A ministra Cármen Lúcia e o ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), protagonizaram nesta última quinta-feira (24) um debate sobre preconceito religioso durante o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 634, que discute a constitucionalidade do feriado municipal sobre o Dia da Consciência Negra em São Paulo.
Segundo informações do site Jota, durante o julgamento, Mendonça disse que sabe dos preconceitos existentes no Brasil porque os “segmentos religiosos também sofrem preconceitos”.
Antes mesmo de terminar a frase, Cármen o interrompeu: “Principalmente os de matrizes africanas, não são os evangélicos, não são os católicos. No Brasil, o preconceito é contra as religiões de matrizes africanas”. Mendonça, então, disse que as religiões evangélicas também sofrem preconceito e afirmou que, em sua visão, cabe ao Congresso Nacional editar uma lei nacional instituindo o feriado e não ao município, voltando ao núcleo norteador de seu voto.
O incômodo de Cármen Lúcia às falas de Mendonça começou quando ele expressou sua opinião sobre a igualdade racial no Brasil. “Nós somos um só povo. Uma só raça, uma só nação. Somos todos a raça humana, brasileiros e devemos estar imbuídos desse mesmo propósito de construção de igualdade para todos”, afirmou.
Cármen rebateu o argumento de igualdade proposto. “Vossa excelência foi taxativa ao dizer que nós somos iguais para cumprir a Constituição (com a compreensão que nos fazem plurais), mas que quero registrar que o negro sofre a discriminação de uma forma muito cruel, a mulher é assassinada por ser mulher, e isso tem uma gravidade que não pode ser desconhecida em um sistema democrático plasmado na Constituição brasileira”, afirmou.
Cármen continuou: “Jurisprudências mudam porque se a vida não mudar a escravidão não teria acabado até hoje. ‘Comprei o escravo, paguei, é meu’. ‘Paguei o dote dessa mulher, é minha propriedade’. A mudança faz com que a transformação aconteça no sentido de uma humanização”, disse. “Afirmar que somos iguais e não tomarmos providência não vai nos fazer transformar em um país como o nosso”, complementou.
A ADPF 634 foi ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM) e solicitou à Corte a confirmação da constitucionalidade da lei municipal de São Paulo que institui o feriado no Dia Nacional da Consciência Negra. A Confederação pede que o Supremo declare a competência municipal para instituir feriados de natureza cívica com “alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais”. De acordo com a confederação, há diversos entendimentos judiciais sobre a possibilidade do município instituir o feriado, a quem defenda que o feriado tem repercussões na esfera trabalhista e cabe apenas à União legislar sobre o direito do trabalho. Por isso, na visão da confederação, cabe à Corte a uniformização.
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