utilização de tornozeleira eletrônica, pode trazer
prejuízos futuros a ele, segundo advogados ouvidos pela Folha.
Nesta segunda (30), Lula divulgou uma carta onde sinaliza que não aceitará
o benefício. “Não troco minha dignidade pela minha liberdade”, afirmou. “Quero
que saibam que não aceito barganhar meus direitos e minha liberdade”, disse o
ex-presidente.
Os especialistas destacam que a situação é inusual, mas que, se houver uma
ordem da juíza e Lula não quiser ir ao semiaberto, na prática ele correrá o
risco de ser considerado um preso com mau comportamento ou responder por
descumprir decisão judicial.
Segundo advogados, o presidente seria obrigado a cumprir a decisão
judicial, caso Lebbos entenda que ele deve seguir para o regime semiaberto.
Marcelo Lebre, professor de direito penal em diversas instituições, como a
Escola da Magistratura Federal, afirma que "uma vez determinado pela juíza
a implantação do regime semiaberto, em tese o condenado não poderia se
recusar". Ele ressalva, no entanto, a possibilidade de um impasse caso a
recusa seja, por exemplo, para a colocação de tornozeleira eletrônica.
Para Lebre, "o condenado não é obrigado a aceitar a tornozeleira como
condição" --embora não haja previsão legal diante de eventual recusa.
"Lembrando que estamos diante de uma situação inusitada. É a primeira vez
que eu vejo alguém não querer ir ao regime semiaberto e, de outro lado, o
Ministério Público fomentando a implementação."
Recusar-se a cumprir uma condição para progressão de regime pode trazer
consequências negativas a Lula.
"Nenhum preso pode se recusar à progressão de regime. O que acontece
é que normalmente quem requer é o preso. Mas a lei dá legitimidade ao
Ministério Público para postular a progressão de regime. Se o Ministério
Público pedir e o juiz deferir, não está na escolha do preso querer ficar no
regime fechado ou ir para o aberto", diz Gustavo Badaró, professor de
direito da USP.
"Pela lei pode [recusar progressão de regime]? Não pode, com a mais
absoluta certeza. Se o juiz determinar que ele vai para progredir para um
semiaberto tal e ele disser que não vai e agarrar-se à cama, isso pode ser
considerada uma falta grave. A lei não prevê que ele tem que aceitar. Depende
do que ele fizer. Se ele der um tapa na cara de um agente, vira uma falta grave
e aí ele não terá bom comportamento", exemplifica Badaró.
Em caso de mau comportamento, o preso não se enquadraria mais no perfil
para progredir de regime, já que este é um requisito para o benefício.
Para a criminalista Jéssica Buair, ao se recusar a usar tornozeleira, Lula
estaria descumprindo decisão judicial.
"O uso da tornozeleira é o que consideramos o regime semiaberto
harmonizado. O fato de ele se recusar a progredir de regime está em se recusar
possivelmente a usar a tornozeleira. Tendo em vista que em casos de execução
semelhantes o semiaberto harmonizado está vinculado ao uso do aparelho",
diz Buiar.
"Nunca vislumbrei uma como esta. Ele estaria abrindo mão de um
direito e descumprindo uma determinação do juízo."
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