A investigadora de polícia Juliana
Gonçalves, de 41 anos, ficou dois dias de cama por causa da dengue no mês
passado. “As dores passaram, mas ainda tenho manchas vermelhas pelo corpo. Foi
horrível.” Além dela, três colegas de trabalho foram infectados. “Tenho certeza
que os mosquitos vêm de um rio ao lado da delegacia”, diz Juliana, de
Caraguatatuba, litoral norte paulista. Mesmo dois meses após o fim do verão, a
doença no País ainda preocupa: do início do ano até o último dia 11, o total de
registros foi 432% maior, ante o mesmo período de 2018.
O
salto foi de 144 mil casos prováveis de infecção para 767 mil suspeitas
reportadas. As mortes pelo vírus também saíram de 88 a 222 – a maior parte (80)
em São Paulo. O número de infectados explodiu em 20 Estados e no Distrito
Federal.
Há
quatro sorotipos do vírus. A epidemia e a incidência maior nesses Estados são
explicadas pela disseminação do tipo 2, diz o coordenador-geral dos Programas
Nacionais de Controle e Prevenção da Malária e das Doenças Transmitidas pelo
Aedes do Ministério da Saúde, Rodrigo Said. “As últimas epidemias foram pelos
vírus 1 ou 4”, diz. “Esse sorotipo (2), que circulava pouco e por isso
havia pequena proteção imunológica, voltou agora e deixou a população mais
suscetível”.
O
clima, segundo Said, também tem papel importante. Chuvas intensas nas últimas
semanas fizeram larvas do mosquito transmissor, o Aedes aegypti, eclodirem. Além disso,
temperaturas mais altas criam condições favoráveis ao inseto.
“Enquanto
não esfriar para valer, os casos vão continuar”, diz Regiane de Paula, do
Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde de São Paulo. O
fenômeno climático El Niño, segundo ela, está fazendo com que o frio demore
mais a entrar este ano no Sudeste.
Até o
último dia 15, só quatro das 645 cidades paulistas não notificaram casos. Mais
grave é o quadro de Bauru, com 19,7 mil infectados e 21 óbitos.
Em
Tupã, onde o surto levou à cassação do prefeito (leia abaixo), o autônomo
Valdecir Freitas, a mulher e o filho de 13 anos foram infectados. “Mantenho
tudo limpo, mas tem terrenos baldios com lixo. Pagamos pelo descuido de
outros”, reclama.
Com a
expectativa de inverno tardio e curto, cresce a necessidade de manter ações
contra criadouros de Aedes. Segundo o ministério, mais de 80% dos mosquitos vêm
de áreas residenciais. Outras cidades mantiveram no outono o uso do inseticida
(fumacê). A estratégia, para matar o Aedes adulto, é considerada menos eficaz
que eliminar a água parada, que evita o nascimento do transmissor.
O
ministério diz ter 300 mil litros de inseticida vencidos e que, segundo
informações preliminares recebidas esta semana, não estão adequados para uso.
Segundo Said, as amostras desse produto foram encaminhadas a um laboratório
credenciado, mas as respostas recebidas esta semana não foram favoráveis ao uso
do produto.
Tão
logo apareceram os primeiros sintomas, a ex-senadora Marina Silva (Rede)
procurou um hospital em Brasília. As dores fortes pelo corpo e na cabeça
ajudaram a antecipar o diagnóstico confirmado mais tarde por exame: dengue. Na
capital do País, onde as ocorrências aumentaram mais de 1.200%, o governo
espalhou seis postos temporários em áreas de maior incidência. Lá, são
aplicados testes e há assistência prestada por médicos, enfermeiros e
técnicos.
Infectada
pela segunda vez por dengue, Marina ficou três dias internada na última semana.
No Twitter, lembrou ser “mais uma entre milhares”. Segundo a assessoria de
imprensa da ex-senadora, ela passa bem.
A
nova infecção, como ocorreu com Marina, traz risco ainda maior. “A disposição
sucessiva ao vírus e uma segunda infecção podem ocasionar manifestações mais
graves e até óbito”, alerta Said, do ministério.
O
Departamento Médico da Câmara dos Deputados atendeu 88 pacientes com suspeita
de dengue entre 1° de abril e 29 de maio deste ano. Sob a alegação de sigilo
médico, o departamento não distingue quantos são servidores ou parlamentares,
nem divulga nomes dos pacientes. Por causa da alta incidência de casos na
capital federal, o governo local adotou como estratégia espalhar seis postos
temporários em áreas de maior incidência. A assistência é prestada por médicos,
enfermeiros e técnicos de enfermagem.
Epidemia foi motivo para cassar prefeito
O
surto de dengue este ano custou até o cargo do prefeito de Tupã (SP), José
Ricardo Raymundo (PV). Ele foi cassado pela Câmara dos Vereadores na última
semana, acusado de omissão no combate à doença, após denúncia aberta por um
munícipe. Na cidade de 76 mil habitantes, houve 4.118 casos e seis
mortes.
Raymundo,
que aguarda análise de recurso, diz que o afastamento é uma retaliação política
e afirma ter feito ações preventivas. Para o especialista em Direito
Administrativo Márcio Leme, a Justiça tende a reverter cassações do tipo, com
motivo frágil, e respeitar o mandato eletivo.
Em
dezembro, o ex-prefeito de Aguaí (SP) Sebastião Biazzo foi condenado por
improbidade administrativa pela Justiça por suposta omissão no combate à dengue
entre 2014 e 2015. Ele aguarda análise de recurso pelo Superior Tribunal de
Justiça.
Cuidados e riscos
Prevenção
A
maioria dos focos de Aedes está em casas. É importante evitar acúmulo de água em
garrafas, vasos, calhas, lajes e piscinas, onde ele coloca ovos.
Condições
A
permanência de chuvas e temperaturas mais altas favorece a reprodução do
mosquito e leva à necessidade de ficar atento aos criadouros mesmo após o
verão.
Sintomas
Dores
no corpo e de cabeça, cansaço, febre alta e manchas na pele são comuns entre os
infectados. Em casos mais graves, pode haver sangramento por nariz ou boca,
além de vômito contínuo.
Outras doenças
O Aedes também transmite
os vírus da zika e da chikungunya, cujos sintomas podem se confundir com os
sinais da dengue.
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