Na quarta-feira (12), João de
Deus e um de seus auxiliares entraram num sítio nos arredores de Goiânia, sem
aviso prévio. A informação é da coluna de Mônica Bergamo, da Folha. Segundo a
colunista, a propriedade é de uma família que teve um de seus integrantes
diagnosticado com câncer terminal na infância, salvo pelo médium há duas
décadas. O assistente avisou aos donos da terra, seus amigos, que o médium João
de Deus precisava passar alguns dias recolhido no lugar. Assediado por
repórteres depois da acusação de que abusou sexualmente de mais de 300
mulheres, sem poder andar pelas ruas de Abadiânia (GO), ele precisava descansar
e esperar a poeira baixar. Os donos da casa não acreditavam no que estavam
ouvindo. Mas, eternamente gratos, acolheram o médium.
O advogado do médium, Alberto Toron, passou a negociar as condições de sua
apresentação. “Nunca houve a intenção de fuga. A ideia era que ele se
apresentasse o mais rápido possível, como foi feito”, afirma o defensor. De
acordo com a coluna, o médium, no entanto, ficou ansioso e aflito. Na madrugada
de sábado (15), sem conseguir dormir, se embrenhou em um bosque perto do sítio,
montou uma barraca e dormiu no meio do mato. Não queria sair de lá para nada.
Disse que precisava ficar sozinho e meditar. Voltou à casa já tarde da noite.
Tomou banho, comeu alguma coisa — e de novo foi para o bosque.
A sócia de Toron, Luisa Moraes Abreu Ferreira, foi ao sítio buscar João de
Deus. A ideia era acertar um ponto exato, numa estrada de terra, em que ele se
apresentasse às autoridades. João de Deus caminha de sua barraca no mato para
encontrá-la. A advogada se espanta com o fato de ele ter dormido em uma
barraca. Ainda conforme Mônica Bergamo, João de Deus está com os cabelos
desalinhados. Veste uma camiseta azul clara, larga e amassada, e uma calça
cáqui.
“Você quer fazer alguma pergunta, irmã?”, diz ele à colunista da Folha,
que acompanha a cena. Começa a falar das acusações que sofre. “Eu só sei
que é uma coisa montada, armada. Para pegar o meu dinheiro”, afirma. O
auxiliar oferece a ele um copo de água.
E por que tantas mulheres, mais de 300, fizeram denúncias parecidas contra
ele? João de Deus se vira para a advogada. “Eu te contei do telefonema? Me
telefonaram e disseram: ‘Vamos colocar 50 [mulheres] para falar mal de você. Se
você falar alguma coisa, colocamos 200. E, depois, 2.000’”.
A defensora recomenda que ele tome banho e descanse. O médium senta-se em
uma cadeira de madeira à espera do telefonema de Toron com as orientações da
polícia sobre o ponto em que devem se encontrar. Segura nas mãos um
saquinho de supermercado amarelo, com os remédios que pretende levar para a
prisão.
“Eu tomo nove. Eu tenho 60% do estômago [depois de uma cirurgia para
tratar de um câncer], cinco stents no coração. Se eu não tomar esses remédios
lá [na cadeia], eu morro”, diz à advogada. Ela o tranquiliza.
Um outro temor dele é ter a cabeça raspada, regra em algumas
penitenciárias. E também, aos 76 anos, passar um longo tempo na prisão. “A
minha situação é pior do que a do Lula?”, perguntou dias antes a um
interlocutor. A conversa é entremeada por silêncios prolongados.
A Folha pergunta sobre a movimentação que ele fez nos bancos, de R$ 35
milhões, razão apontada pelo Ministério Público para pedir a prisão. Abre a
carteira. “Eu nem uso cheque.” A defesa afirma que ele apenas baixou o dinheiro
de aplicações financeiras, mas que os recursos seguiram depositados em suas
contas.
Às 16 horas, a advogada avisa: os policiais e Toron já estão chegando no
local marcado. É hora de ir embora. À colunista da Folha ele diz que se
entregará à justiça divina e a justiça da terra. No carro, prestes a se
despedir da liberdade, ele diz que está passando mal. Pede que peguem o remédio
sublingual que traz no saquinho de supermercado. “Se eu desmaiar, vocês colocam
embaixo da minha língua.” Às 16h30, chega ao ponto de encontro, a encruzilhada
de uma estrada de terra. Desce do carro de seus advogados. E entra no carro dos
policiais. (Via: Veja)
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