Neste sábado (12), o Procurador-Geral de Justiça de Pernambuco, Dirceu
Barros, foi entrevistado no programa 20 Minutos, da TV Jornal, apresentado pelo
cientista político Antônio Lavareda. Na ocasião, o jurista se mostrou descrente
com o sistema penal brasileiro na atualidade. “Nós temos a legislação criminal
mais benevolente para bandido do mundo. Aqui é um paraíso da criminalidade. Para manter alguém preso é um milagre”, afirmou.
Contudo, Dirceu Barros afirmou que, em sua visão, a maioria dos presos
no país está na cadeia “sem necessidade”. “Aqui se prende muito e se mantém
preso sem necessidade. Isso é um problema de uma legislação que vai completar
78 anos, um Código Penal que foi baseado no italiano, do seculo XVIII, que já
mudou 11 vezes lá na Itália. A gente não consegue mudar com qualidade”, disse.
“Conheço o sistema carcerário e digo que 70% não precisaria estar
presos, nossa legislação hoje só prende pobre”, continuou.
Barros defendeu o “pacote anticrime”, elaborado pelo ministro da Justiça
e Segurança Pública, Sérgio Moro. “O pacote é uma ideia muito interessante. A
legislação brasileira precisa ter mais eficácia, ter penas mais duras para a
bandidagem”, disse. Contudo, o chefe do Ministério Público de Pernambuco (MPPE)
é contra um dos pontos mais falados do pacote, o “excludente de ilicitude”,
onde policiais deixariam de cometer crime ao matarem suspeitos.
“Não é necessário existir isso. Desde 1850 na legislação brasileira já
existe um mecanismo chamado ‘legitima defesa’. Isso não é só no Brasil, no
mundo todo. O que se fala é que é um direito natural do homem, pois é seu
instinto. Se alguém for matar o cidadão, automaticamente ele vai reagir para
sobreviver”, disse Barros.
“A grande questão é que não precisa, já tem no código penal: ‘Não comete
crime o cidadão que reage a uma injusta agressão atual ou iminente a direito
seu ou de outro’. Acho que foi uma campanha publicitária de algum político para
agradar uma determinada classe. Se você for falar para um delegado ou promotor
ninguém concorda com isso [o excludente], porque é um mecanismo que já existe.
Não precisa existir esse debate”, continuou.
Para Dirceu Barros, o Brasil tem um problema legislativo. “Temos uma
inflação de leis. Há dois anos tento atualizar o Código Penal e não
consigo, porque passo quatro meses atualizando e logo em seguida vem uma
mudança. Temos uma grande quantidade de leis sem eficácia no país”, criticou.
O procurador também comentou o episódio onde Rodrigo Janot, que foi
Procurador-Geral da República (PGR), alega ter entrado armado no Supremo
Tribunal Federal (STF), sacado uma arma e cogitado atirar no ministro Gilmar
Mendes e se suicidar em seguida.
“Não sabíamos que o clima era tão tenso entre o chefe do Ministério
Público da União e o STF. Hoje ele não pertence mais ao MP, ele advoga.
Responde à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). No entanto, não se se houve um
exagero ou erro por parte da imprensa ao divulgar o caso, não houve crime”,
disse Barros.
“Temos na legislação um conceito chamado ‘direito à perversão’. Se
fôssemos prender quem pensa em matar o outro e não executa, estaria todo mundo
preso”, continuou.
Lavareda levantou a questão de que o fato, aliado às revelações das
reportagens chamadas de “Vaza Jato”, que mostram supostos excessos de
procuradores da Justiça, ajudaria desgastar a imagem do MP. Barros respondeu
dizendo que as pessoas não sabem que Janot não faz mais parte do Ministério
Púbico – apesar de fazer parte na época registrada no relato – e isto agregaria
uma imagem ruim à instituição.
Sobre as revelações da “Vaza Jato”, Barros minimizou. “Na realidade, o
MP está sob alvo de ataques hoje. Uma sequencia interminável de leis que tentam
enfraquecer o MP e o Judiciário. E essas leis estão sendo feitas em virtude de
acertos da Justiça, ao meu ver. Se houve erros, em toda operação gigantesca há
erros e acertos, no sobrepesar eu acho que houve mais acertos. “Você não pode
matar o carrapato atirando no boi”, afirmou.
O Procurador-Geral do Estado comentou, também, sobre os decretos de
flexibilização no porte e na posse de armas de fogo, bandeira encampada pelo
presidente Jair Bolsonaro (PSL). “Eu entendo que o Brasil não tem sistema
cultural e emocional para o cidadão portar arma”, disse.
“Não podemos nos basear no sistema dos Estados Unidos, onde ter armas é
uma coisa cultural de séculos. Aqui no Brasil não tem como. Apoio somente para
as propriedades rurais. Nesses locais, as pessoas sem armas ficam mais
vulneráveis”, explicou.
Sobre a Lei de Abuso de Autoridade, sancionada com vetos pelo presidente,
Barros criticou: “Essa lei ganhou outro nome, que ‘abuso da criminalidade’. Nós
fizemos um grande movimento para vetar os dispositivos, e conseguimos os vetos.
Acredito que os parlamentares não sabem o que assinaram. Essa lei é um ato de
terrorismo contra a sociedade”, disse.
“A partir de agora o cidadão comece a colocar grades nas portas, nas
janelas e no telhado. A criminalidade vai ser multiplicada por mil. Amarraram o
Poder Judiciário, a Polícia Federal, as polícias civis, o MP. Hoje não temos
mais ferramentas para começar a investigar. O atentado foi frontal contra o
poder de decisão criminal do juiz. Para abrir uma investigação contra alguém,
seja de corrupção ou crime, não vai ser fácil”, lamentou Barros.
Para Barros, o dispositivo que torna abuso de autoridade a violação de
prerrogativas de advogados também teve exagero. “Ficou muito localizada, se
formou um privilégio. No caso deveria se ter colocado todas as funções,
inclusive a de jornalista, com prerrogativas. Não há necessidade porque já temos
uma lei de abuso que pune violar o princípio da legalidade. O artigo 146 do
código penal, que fala sobre causar constrangimento ilegal também”, argumentou
o procurador.
Lista tríplice
Em janeiro de 2019, Dirceu Barros foi empossado para o segundo mandato,
de dois anos, para a chefia do Ministério Público de Pernambuco. Nos Estados, o
governador é obrigado, por lei, a escolher entre uma lista tríplice, formulada
por meio de uma eleição interna da categoria.
O mesmo não ocorre para o Procurador-Geral da República (PGR). Augusto
Aras, indicado por Jair Bolsonaro, não figurava na lista extra-oficial enviada
pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). A indicação de
um nome fora dessa lista não ocorria desde 2003.
Barros comentou o caso: “Isso é um assunto que está muito evidente
dentro do MP. Raquel Dodge – PGR anterior a Aras – se comportava como se fosse
chefe do MP brasileiro, e ela não era. O PGR é chefe do Ministério Público da
União, onde entra o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do
Trabalho (MPT) e o militar”, disse.
Ele defende uma mudança na Constituição para que a escolha do PGR
seja oficialmente como a dos estaduais. “Dos 27 ministérios públicos estaduais,
cada um tem um chefe. Nós não temos ligação com a PGR, por isso, são sistemas
de escolha diferentes, previstos na Constituição Federal”, afirmou Barros. “O
ideal é que a Constituição repetisse o modelo estadual, onde a categoria se
unisse e escolhesse o seu procurador. Só que não há previsão de lista tríplice
nesse caso”, concluiu Barros.
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