O deputado Eduardo Bolsonaro
(PSL-SP), defendeu , em entrevista ao GLOBO , a possibilidade de pena de morte
para traficantes de drogas, a exemplo do que ocorre na Indonésia, e para
autores de crimes hediondos. Filho mais atuante do presidente eleito, Jair
Bolsonaro , desde a eleição em outubro, reeleito com 1,8 milhão de votos e
provável futuro líder do PSL na Câmara, Eduardo disse que um plebiscito pode
ser usado para consultar os brasileiros, apesar da vedação explícita da
Constituição.
De acordo com a publicação, hoje, o texto constitucional trata a
impossibilidade da pena de morte como uma cláusula pétrea, que não pode ser
alterada mesmo com uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). — Eu sei que é
uma cláusula pétrea da Constituição, artigo 5º etc. Porém, existem exceções.
Uma é para o desertor em caso de guerra. Por que não colocar outra exceção para
crimes hediondos? — questionou Eduardo.
O contexto da conversa foram telegramas diplomáticos, obtidos pela
reportagem, que revelam como ele tentou visitar o complexo prisional de
Nusakanbangan, numa ilha na Indonésia, onde dois brasileiros condenados por
tráfico foram fuzilados em 2015. Os telegramas mostram que o parlamentar
manifestou concordância com um sistema penal que permite a execução de
traficantes.
A tentativa de Eduardo de ir ao complexo gerou um constrangimento
diplomático. Depois de ação da Embaixada do Brasil na Indonésia, o filho do
presidente eleito foi convencido a não ir ao local. O deputado restringiu sua
visita ao presídio de Tangerang, na região metropolitana de Jacarta, capital da
Indonésia, em 30 de julho de 2017.
Por três horas, conheceu a unidade onde a maioria dos presos cumpre pena
por tráfico. Um telegrama registra: “Após conhecer o complexo, o parlamentar
conversou com o diretor-geral do presídio, ocasião em que manifestou sua
concordância com o rígido tratamento conferido a traficantes de drogas neste
país. Observou, também, o papel desempenhado pela religião na disciplina e na
reabilitação dos detentos.”
Após ser questionado pelo GLOBO a respeito dos telegramas, Eduardo afirmou
que a pena de morte é uma medida “bem propícia” para ser levada a um referendo
ou a um plebiscito, inclusive para traficantes. Quase 30% dos presos
brasileiros cumprem pena ou aguardam julgamento por suspeita de tráfico de
drogas, conforme dados do Ministério da Justiça.
A posição assumida por Eduardo marca um retorno dos Bolsonaro a um assunto
que eles haviam deixado para trás para tornar a candidatura do pai menos
radicalizada. A pena de morte era presença constante nos discursos mais
inflamados da família. As falas foram moduladas e os Bolsonaro passaram a
evitar o tema.
Em 2015, no primeiro ano como deputado, Eduardo fez uma defesa explícita
da pena capital, em casos de “crime premeditado em que resulte morte” e em
casos de pedofilia. Naquele momento, ele fez a ressalva de que a Constituição
proíbe a medida e que somente uma nova Assembleia Constituinte poderia mudar
isso.
No ano seguinte, o deputado, após surfar na Indonésia, publicou nas redes
sociais que o país “prevê pena de morte para tráfico de drogas”. Em 2017, antes
de embarcar para a Indonésia nas férias em julho, Eduardo voltou a falar de
pena de morte nas redes. Dessa vez, lembrou que a Constituição veda a pena:
— Pena de morte é muito mais uma força de expressão, uma bandeira a ser
levantada, do que de fato uma medida a ser colocada em prática.
Nas férias de julho de 2017, em viagem de “interesse particular”, Eduardo
mobilizou a diplomacia brasileira para tentar garantir sua presença na ilha da
Indonésia onde os brasileiros Marco Archer Moreira e Rodrigo Gularte foram
executados. Os dois foram flagrados com drogas e acabaram condenados à morte.
Um telegrama de 10 de julho registra a intenção do deputado de visitar o
sistema prisional indonésio nos dias 30 e 31. “O deputado demonstrou particular
interesse em realizar, se possível, visita à unidade prisional da ilha de
Nusakanbangan”, registra o documento.
O embaixador Rubem Corrêa Barbosa consultou o Itamaraty sobre como
proceder com o pedido, por se tratar de “tema especialmente delicado nas
relações bilaterais”. Barbosa comunicou os diretores dos presídios de
Nusakanbangan e de Tangerang sobre as intenções de Eduardo. “Alerto que o
pedido do deputado esbarra em inconvenientes políticos e dificuldades
logísticas”, anotou.
Outro telegrama cita a “possível repercussão” da visita do filho do
presidente eleito ao presídio. Os argumentos foram apresentados ao deputado,
que insistia em estar no presídio das execuções. Eduardo desistiu “à luz das
ponderações e com vistas a maximizar o aproveitamento do exíguo tempo
disponível”.
Mudança
precisaria de Constituinte
Plebiscito e referendo, instrumentos citados por Eduardo Bolsonaro como
possíveis de serem usados para uma consulta sobre a pena de morte no Brasil,
não podem ser adotados com essa finalidade, segundo o professor de Direito
Thiago Bottino, da Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio. O referendo é uma
consulta para que a população aprove ou não uma mudança feita pelo Congresso. O
plebiscito é uma consulta prévia — a decisão popular é encaminhada depois ao
Legislativo.
— O plebiscito é a base para uma lei ou para uma alteração da
Constituição. Mas não se pode perguntar algo à população sobre o que não pode
ser mudado, como uma cláusula pétrea. E uma mudança em garantias fundamentais
nunca pode ser para reduzir direitos, apenas para ampliar direitos — diz
Bottino.
O caminho que resta, segundo o professor da FGV, é uma Assembleia
Constituinte para fazer uma nova Constituição.
— Todas as novas Constituições brasileiras são fruto de uma ruptura. Não
vejo a atual situação política do Brasil como ruptura. Bolsonaro e Mourão foram
eleitos dentro das regras democráticas — diz o especialista ao Globo.
O último dispositivo legal a prever pena de morte no Brasil de forma mais
ampla foi o decreto-lei de segurança nacional baixado pelos comandos militares
na ditadura, em 1969. O texto se voltava a crimes políticos que afrontassem a
soberania e a independência nacionais ou atos de sabotagem que causassem
mortes. A pena de morte não foi adotada na prática. A Constituição de 1988
prevê pena só em casos de crimes de militares “em guerra declarada”.
A Constituição do Império previa pena de morte. Dom Pedro II passou a
conceder perdão para os condenados à morte, convertendo a pena em prisão
perpétua. A última execução ocorreu em meados do século 19. As informações são
do O Globo.
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