Não à mudança constitucional que
permite instalar usinas nucleares em Pernambuco
Heitor Scalambrini Costa
Professor aposentado Universidade Federal de Pernambuco,
Professor aposentado Universidade Federal de Pernambuco,
Em 5 de outubro de 2019 a Constituição Estadual completou 30 anos. Veio no
rastro da Carta Magna de 1988, chamada de Constituição Cidadã, que inovou no
federalismo, assegurando aos Estados maior capacidade de autogestão, autonomia
política para escolherem seus gestores e editarem leis.
Neste trintenário da Constituição pernambucana, uma proposta de mudança de
seu artigo 216 está provocando polêmica, e ao mesmo tempo um amplo debate na
sociedade. O referido artigo, cuja redação original trata da proibição de
usinas nucleares no território do Estado de Pernambuco, seria modificado pela
PEC 09/2019 de 25 de setembro de 2019, proposta pelo deputado estadual Alberto
Feitosa. Assim, a nova redação passaria a “O Estado fomentará projetos e
atividades de geração de energia de fontes renováveis, que se mostrem eficazes
e economicamente competitivos, priorizando o equilíbrio socioambiental,
mediante concessão de incentivos fiscais e financeiros.”
A primeira lida esta redação parece adequada ao maior desafio atual da
humanidade, o aquecimento global, e o papel das fontes não convencionais
(fósseis) nas mudanças climáticas. Todavia a justificativa que acompanha esta
PEC é de uma má fé grandiosa, aliada ao desconhecimento do nobre deputado. A
justificativa da PEC simplesmente considera as vantagens (?), tratando a
energia nuclear como fonte renovável de energia (que não é). E ao mesmo tempo
permite que usinas nucleares sejam instaladas em Pernambuco. E não estamos
falando em simplesmente uma, mais de seis reatores (6.600 MW) até 2050, como
planeja e defende os lobistas desta tecnologia.
São feitas afirmações peremptórias, quase que definitivas de que a fonte
nuclear é “ecologicamente mais benéfica”, que os “riscos de um acidente severo
são inexistentes”, que “energia eólica e a solar são intermitentes e que essa
condição gera problema de abastecimento de energia elétrica, dai a necessidade
de energia firme, a nuclear”, que “sem as usinas nucleares o desenvolvimento
tecnológico nacional na área nuclear estará comprometido”, ainda que “os
benefícios econômicos advindos por este empreendimento, alavancara o município
e toda região, com o Estado recolhendo mais impostos, e aplicando para melhorar
a qualidade de vida do sertanejo”.
Como a decisão governamental de instalar usinas nucleares é política e não
técnica, acaba prevalecendo na tomada de decisão, pressões dos grupos que se
beneficiarão da indústria nuclear. Na verdade a dinheirama deste projeto,
somente beneficiará grupos econômicos internacionais, fabricante dos equipamentos,
construtoras, grupo de cientistas/pesquisadores, setores das forças armadas. Os
argumentos técnicos, econômicos, sociais, ambientais usados em defesa deste
empreendimento são capciosos. Passo a seguir a comentar alguns deles.
A produção de energia elétrica a partir da geração nuclear não é
ecologicamente benéfica quando se analisa o ciclo do combustível nuclear, desde
a mineração, a fabricação do elemento combustível, ao tratamento dos rejeitos
radioativos (lixo) e seu armazenamento. Além de não considerar que a fase do
“descomissionamento” destas estruturas industriais, custam caro, e gastam muita
energia, contribuindo para a emissão de gases de efeito estufa. A energia
nuclear é suja.
Na ânsia em defender o indefensável são feitas afirmativas esdrúxulas
sobre a probabilidade zero de ocorrer acidentes severos, ou seja, vazamento de
material radioativo do interior dos reatores para o meio ambiente (terra, ar,
água). Acidentes de vazamento não são tão raros assim, e quando acontecem são
dramáticos para as pessoas e para a natureza. Dai afirmar “podem ficar
tranquilos população, NUNCA terá acidentes”, é inconcebível, se vamos
estabelecer um debate sério e necessário sobre esta insanidade que é instalar
usinas nucleares no Nordeste, a beira do rio São Francisco.
É defendido que para garantir o abastecimento é exigido fontes gerando
continuamente (energia firme), como a energia nuclear. Não reconhecem que o
Brasil tem muitas opções energéticas renováveis, e os efeitos sistêmicos entre
as fontes hidráulicas, as eólicas, a solar, e as termoelétricas a biomassa, são
as melhores opções para a diversidade, complementaridade e sustentabilidade de
nossa matriz elétrica.
A construção das usinas e gestão, não agrega e nem ancora o sistema
tecnológico e de ciências do país, pois são adquiridas as grandes “players” do
setor, na modalidade de aquisição conhecida como “turn key”. São usinas que
demandam investimentos iniciais de 20 bilhões de reais (5 bilhões de dólares),
podendo chegar aos 25 bilhões com os aditivos contratuais ao longo da
construção. As seis usinas corresponderiam a 150 bilhões de reais.
Com
investimentos muito, muito mais modesto nos Centros de Pesquisa, Universidades,
investindo em reatores de pesquisa, reatores multi-propósito, se conseguiria
atingir as condições básicas para o desenvolvimento científico e tecnológico do
país na área nuclear (para outras aplicações: agricultura, medicina, …), e em
outras áreas estratégicas para o país.
Justificar que o investimento de 150 bilhões de reais até 2050 nestas
usinas, vai automaticamente resultar em benefícios econômicos para as
populações locais/regionais é altamente questionável. A mesma conversa fiada,
de que o desenvolvimento, vai gerar empregos e renda pela chegada das usinas.
Afirmativas sem lastro na realidade brasileira, tomando como exemplo outras
grandes obras e empreendimentos que não cumpriram as promessas de ordem social
e ambiental (Complexo lndustrial Portuário de Suape, Transnordestina,
Transposição do rio São Francisco, …..).
A luta contrária a implantação destas usinas em Itacuruba é a defesa de um
Brasil livre do nuclear. Esperamos que os membros da Constituição, Legislação e
Justiça, da Assembléia Legislativa de Pernambuco (9 deputados) cumprirão com
seu dever de legislar, auscultando o clamor da sociedade, que não aceita e não
quer esta mudança constitucional.
Não ao nuclear, Não aos meros interesses econômicos. SIM para a vida, e
para o futuro do planeta Terra.
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