O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre fez questão de se apresentar
como “homem do povo”. À moda de populistas em todo o mundo, vangloria-se de
falar num idioma próximo do homem comum, repleto de metáforas futebolísticas e
“causos” de botequim. Os alvos são sempre os mesmos: os banqueiros, as elites,
a “mídia” e todos aqueles que acusa de ter preconceito contra um ex-retirante
nordestino que chegou ao posto de maior poder no país.
Para seus opositores mais eloquentes, Lula é apenas um
hipócrita que enriqueceu à custa da corrupção, um “bilionário” que mantém
fortunas em contas secretas fora do país, onde acumula a fortuna que surrupiou
dos cofres públicos.
A condenação de Lula por corrupção tem contribuído para
trazer um pouco de luzes para a discussão, ao ajudar a revelar a extensão de
sua riqueza. Além de condená-lo a nove anos e meio de cadeia – sentença que só
será cumprida se confirmada na segunda instância –, o juiz Ségio Moro mandou
congelar bens em nome de Lula no valor de R$ 10 milhões.
Depois de bloquear R$ 606 mil em contas e aplicações
bancárias, quatro imóveis e dois carros, a Justiça sequestrou ontem R$ 9,04
milhões de Lula, mantidos em planos de previdência privada no Banco do Brasil.
A depender do valor dos imóveis o total dos ativos de Lula pode chegar perto de
R$ 15 milhões – patamar que, segundo dados divulgados pela Receita Federal no
ano passado, delimita o grupo de 0,1% da população com maior riqueza.
Impossível saber se o valor bloqueado por Moro corresponde a
toda a fortuna de Lula. Ele foi condenado como proprietário oculto de um
apartamento no Guarujá e ainda responde a processos por esconder em nome de
terceiros propinas de R$ 12 milhões recebidas da Odebrecht, na forma do terreno
usado para construir o Instituto Lula, de um sítio em Atibaia e outros agrados
de menor monta.
O Lula que surge da Lava Jato não é o bilionário, dono de
jatinhos e apartamentos em Nova York, Paris e propriedades em ilhas
paradisíacas – esse é o perfil de Joesley Batista. É até possível que Lula
acumule dezenas de milhões fora do país, fora do alcance direto de Moro e da
Lava Jato. Por enquanto, contudo, as investigações têm revelado um padrão de
riqueza mais compatível com um executivo de classe alta do que com um magnata:
carros, meia dúzia de imóveis e R$ 10 milhões no banco.
A questão é: Lula teria como acumular tudo isso apenas com os
vencimentos que recebeu ao longo da vida, do partido, de suas aposentadorias e
dos cargos públicos que ocupou?
Para guardar R$ 9 milhões, supondo um rendimento real de 5%
ao ano – compatível com os ganhos da Selic sobre a inflação –, um indivíduo da
idade de Lula que tivesse começado a poupar aos 30 anos precisaria guardar R$
5.865 por mês (em dinheiro de hoje) ao longo de 35 anos. Seria possível Lula
ter mantido tais contribuições?
Claro que não. Seu dinheiro foi, contudo, encontrado em duas
contas, uma com R$ 1,8 milhão em seu nome, outra em nome de sua empresa de
palestras, a LILS, com R$ 7,19 milhões. É possível inferir que a segunda conta
reúne os rendimentos polpudos de sua carreira de palestrante, iniciada depois
que ele deixou o governo, enquanto a primeira acumula sua poupança ao longo da
vida. Lula nega ter realizado palestras de fachada para disfarçar propinas e
apresentou provas de ter feito várias delas.
Independentemente da dúvida que cerca essa carreira
lucrativa, para guardar o R$ 1,8 milhão, alguém com o perfil e a idade de Lula
precisaria ter poupado pouco menos de R$ 1.200 por mês ao longo de 35 anos. Não
é um absurdo, mas certamente não é um rendimento acessível a um “homem do
povo”, nem a ninguém que receba salário mínimo. Mesmo professores
universitários ou gerentes de nível médio teriam dificuldade para manter tal
poupança.
A condenação de Lula apenas confirma um fato que ele tenta a
todo custo esconder atrás de sua retórica populista: Lula tem um padrão de vida
e uma riqueza compatíveis com uma vida de classe alta. Ele pertence, portanto,
à mesmíssima elite que tanto insiste em atacar. (Via: G1)
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