Durante cerimônia no Palácio do Planalto na manhã desta quarta-feira (15/9), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que uma alteração no marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pode impactar ainda mais a inflação de alimentos e até mesmo causar desabastecimento global. O tema, que divide opiniões, também respinga nas demarcações das terras indígenas no Brasil.
O marco temporal é uma
interpretação defendida por ruralistas e grupos interessados na exploração
econômica das áreas indígenas que restringe os direitos constitucionais dos
povos originários. O governo federal é favorável. De acordo com a tese, essas
populações só teriam direito à terra se estivesse sob sua posse no dia 5 de
outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
“A
gente pede a Deus que logo mais o nosso Supremo Tribunal Federal não altere o
marco temporal. Se isso vier a acontecer, porque é uma pressão externa muito
grande, mas o pessoal lá de fora não sabe as consequências disso aí. Hoje, o
Brasil tem a sua segurança alimentar. Mas muitos outros países dependem do que
nós produzimos para que eles lá fora tenham a sua segurança alimentar também”,
disse o presidente nesta quarta-feira. O mandatário participava de evento para
anúncio de novas medidas no Programa Casa Verde e Amarela.
“Nós estamos experimentando uma inflação alta nos gêneros alimentícios no
mundo todo, fruto da pandemia e fruto também do ‘fique em casa, a economia a
gente vê depois’. Se Brasil tiver que demarcar nossas reservas indígenas,
conforme a previsão do Ministério da Agricultura, o equivalente a mais 14% do
território nacional – que seria equivalente aos estados Rio de Janeiro,
Espírito Santo, São Paulo e Minas Gerais –, isso equivale a uma Alemanha e
Espanha juntas. O preço de alimentos vai disparar, e não só isso: podemos ter
no mundo desabastecimento”, prosseguiu Bolsonaro.
“Se
esse novo marco temporal passar a existir, caso o Supremo assim entenda, será
um duro golpe no nosso agronegócio, com repercussões internas quase
catastróficas, mas também lá para fora”, reforçou nesta quarta.
O
mandatário seguiu fazendo um apelo: “Hoje, o Brasil é um país responsável. A
gente pede a Deus que o marco temporal definido por ocasião da demarcação
Raposa Serra do Sol seja mantido, porque temos problemas e nós estamos
exatamente no caminho contrário”.
O STF discute há semanas a
repercussão da tese do marco temporal. Lideranças de povos indígenas de todo o
país estão acampados em Brasília há semanas para acompanhar o debate e
protestar contra a tese do marco temporal e o garimpo ilegal. A análise pela
Suprema Corte retoma à pauta esta semana.
Entenda o marco temporal
Em 2013, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) acolheu a tese
do marco temporal ao conceder ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (antiga Fundação de Amparo
Tecnológico ao Meio Ambiente – Fatma) reintegração de posse de uma área que
está em parte da Reserva Biológica do Sassafrás, onde fica a Terra Indígena
Ibirama LaKlãnõ. Lá, vivem os povos xokleng, guarani e kaingang.
Em 2019, o STF deu status de
“repercussão geral” ao processo, o que significa que a decisão tomada neste
caso servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça
no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios. A pauta é considerada o
julgamento do século para os povos indígenas.
O STF julga um recurso da Fundação Nacional do Índio (Funai) que questiona
a decisão do TRF-4.
O caso começou a ser julgado no dia 11 de junho, mas foi interrompido
quando o ministro Alexandre de Moraes pediu vista. O relator, ministro Edson
Fachin, proferiu na semana passada seu voto contrário à demarcação do marco
temporal.
Segundo Fachin, “a proteção constitucional aos direitos originários sobre
as terras que (os indígenas) tradicionalmente ocupam independe da existência de
um marco temporal em 5 de outubro de 1988 (data da promulgação da
Constituição), porquanto não há fundamento no estabelecimento de qualquer marco
temporal”.
A
discussão deve seguir na corte nesta quarta-feira (15/9), com a continuação do
voto do segundo ministro a se manifestar, Kassio Nunes Marques. (Via: Metrópoles)
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