Na entrevista que concedeu ao Jornal Nacional, Geraldo Alckmin
tentou apresentar-se como candidato transformador pelo menos 18 vezes. Fez isso
nas dez passagens em que repetiu a palavra “reforma”, seis das quais no plural.
Ou nas oito ocasiões em que pronunciou os vocábulos “mudar” ou “mudanças”. A
despeito do esforço, o presidenciável tucano revelou-se diante das câmeras uma
novidade com aparência de pão dormido. Numa conversa de 27 minutos, a lama
ocupou 62% do tempo.
Nos primeiros 17 minutos, Renata Vasconcelos e
William Bonner abriram diante de Alckmin o gavetão das pendências tucanas: a
companhia tóxica do centrão, com seus 41 caciques enrolados na Lava Jato; a
convivência partidária com o réu Aécio Neves e o presidiário Eduardo Azeredo; a
verba suja da Odebrecht, supostamente coletada pelo cunhado; o ex-secretário do
governo paulista preso por desvios no Rodoanel; o operador Paulo Preto, com R$
113 milhões escondidos no estrangeiro…
A reunião das encrencas apresentou ao pedaço
despolitizado da audiência um fenômeno pós-Lava Jato: o fim da blindagem do
tucanato. A cada nova resposta, Alckmin exibia ao telespectador a ferrugem que
levou o PSDB a replicar a estratégia do PT. Antes, os tucanos acusavam os
petistas de proteger corruptos. Agora, os petistas sustentam que protetores de
corruptos são os tucanos. E a plateia fica autorizada a concluir que os dois
lados estão cobertos de razão.
“Todos os partidos têm bons quadros”, disse
Alckmin sobre sua aliança com o centrão. Aécio “foi afastado da presidência do
partido”, alegou, como se ninguém tivesse notado que o achacador de Joesley
Batista deixou o comando do partido voluntariamente. Azeredo “vai pedir o seu
desligamento”, declarou o candidato, abstendo-se de explicar por que o preso
continua ocupando uma cadeira na Executiva Nacional do PSDB.
“É mentira”, afirmou Alckmin sobre a delação
em que executivos da Odebrecht revelaram a transferência de R$ 10,3 milhões do
departamento de propinas da empreiteira para suas arcas eleitorais. O candidato
levou a mão no fogo por Laurence Casagrande, o ex-secretário preso: “É um homem
sério”. Tomou distância de Paulo Preto, o operador do tucanato paulista: “Já
estava fora do governo quando eu assumi.”
Se a entrevista de Alckmin teve alguma
utilidade foi para demonstrar duas coisas: 1) O partido fundado
por Franco Montoro, Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso fracassou na tarefa
de formar novos quadros. Preocupou-se tanto em desconstruir Lula e seus súditos
que esqueceu de reconstruir sua própria imagem. 2) Dezesseis anos
depois de ter sido retirado do Planalto, falta ao PSDB uma agenda capaz de
oferecer ao eleitorado a matéria-prima mais escassa no mercado eleitoral:
esperança.
Cavalgando a inépcia dos rivais emplumados,
Lula dá as cartas a partir da cadeia. E Jair Bolsonaro sapateia sobre Alckmin
até em São Paulo, ameaçando desfazer o Fla-Flu que transformou as últimas seis
sucessões presidenciais numa disputa particular entre PSDB e PT. Candidato dos
sonhos da banca, Alckmin coleciona índices pífios nas pesquisas. Aposta que
conseguirá chamar a atenção dos eleitores plantando bananeira no latifúndio
televisivo que obteve graças à aliança com o rebotalho do centrão.
Na prévia do Jornal Nacional, o candidato
tucano foi contestado mesmo naquilo que acha que fez de melhor: “A política de
segurança de São Paulo é um exemplo”, declarou, em meio a questionamentos sobre
a pujança do PCC, multinacional do crime sediada no Estado em que nenhum outro
político governou por mais tempo do que Alckmin. A julgar pelo que o
presidenciável tucano conseguiu exibir na entrevista, sua presença no segundo
turno está garantida apenas até certo ponto. O ponto de interrogação. (Via: Blog do Josias de Souza)
Blog: O Povo com a Notícia