Fernando Haddad desceu sem muita agilidade da traseira de uma
caminhonete e andou até o palco montado para recebê-lo no centro de João Pessoa
(PB).
Estava cansado, mas esperou com paciência os longos discursos dos
aliados, vestiu um chapéu de vaqueiro e tirou várias fotos antes de pegar o
microfone e resumir, em menos de quinze segundos, o que promete fazer caso seja
eleito.
"Vamos baixar imposto de pobre, taxar os mais ricos e tocar obras
paradas. Os banqueiros estão esfolando o povo", bradou.
Nem parecia ele. Frases prolixas, termos como “spread bancário” e o
blazer bem cortado haviam ficado para trás.
Naquela quinta-feira (23), terceiro dos cinco dias de seu périplo pelo
Nordeste, Haddad, de camiseta e cabelos desgrenhados, atingia o ápice de sua
transmutação: era apresentado como Luiz Inácio Lula da Silva, seu padrinho
político e ícone na região.
"Haddad é Lula, Lula é Haddad", repetia a mestre de cerimônia.
E Haddad parece mesmo disposto a mudar.
Candidato a vice na chapa petista, o ex-prefeito de São Paulo entendeu que, para herdar o apoio que hoje está na órbita de Lula — 39% das intenções de voto, segundo o Datafolha—, terá que fundir sua imagem à do ex-presidente.
Ainda desconhecido por 51% dos nordestinos, Haddad viajou cinco estados
com uma recomendação expressa: comunicar, de maneira simples e direta, que é o
nome capaz de levar adiante o projeto de Lula caso o ex-presidente seja
declarado inelegível.
E assim o fez. A disciplina, característica de sua rotina acadêmica, foi
fundamental para a mudança que começou no primeiro dia da empreitada,
terça-feira (21).
Em poucas horas, passou de um despercebido no aeroporto de São Paulo,
cidade que governou, a assediado por uma multidão na periferia de Salvador,
onde nunca havia feito campanha.
Ao lado do governador e candidato à reeleição, Rui Costa (PT), Haddad
começou a caminhada visivelmente desconfortável com o empurra-empurra, mas não
quis ir em cima do carro de som.
No fim do dia, com os cabelos molhados de chuva e suor, parecia mais à
vontade e até dançou embalado pelo batuque do bloco Ilê-Aiyê.
Os auxiliares mais próximos afirmam que a viagem pelo Nordeste foi
importante para Haddad “se deixar tocar pelas pessoas” e desfazer sua imagem de
pouco habilidoso no contato direto com o eleitor.
Não que ele não tenha recaídas. Na chegada a João Pessoa comentou com o
governador Ricardo Coutinho (PSB-PB) sobre a arquitetura “super modernista” do
Clube do Cabo Branco, que visitavam.
Deixou os militantes que o recepcionavam sem entender do que se tratava
quando fez qualquer menção ao “pilotis” que sustentava a estrutura.
A batalha de Haddad não é só de transformação interna. Ele e o PT
precisam encontrar um caminho eficaz para a transferência de votos — segundo o
Datafolha, 31% dizem votar com certeza em um indicado por Lula e 18% afirmam
que talvez o fariam. Desses, apenas 9% estão com Haddad.
Em uma campanha curta, o desafio é mostrar que, nessa eleição, Haddad é
o reflexo perfeito do ex-presidente. (Via: Folhapress)
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